Publicado originalmente em 28/06/2013
Há pouco mais de dois anos, precisamente março de 2011, tive a oportunidade de entrevistar um de meus maiores ídolos: Gilberto Passos Gil Moreira. Era ocasião de um projeto que ainda tenho que finalizar com amigos queridos. Naquele dia, estavam comigo Raul Sussekind, Leo Prazeres (PANORAMA) e o fotógrafo Max Sodré (da Absolut Models, nossa parceira).
Algumas coisas me marcaram para sempre.
Primeiro, quando você percebe que o teu ídolo é realmente uma pessoa legal. Gil foi simpaticíssimo conosco, tocou violão e cantou antes da entrevista – enquanto nos deliciávamos com seu show particular. Ah, e tinha duas entrevistas por telefone com rádios europeias a respeito da excursão internacional que faria em breve – e nos perguntou: “teria como vocês esperarem só uns dez ou quinze minutos pra gente começar?” – ora, ficaríamos ali mês se fosse preciso! Aliás, todo mundo era legal no estúdio Geleia Geral: Meny Lopes – que marcou nossa entrevista -, Marcus Vinicius – divertidíssimo assessor de imprensa -, Bem Gil – músico e filho do craque, rubro-negro que fez piadas e riu muito conosco -, Jorginho Gomes – um dos maiores bateristas do Brasil e irmão de Pepeu. Todo mundo rindo, brincando, como se já fôssemos da casa, tudo muito distante das subcelebridades das manchetes rasas.
Quando começamos a gravar, embora nem parecesse uma entrevista, é claro que fiquei nervoso. Depois acalmei, mas o início foi brabo. Mesmo já tendo entrevistado gigantes como Maria Bethânia, Ivan Lins, Fagner, Sérgio Britto e Ítalo Rossi, todos meus heróis, o fato é que gelei.
Acontece que Gil está em minha casa desde que eu era criança. Gil é Gil.
Lembro da explosão de canções como “Refazenda”, “Palco” e “Realce”, todas de décadas atrás. Imagine a emoção que eu senti em 1988 quando Gil fez um show gratuito na minha amada praia de Copacabana e, num momento, puxou “Copacabana” de Braguinha e Alberto Ribeiro, 1947: “Copacabana, princesinha do mar/ Pelas manhãs tu és a vida a cantar/ E à tardinha, ao sol poente/ Deixa sempre uma saudade na gente/ Copacabana, o mar eterno cantor/ Ao te beijar, ficou perdido de amor/ E hoje vive a murmurar/ Só a ti Copacabana eu hei de amar.”
Não seria surpresa alguma atestar as melhores ideias de um grande artista, um intelectual profundo e sólido, um músico de talento incontestável, uma bandeira tricolor que tremula permanentemente nas arquibancadas da arte brasileira, um ministro de Estado por sete anos. A surpresa maior foi ver que Gil não é daqueles torcedores do Flu que apenas veste a camisa em efemérides: conhecia os nossos jogadores da base; comentou sobre a necessidade de, no futuro, termos um time com mais jovens; apostou na afirmação de Wellington Nem como titular (à época, Nem poderia ter sido vendido) e que conquistaríamos outros títulos a seguir em sua opinião (a Libertadores não veio, mas o Carioca e o Brasileiro de 2012 foram muito comemorados). Foi algo tão marcante que, em minha crônica sobre os 3 a 2 contra o Palmeiras que nos valeram o tetracampeonato nacional, escrevi: “No bar, trocamos um abraço sem fim (ave Tom e Vinicius!), o abraço de um amor infinito que repousa de no coração de todos aqueles que têm no Fluminense o seu exercício de beleza, poesia, paixão e fé. A fé que não costuma faiá.” – alusão direta a “Andar com fé”, uma de suas canções que mais gosto.
Num certo momento, caímos em mil gargalhadas de mil decibéis quando o jornalista Alvaro Doria perguntou se Gil, um dia, aceitaria ser ministro novamente caso Caetano Veloso fosse o presidente e o convidasse. Um clima de total descontração entre jovens repórteres anônimos e um baluarte da música brasileira que atravessou o mundo. Antes disso tudo, falamos dos tempos de futebol de botão, de grandes jogadores do passado como Lessa e Marito, do Fluminense que ele escolheu desde criança porque achava o escudo lindo e mil outras coisas – Castilho, Pinheiro, Telê, Didi. Uma tarde inesquecível de minha vida.
Gilberto Gil acabou de completar 71 anos de idade.
O Brasil e o mundo lhe devem muito como homem, pensador, artista e militante. É de um orgulho enorme que seja alguém das nossas três cores imortais.
Como é bom saber que um cracaço da história do Brasil é tricolorzaço e também um sujeito que vive tudo aquilo que exala em poesia, cultura e pensamento. Impressão e realidade andam de mãos dadas. O cara que escreveu “Parabolicamará” é o mesmo que tocou em Wight em 1970 ao lado de Hendrix, Doors e Who. Um monstro, um gigante!
Parabéns de sempre, Gil.
Vamos andar com fé – ela nunca há de faiá.
Ainda temos uma longa estrada pela frente – mesmo que haja um caminho inevitável para a morte, como você bem ensinou em “Cérebro Eletrônico”. Porém, o poeta é tambem preciso em versos como “mundo dá volta/ camará!”.
PS: Um banda um é tricolor demais.