O título acima deve-se muito mais a uma vontade minha do que necessariamente a uma crença deste escriba. Claro que os chilenos não estão achando uma sopa enfrentar o país anfitrião, sobretudo quando esta seleção é nada menos que a maior colecionadora de títulos em Copas. Eles nos respeitam. Muito até, eu diria. Mas, em que pese as recentes eliminações para o Brasil em 1998 e 2010, não nos temem. Ao menos não este Chile, lépido e talentoso, que despachou os campeões mundiais de volta para casa há alguns dias.
“Treme, Chile” é a reprodução de uma manchete de capa da revista Placar de 1989. À época, estavam sendo jogadas as eliminatórias da Copa de 1990, num formato bem diferente do atual. Num grupo com apenas três equipes, o Brasil, cabeça de chave, brigava por uma vaga com Venezuela e Chile. Assim mesmo: tiro curto. Qualquer tropeço poderia custar a vaga à nossa seleção, cuja geração entraria negativamente para a história como a primeira a não classificar o nosso país ao Mundial.
O Brasil havia goleado a Venezuela em Caracas por 4 a 0, e esta manchete foi a maneira que a revista encontrou de intimidar os chilenos, que, cientes de sua inferioridade técnica, usaram de todos os expedientes contra o Brasil – desde chutes, mordidas, apito amigo (um sobrepasso escandaloso lhe foi marcado em Santiago), culminando com o episódio dantesco protagonizado pelo goleiro Rojas, que cortou o próprio supercílio no Maracanã, para tentar ludibriar a arbitragem, simulando ter sido atingido por um foguete (na verdade, um sinalizador).
O Chile acabaria duramente punido pela Fifa, que o afastaria das eliminatórias seguintes, e Rojas, banido do futebol. Além dele, foram definitivamente expulsos o técnico Orlando Aravena, o médico Daniel Rodríguez e o dirigente Sergio Stoppel, coadjuvantes da cena tragicômica.
“La Roja” não estava na tradicional camisa do Chile, muito menos na testa ensanguentada de Rojas. Mas em seus rostos, corados de vergonha, que lhes roubou qualquer resquício de dignidade, como o próprio goleiro declarou anos depois, em entrevista.
Confirmado vencedor, o Brasil disputaria a Copa da Itália, mas Sebastião Lazaroni nunca mais repetiria a ousada escalação que empolgou os brasileiros e a conceituada revista esportiva, com o seu animado “Treme, Chile”. Envolto com lesões, o craque Romário pouco jogaria aquele Mundial. No banco, ao lado de Bebeto, veria Careca e Muller sucumbirem à Maradona e Caniggia.
Numa Copa marcada por desunião entre os próprios jogadores, e até com o seu patrocinador, a ponto de a delegação esconder propositalmente sua logomarca em reportagens para a TV, o desfecho não poderia ser outro: a pior participação do Brasil em Mundiais desde 1966, com eliminação para a Argentina ainda na fase de oitavas de final.
A mesma que o Brasil jogará neste sábado, às 13h. Entretanto, diferentemente daquele, o selecionado nacional de hoje tem um grupo mais equilibrado e pra lá de unido. Talvez até com menos talentos, mas, em compensação, com um fenômeno vestindo a 10, que faz o adversário balançar nas tamancas.
Ah, quer saber, vai tremer, sim!
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João Marcelo Garcez (joaogarcez@yahoo.com.br) é jornalista, publicitário e escritor, havendo já publicado cinco livros. Há mais de uma década atuando na área de Comunicação, já trabalhou em empresas como TV Globo, Globosporte.com, Jornal dos Sports e DM9DDB. Bicampeão do Top Blog (2010 e 2013), espécie de Oscar da internet, Garcez escreve mensalmente a este Panorama Tricolor.