Quando éramos reis (por Paulo-Roberto Andel)

Ao imaginar que meu primeiro contato com o Fluminense pode ter sido a figurinha de Félix em 1973, no álbum da Copa de 1970, lá se vão 48 anos de Flu na minha vida.

Meu pai faz falta demais.

Na foto abaixo, era diferente. Eu era um jovem adulto, 23, 24 anos. A luta para se formar, conseguir um bom emprego, ajudar a família, os amigos, as garotas, a música e o Fluminense, Fluminense toda semana, quarta e domingo. Laranjeiras e Maracanã.

Quantas vezes eu me senti nas nuvens debaixo desse bandeirão? Foram muitas. Uh, uh, é o bandeirão! Uh, é o bandeirão, o terror dessa nação!

Não era fácil ver o Flu há seis anos sem títulos expressivos. No entanto, tinhamos certeza de que a seca desde 1986 iria acabar porque não éramos figurantes, mas protagonistas. Batíamos no travessão em cheio: disputamos várias finais e perdemos, algumas porque era assim mesmo, outras com arbitragens marotas.

[Onde quer que esteja, Super Ézio é o mais humilde, cortês e atencioso ídolo tricolor

Os títulos não vinham, mas o Fluminense tinha uma grandeza que começava à beira do gramado: Edinho, Pinheiro, Carlos Alberto Torres, Deley. No campo foram vários jogadores: Bobô, Renato, Lira, Jandir, Luiz Eduardo, Ricardo Pinto, Jefferson, Paulinho, Válber, Torres, Macula, Mário Tilico, Branco e outros. Na arquibancada, a torcida cobrava, apoiava e criticava – acreditem: um dia o senso crítico tricolor foi o mais apurado do país.

[Vocês se lembram daquela incrível virada sobre o Vasco pela Copa União de 1988? Uma noite inesquecível

Aí veio 1995 e todos sabem o resto da história. Desde então, vivemos dramas e glórias até 2012. De lá para cá, um vazio enorme: a perda do protagonismo, cinco lutas contra o rebaixamento e um Flu de glórias se afastando lentamente do cais. Em troca, muita empáfia, muita lacração, muita verborragia e fanfarronice. Em paralelo, discursos plantados nas redes sociais por torcedores de dirigentes, propondo o Fluminense como um time menor, sem condições de brigar pelas grandes taças. Assim, chegamos a praticamente nove anos sem títulos expressivos.

[Eu estava lá naquela incrível disputa de pênaltis contra o Botafogo, de tarde no Maracanã com entrada franca

Debaixo daquele bandeirão todo mundo carregava no peito o Fluminense com que se sonhava e admirava. Ele não tinha grandes expoentes, mas não se contentava em ser vice-campeão ou quarto colocado. Não era apenas uma agência de exibição de ativos empresariais, alugando uma camisa centenária.

O que mais dói nessa eliminação onde, mais uma vez, o adversário nem precisou fazer um grande esforço para nos humilhar, é que jogou calmamente, quase que como num treino mais pesado. Venceu como quis. Deixa estar. Uns vão reclamar do pênalti, ok. Outros vão defender o absurdo de que Marcos Felipe tinha que pegar o pênalti. É de absurdo em absurdo, vamos naturalizando a mediocridade, a incapacidade de conquistar, o tanto faz. Há sempre um bode expiatório para se jogar a culpa de uma conjuntura inteira.

[Eu não estava nos 7 a 1 sobre o Botafogo em 1994, numa sexta-feira chuvosa. Como pude ter feito isso?

Quando éramos reis, tínhamos um bandeirão que nos orgulhava muito, e uma trajetória muito diferente dessas que andamos vendo por aí.

Quando éramos reis, o Fluminense era Fluminense demais.

Duas da manhã. É hora de dormir, se for possível.

“Nos perderemos entre monstros da nossa própria criação.” (Renato Russo)

Arte: Renato Martini

4 Comments

  1. Texto perfeito, ando envergonhado! Esse não é o meu Fluminense! E nada acontece!

  2. Nossas administrações cada vez mais catastróficas. Nosso clube ficando mediano e tem gente que ainda comemora. E os dissidentes indo de vento em popa, colecionando taças, anunciando superávit e redução considerável da dívida. Se não houver uma guinada nesse cenário, em menos de uma décadas teremos o mesmo espaço do Bangu, se tanto.

  3. Há uma relação dúbia no interior do torcedor do Fluminense: de um lado, o saudosismo por uma época em que o Fluminense, se não dava as cartas, ao menos figurava entre os principais do Brasil. Tinha títulos, e fazia partidas históricas.
    Do outro lado, existe a negação. Uma tentativa de negar a atual realidade do clube. Insistir que aquele Fluminense de outrora ainda existe em algum lugar.
    O torcedor precisa entender (que é diferente de aceitar), que hoje o Fluminense figura entre o grupo de times médios. Aqueles que são figurantes de luxo nas ligas nacionais.
    Isso não siginifica calar e…

  4. SEMPRE ESTIVEMOS NO PODIUM. A INFILTRADA AÇÃO DESESTABILIZADORA DE ELEMENTOS ESTRANHOS E NOCIVOS COMO O SÃO OS PERSONAGENS DA FLU SÓCIO PRECIPITARA ATÉ A ASCENSÃO MAIS RÁPIDA DO NOSSO REBENTO REBELDE ANO A ANO REFORÇADO POR NOSSOS MENINOS DE XERÉM…

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