Sinceramente, o empate em Brasília não me surpreendeu em nada, de modo que não posso me declarar decepcionado – apenas irritado. Primeiro, até em grandes jornadas como as de 2010 e 2012 mostram o Fluminense enrolado contra adversários modestos (se estiverem no Z4, vira horror). Segundo, depois de quatro ou cinco jogos fantásticos neste campeonato, com o time sendo aplaudido até na derrota, a magia acabou. Aconteceram momentos pontuais e só. Um jogo bom, dois ruins, um mais ou menos. O triunfo no Morumbi foi um deles. A renovação é urgente a olhos nus. Optemos pela lucidez matemática e por entender que esquadrões como o dos anos 80 duraram cinco anos. A Máquina durou dois. Por que o time atual deveria manter titularidade vitalícia?
Houve quem visse os 3 x 1 contra o São Paulo como passaporte para o penta ou vaga na Libertadores garantida. Longe disso. Mas o começo em Brasília não foi mau, pelo contrário: nos primeiros cinco minutos, só deu Fluminense. Depois, mesmo com o time limitado, o Bahia equilibrou as ações, sempre pela direita do ataque, em cima de Fernando, nosso jovem improvisado na lateral.
Fred fez seu gol de oportunismo em cima de Lomba, amigo, e no minuto seguinte o mesmo Fernando acertou uma bomba em diagonal. O segundo gol liquidaria o jogo, mas não veio. Em resposta, o Bahia teve três conclusões perigosas, sem marcar – entrava como queria, sem combate no meio e com a linha burra. Veio o intervalo.
O Flu voou de novo na volta da partida. Não marcou. Sozinho, beijou a lona. O Bahia aos poucos tomou conta do jogo, perdeu trocentos gols e também poderia ter tomado: Sobis, Wagner e Fred abusaram do preciosismo. Recuado demais, o Flu permitia jogadas próximas à sua área e se encolheu. A conta veio no fim do jogo: de tanto insistir, o Bahia conseguiu seu empate numa falta que virou bola quicada. No fim, Cavalieri ainda evitou o pior em dois lances.
Cristóvão não foi o único culpado, longe disso, mas tropeçou na soberba demonstrada em entrevista recente, dizendo que tricolores estavam reclamando de barriga cheia com o sexto lugar do time (à custa de míseros 30 milhões por ano). Pelo visto, trocou de galáxia. A insistência no ataque com Sobis e Fred no segundo tempo (o primeiro, no papel de trenzinho do Corcovado, em lenta caminhada à frente; o segundo, no papel de Cristo Redentor, parado e de braços abertos sobre a Guanabara) beira a um episódio do Zorra Total – o camisa 9 ainda ajudou a defender três ou quatro vezes, falando sério, mas não pode ser intocável se está esfalfado. A saída de Conca, não sendo por contusão, é certeza de um time sem condução e caótico. Rafinha era dos melhores. Edson não conseguiu evitar o empate. Kenedy? Se eu não fosse ateu, pedia a Deus por ele. Na rádio, o Kote e o Márcio quase fizeram granadas com os microfones. Cansaço, lentidão, previsibilidade. Que surpresa?
No fim, salvaram-se o Marlon e o Cavalieri. Fernando atacou bem mas não sabe marcar. Pouco público, ingresso extorsivo, um segundo tempo ridículo e, se o velho Carvana ainda gritasse a plenos pulmões na Jovem Flu, não tenho dúvidas de qual seria sua primeira frase: Vão trabalhar, vagabundos! Barriga cheia, jogador barganhando renovação de contratos, jogador mandando torcida calar a boca, jogador dizendo que o Flu não entraria em campo. Afinal, 2014 já deu, né?
Agora é pensar em grandes filmes e espetáculos que cerraram suas cortinas para sempre. Carvana remete ao período entre 1969 e 1980, quando ganhamos um campeonato brasileiro, chegamos a duas semifinais, vencemos seis campeonatos estaduais (fortíssimos) e, em duas temporadas, fomos o time mais badalado e admirado do mundo. No cinema e na TV, Carvana brilhava, enfrentava a ditadura e cativava os brasileiros dia a dia. Mais de quarenta anos foram embora. O Fluminense voltará, mas teremos novos atores inesquecíveis beijando nosso escudo? Quando devido, nem sempre a vida imita a arte.
Prossigamos. É preciso. Mas torcendo sem esquizofrenia. O G4 é uma possibilidade, mas não com a manutenção da irregularidade suprema. A lucidez está muito mais em se enxergar o óbvio do que vanguardismos mirabolantes só existentes no sentimento.
Panorama Tricolor
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Imagem: pra – luto por Carvana