(ou os milagres do povo)
Quando entrei no Maracanã sábado passado, logo os times desceram para o intervalo nos vestiários. Cheguei atrasado. Houve um motivo justo para que isso acontecesse pela primeira vez em 36 anos. E acabou sendo lucro: não fosse a turma, eu não teria sequer ido.
Eu voltava de um enterro. No Pechincha.
O céu tinha um gris de insinuar chuva. Tempo abafado.
A torcida, tensa.
Depois, um segundo tempo que, se esteve longe de ser convincente, foi corrido e terminou com uma jogada muito improvável de Bruno, mais outra, aí provável, de Fred, evitando o desastre que teria sido o empate contra o limitado Atlético-PR, ainda que este dispusesse de alguns bons valores individuais.
Houve quem urrasse pelo penta em 2014. O resumo é de cada um. Quem costuma criticar, com razão, desta vez ressuscitou o louvor ao time de guerreiros. Quem sempre elogia e apaga críticas vibrou sem cultos às personalidades. Um Maracanã estranho e belo.
A jogada de Bruno é uma oferenda dos milagres do povo, que torce, vibra, chora, e vê no Fluminense onze Didis, onze Ricardos ou Decos. Foi um prêmio justo aos maníacos que, mais uma vez, acreditaram na camisa do Flu – o que não faz deles lunáticos enxergando ouro em grama. Nada pode ser mais idiota do que tricolores em luta para darem um ao outro lições de moral sobre futebol. Desculpem: sou do tempo de uma torcida só.
Os problemas foram os já conhecidos. Um ataque lento; o meio sempre dependendo de Wagner – agora calado, um monstro – e Conca – cansadíssimo por duas temporadas seguidas, mas dificilmente não brilhante; a defesa claudicante com a saída de Marlon; o recuo antes da metade do segundo tempo, permitindo que adversários menores nos pressionem. Sim, Fred tem talento e números recentes, Walter tem talento. Apenas não são Romário, o que não quer dizer que não possam ser aproveitados ao máximo em suas virtudes.
Nas qualidades, a disposição já dita de Wagner e Conca, o oportunismo de Fred, a segurança de Cavalieri. Carlinhos e Bruno foram bons pontualmente falando.
Hipérboles e delírios apaixonados à parte, as últimas três vitórias aliviaram um cenário desenhado de crise. Até jogadores que nitidamente não se bicam abraçaram-se ao final dos 2 x 1 de sábado.
A briga continua. Hoje, ir à Libertadores 2015 é menos difícil do que foi há duas semanas. Oito jogos, oito lutas.
Haja o que houver, o Fluminense não pode ser refém do casuísmo por causa da futura renovação de contratos de jogadores. Menos ainda de jogador que quebra coisas em vestiário e põe dedo na cara de dirigente. Trocando em miúdos: que legal voltar à América, caso aconteça, mas a ser mantido este elenco sem as renovações necessárias, é classificar-se para ser figurante. Até aqui, foram gastos 27 milhões este ano. A torneira não será a mesma.
Foi bom ter vencido. Mas não me peçam para fazer banquete com migalhas.
Para os torcedores, mais um péssimo atendimento do Sócio Futebol, com diversos torcedores tendo problemas nas catracas eletrônicas do Maracanã. Nenhuma novidade: quem precisa recorrer ao atendimento a clientes do ST é praticamente tratado como idiota. Eu mesmo passei por esta experiência recentemente, com uma funcionária do clube que é analfabeta funcional. O problema não está somente em querelas por vaidades de vestiário. Muita coisa precisa ser repensada.
Todavia, o Fluminense venceu. Sigamos em paz.
Entrei ao final do primeiro tempo.
Cheguei atrasado.
Voltava do enterro da mãe de um dos tricolores mais apaixonados, dedicados e aguerridos que se tem notícia: o jornalista Cláudio Kote, fundador da Rádio Canal Fluminense – a pioneira do país em web.
Mais do que um amigo, Kote é uma bandeira do clube em tremulação permanente.
O destino quis que ele perdesse sua mãe no mesmo dia de uma vitória tricolor nos descontos. Eu passei pela mesma situação quando meu pai se foi naquele gol de Washington contra o São Paulo, em 2008. É uma dor que eu entendo bem: aquela por quem os sinos dobram.
Ao Kote, meu grande abraço, os sentimento e a certeza de que estaremos juntos defendendo as coisas do Fluminense, de graça ou até pagando por elas, tal como fazemos agora.
Afinal, o que é um jogo de futebol, um time e tudo mais diante da morte de quem amamos?
O que é a vida?
A vida?
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @pauloandel
Imagem: pra
Querido amigo, voltando ao mundo digital, à vida real, aos amigos e a dedicação ao FFC.
Agradeço a você, Rods, Renato e Erica. Sem vocês tudo seria mais doloroso e difícil para mim. A pancada foi forte e ainda não cicatrizou. A dedicação e carinho demonstrada por vocês foi para a vida toda, pode ter certeza, esse momento jamais se afastará da minha alma. Muito obrigado por existirem.
Mesmo sabendo que é minha vida… o que é a vida? Vida?
Amo vocês.
*** Antispam disabled. Check access…
Andel, muito obrigado. Condolências ao Kote e parabéns a todos vocês que labutam para que este site seja referência.
Andel: Marcio, em nome da equipe, eu é que agradeço sempre a tua força ao nosso trabalho. Pessoas como você ajudam a ter ânimo para enfrentar os maus leões do dia a dia. ST