Título não entra em campo e expectativas são exaustivamente o que são: nada mais que o esperado. Não vivamos de expectativas, não esperemos que a vida viva por nós. Me poupo de diagnosticar o que houve com o Fluminense nesse começo de temporada em rebordose, o último texto de Raul Sussekind “Crônica do desastre anunciado” faz isso excepcionalmente. A hora é de virar essa página. Depois da revolucionária temporada contra o ordenamento cada vez mais ortodoxo no futebol tático europeu, o Fluminense de Mano Menezes puxa a alavanca de emergência. Uma equipe classificada em campeonatos internacionais e em paralelo cotada para rebaixamento no nacional. O que essa alavanca puxa com ela?
Renovação é necessária e dolorosa. Na Sul, o abraço esperneado de gol é forte como a rouquidão desesperada por alentar o Rei da América cabisbaixo com sua substituição. Olha a grama, um passo por vez, confirmando que nessa noite o número de partidas sem marcar iguala sua camisa. 14. Ninguém vai virar essa página por você. Ninguém vai distinguir o que vai sobreviver à renovação e o que não vai. Drama de German é sentimento e é fisiológico. Exaurido fisicamente em momentos que lhe faltavam condições físicas, a conta veio carregada de glórias. Estas que não devem ofuscar momentos de baixo rendimento independente do jogador. Se é pra aceitar que Cano deve começar o jogo no banco para que o garoto seja titular eu não sei. Agradeço não ter que tomar essa decisão. O que eu sei é que futebol não é ciência exata, e graças a Deus.
Gratidão deve ser exercitada sempre, uma vez que nunca ofusque o que é fato. Entre uns de saída e outros sem atingir a produtividade que os companheiros esperam, Kauã Elias é símbolo de Fluminense futuro, no presente. Xerém sempre salva. Paciência com ele, vai oscilar e devemos protegê-lo. Ao mesmo tempo, não haverá proteção de nenhum jogador que não demonstrar disposição e garra. É o mínimo que se espera, e na situação que estamos isso é ainda mais cobrado. Não confundir ingratidão com reconhecer fatos.
O fato que temos hoje é o plantel de 2023 desmantelando. Uns dizem que isso já ocorreu e o que temos são suas ruínas. Ou melhor, tínhamos. Tomo Marquinhos, Thiago Silva e – depois de hoje – Serna como pilares de uma reconstrução estruturada. Cheiro de pão na chapa fresco, manhãzinha, só que de uma terça-feira lotada de pendência no trabalho anunciado pela péssima segunda. Outro fato que temos hoje é que o Fluminense só perdeu uma partida com mais de 40.000 torcedores no Maracanã contra times de fora do Rio do século XXI. O que a torcida fez hoje foi de se admirar e deve servir de exemplo, molde pra temporada. Comparecer, arrancar disputa de bola no grito, hipnotizar o adversário no oníssono vibrante de NENSE. Nâo é festejar na arquibancada, é propósito, encargo, dever de sair do buraco nós mesmos nos colocamos.
Mesmo punidos, bandeirões da Young conduzem a atmosfera. O novato paraguaio arranca pela esquerda. Cada corte de bandeirada mais firme que o anterior. Arias passa a meia lua pedindo bola. Ondula o duende verde nas três cores que traduzem tradição. Serna entra na área e sua bola atravessa a zaga paulista, achando o autor dos dois gols contra LDU de encontro direto com a redonda.
Arias tinha perdido duas oportunidades da mesma maneira, indo de encontro com a bola em velocidade, mas três é demais.
Um gol que sela a fé, protagoniza o querido pavilhão numa campanha de ressureição e acende vela nesse breu que é o Z4.
No próximo confronto contra o Bragantino não teremos Thiago Santos por tomar seu terceiro amarelo, uma pena. Ex-volante que veio desacreditado do Grêmio, é um dos chamarizes do legado que nosso ex-técnico-psicólogo deixa. Guardemos as lembranças boas, em campo hoje e em memória na sala de troféus. Nesse campo devemos seguir princípios psicopedagógicos, sem permitir que a ânsia de nos livrarmos da condição de rebaixamento nos consuma. Respiração. Um jogo, um passe, uma página de cada vez. Quaisquer não-vitórias do tricolor serão temperadas com muito agouro, sal demais, notícias de página inteira martelando que estamos mais próximos do pior cenário. Quem crê nisso falha em esquecer do que o Fluminense é feito. Tem que ser muito ingênuo para desconsiderar o verde da esperança.
Bom tricolor (ainda) não faz conta. Estudos de probabilidade nunca agradam o ansioso. Com três dos quatro times na zona de rebaixamento igualados em pontos e Thiago Silva como meu capitão, eu durmo tranquilo. Inquieto, mas tranquilo. Se é que isso é possível.
Em tempo, atraca na Guanabara o verdadeiro Fluminense de 2024. Aquele que vai correr dobrado três meses depois de andar pela metade.