Sonhos e delírios de Chiquinho Zanzibar (por Alva Benigno)

ALVA BENIGNO RED NOVO

Enquanto a torcida tricolor estava total e absolutamente p*§^|€uta da vida com a derrota para o Santos e o empate insosso diante do Coritiba, o velho escroque naturalmente foca suas ideias em outros objetivos.

Chiquinho Zanzibar não dormiu uma única noite direito desde que as redes sociais repercutiram a ideia de um possível shopping center no lugar do centenário estádio das Laranjeiras – algo a ser decidido à frente, depois de ampla discussão, aprovação dos sócios, viabilidade etc. Não porque Chuck não torça para o Fluminense, mas pelo que pode estar em jogo a seu favor, claro. Começou a delirar em sua cobiça interminável. Um terreno valorizadíssimo, com metro quadrado altamente lucrativo. E se aprovarem? (O perigo está num grande amigo seu, preso pela Operação Lava Jato após ter voltado ao Brasil). Um lobby com amigos construtores pode significar grana no bolso via uma bela comissão de aproximação, tentando furar seriedade de qualquer maneira. Como fazer para se meter nisso e trapacear, inclusive f#-_#@udendo quem queira de verdade o bem econômico do clube? E o melhor de tudo: o fim do campo pode significar o fim da gentinha que frequenta as Laranjeiras, andando com chinelos e roupas desclassificadas atrás de autógrafo de jogador de futebol. Uma pobreza. Suburbanos metidos a tricolores. Se ao menos manjassem os atletas de forma privada e respeitosa…

Um detalhe sórdido: se um dia houver um shopping no lugar do sagrado gramado, é claro que Chiquinho sonha com a obra contendo entrada de serviço para empregados e escada rolante exclusiva para pessoas de bem, embora vá lá se saber o que significa isso.

Mas nem tudo era leite de rosas por baixo do echarpe grená. A inauguração do CT em breve também deixa certo vazio no coração do calhorda tricolor. Ainda que pense que os jogadores só servem para ganhar jogos e não passam de empregadinhos milionários, Chiquinho sente a mudança com ares de derrota. Quantas vezes depois de ver um craque de peito nu, não correu imediatamente para o banheiro e se liquefez como mulher de ocasião? Nunca mais pernas grossas, torneadas, bíceps definidos, tudo observado de forma tão discreta que se um interlocutor ousasse fazer um comentário jocoso, imediatamente levaria na casa versos cantados nos anos 1980 por Ney Matogrosso: “o que falam de mim são calúnias/ meu bem, eu parei”.

Num instante, Zanzi recorda as sociais de Álvaro Chaves. Ali, viu de tudo um pouco: vitórias, derrotas, risos, constrangimentos. E foi onde se sentiu mais society na vida: cercado por cabelos lisos e louros, sobrenomes estrangeiros, outros idiomas. A gente branca de bem que sempre lhe serviu de paradigma. Ali, suspirava como se fosse um nobre ou senhor feudal, sem ser imcomodado.

Pausa para a tristeza: o CT é na Barra da Tijuca, a terra dos emergentes, da gentinha suburbana que enriqueceu e gosta de stand up comedy, depois de fazer compras no Village Mall. E tendo que passar pela Rocinha… cruzes!

Faz o sinal da cruz, pensa na casa tricolor no alto do Joá com a bela bandeira tricolor hasteada, mas chega a ter náuseas: “Meu Fluminense não é favela para estar no alto do morro!”.

Espia a internet, fica aflito com as movimentações políticas das Laranjeiras, mas apenas porque não quer perder oportunidades de negócios, claro. Que se dane quem vai ganhar: o que importa é estar com o poder onde o poder está.

Sábado à noite, a patroa Esmeralda num banho interminável, ele sonha com a sauna e todos os momentos que ela já lhe proporcionou. Ela é seu verdadeiro Maracanan. Se a mantiverem intacta, podem derrubar todo o resto – desde que o levadinho esteja garantido. Enquanto isso, as Spice Girls cantam “We are family” num anúncio da televisão.

Por um momento, sente remorso com a má fase do time. Não era para ser assim. Admira Levir, embora o ache um caipira. Lembra dos tempos do zagueirão do Santa Cruz. Quase como que num presságio de amor, recebe uma enigmática mensagem no smartphone, a ponto de afrouxar qualquer echarpe e deixar cair seu eterno robe grená. Envio feito por Boris, um velho amigo da sauna: “Zan, encontrei o Filhão na Farme e ele pediu que você ligasse. Quer te ver.”

Diante do romance sonhado, Chiquinho esqueceu até do mau empate contra o Coxa. Dependendo do que der nestes dias, vai com tudo para cima do Ypiranga. Charmosérrimo, acredita. Ele ouve Spice Girls, mas não para de pensar em Mano Brown sem camisa. É um Macunaíma do sexo, o herói sem caráter descrito na genialidade de Mário de Andrade, também um homem à frente de seu tempo. Pega o telefone, digita e ao ouvir um discreto alô, não resiste: “Abafa, Big Son!”.

“Zan, entra no Whats.”

“Claro, amore. E as novidades?”

“Em primeiro lugar, fora PT! Andam querendo me derrubar, mas eu sou que nem a música do É o Tchan: “pau que nasce torto nunca se endireita…”

“Kkkkkkkkkk, pau pra toda obra. Só falta o capacete!”

“E esse Dourado novo? É bofinho?”

Enquanto o riso come solto, o banho de Esmeralda é interminável. A duchinha é um verdadeiro homem da casa, sob as águas do amor.

Panorama Tricolor

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