Tricolores de sangue grená, o Fluminense joga neste domingo contra o Ceará no Castelão para espantar as bruxas que insistem em frear nosso avanço no campeonato. Elas têm vários nomes, perfis e denominações, e tem sido difícil evitar suas travessuras ultimamente. Em meio a discussões sobre Centro de Treinamento inacabado, dívida do Fluminense com o Pedro Antônio, o não retorno do mascote “Guerreirinho”, o que disse e o que não disse Fred em suas redes sociais, com o Fluminense fazendo um papelão na defesa do jogador, novo portal de sócio descadastrando o cartão de geral, pré-candidato à presidência Ademar Arrais sendo pouco convincente, entre outros assuntos, ficaram meio de lado – para não dizer totalmente – situações mais importantes, como a incerteza com relação à concessão do Maracanã no que tange ao Fluminense Football Club, a aparente renegociação e centralização das dívidas que o Fluminense está prestes a conseguir, mas que exigirá cerca de 20% das receitas anuais, e o fato, é claro, de ainda não termos um treinador.
Dificilmente haverá um ser humano que se diga tricolor e que também odeie o Marcão. Marco Aurélio de Oliveira tem 49 anos e é natural de Petrópolis, RJ. Como jogador, sua carreira começou no Bangu, onde ficou de 1989 a 1998. Jogou por Criciúma, Vasco e Bragantino por um curto período, e depois veio para o Fluminense, onde viveria seus dias mais virtuosos. Atuou de 1999 a 2006, sendo emprestado brevemente para o Al-Ittihad em 2005 por alguns meses. Saiu do clube de forma injusta, no meu entender, e ainda atuou por Cabofriense (duas vezes), Juventude, Joinville e CFZ antes de se aposentar jogando três temporadas no clube que o revelou, o Bangu, de 2009 a 2011. Como treinador, Marcão treinou o Bangu, o Bonsucesso e o River-PI em 2012. Em 2016, teve sua primeira experiência como treinador dos profissionais do Fluminense após três anos como auxiliar técnico, comandando o time nas últimas quatro partidas no Brasileirão. A partir de 2018, foi efetivado novamente como auxiliar técnico e, desde então, é o “quebra-galho” da gestão atual, finalizando todas as temporadas de 2019 para cá devido à saída dos treinadores anteriores.
Os números de Marcão são razoáveis. Ele treinou a equipe do Fluminense até hoje em 58 jogos, sendo 24 vitórias, 18 empates e 16 derrotas, o que totaliza cerca de 51,7% de aproveitamento. Se formos contar apenas nessa temporada, foram 15 jogos, com 6 vitórias, 4 empates e 5 derrotas, o que dá cerca de 48,88% de aproveitamento. Como eu disse, números razoáveis, mas não bons. O Fluminense não pode ter um treinador razoável, por mais gente boa que ele seja. A derrota para o Santos, da maneira que aconteceu, conjugada com a vitória meio sem querer sobre o Athletico-PR me passam a impressão de que o Fla x Flu foi um mero acaso, uma mera oportunidade de abater um rival que sempre treme quando enxerga nossas cores e que foi aproveitada. Não demonstro, de fato, evolução alguma. Marcão já conhece os jogadores há muito tempo. Sabe quem seria melhor aproveitado no time e que hoje ainda está na base. Tenho certeza que ele entende quais são os atletas para resolver determinados problemas, e não pode fazer tudo o que gostaria nesse sentido. Isso é nítido. Mas não é o suficiente para explicar termos um time tão ineficaz para reagir a condições adversas.
O time do Fluminense, hoje, é o time do “all-in”. Se está fora de casa ou enfrenta uma equipe que vai atacá-lo (como Santos e Flamengo fizeram), segura a pressão que sempre tem ocorrido no início de cada tempo e faz o possível para encaixar contra-ataques letais. Contra a zaga fraca da Dissidência, deu certo. Contra a defesa santista jogando uma final de campeonato na chuva, não. E aí, quando isso acontece, um abraço. O Fluminense não consegue virar jogos. Não me recordo de nenhuma partida nessa temporada que não tenha sido de Campeonato Carioca que tenhamos conseguido virar. Nem contra o Criciúma fora de casa deu. E não dá hoje porque continuamos sem ter um armador – e um esquema que o faça funcionar. Ganso é realmente o único? Cadê o pessoal da base que fazia chover enfiando bolas? Luiz Henrique já jogou nessa função. Matheus Martins também. A função do treinador também é encontrar soluções para problemas no elenco, como fez Diniz em 2019 ao descobrir em Caio Henrique um excelente lateral esquerdo.
Enquanto não tiver a capacidade de solucionar os problemas evidentes – em vez de negá-los para abafar qualquer crise –, Marcão não conseguirá desenvolver-se plenamente como treinador. O principal compromisso de um técnico de futebol não é com o presidente, tampouco com os jogadores, é com a torcida. Não dá para aceitar burocraticamente que o time é isso aí mesmo, como fez Roger Machado abertamente, tampouco fingir que tá tudo bem para agradar o chefe. Treinadores informam carências, discutem estratégias, variam esquemas de jogo, pinçam atletas da base conforme sua utilidade e, principalmente, não viram reféns de vestiário ou meretrizes de empresários. Enquanto ele for apenas o funcionário da gestão Bittencourt, ele continuará sendo o auxiliar técnico Marcão, mesmo que o promovam a técnico, caso consigamos a obrigação, que é ir à Libertadores, sabe-se lá como. O problema, é claro, é mais profundo. A torcida precisa entender que não teremos treinadores de ponta e que possam trabalhar com autonomia enquanto essa for a gestão. Os sócios, principalmente, não podem esquecer. Campanhas efêmeras em 2022 ou até um título carioca não podem nos tirar a lembrança de tudo o que já tivemos que tolerar até hoje.
Curtas:
– Se o Ceará entrar com a disposição do Santos, torceremos mais uma vez pelo gol cagado. Nossa sorte é que eles não têm tanta qualidade, em que pese terem o Vina.
– Marcão aparentemente vai continuar com dois volantes e manter John Arias no time. Mesmo que Arias não esteja rendendo como armador, é um jogador insinuante, que pode criar jogadas interessantes. Por outro lado, a ameba do Caio Paulista continua titular. É bom que lenda uramista de R$ 16 milhões mostre algum serviço, senão será realmente mais uma jornada dura de se ver.
– A galera de trás está chegando. América-MG venceu, foi a 38 pontos; Atlético-GO tem 37 com um jogo a menos que a gente; Santos e São Paulo não estão tão atrás assim. É bom o Fluminense abrir o olho. Essa derrota para o Peixe pode ter consequências sérias se não voltarmos a pontuar imediatamente.
– Palpites para as próximas partidas: Ceará 0 x 1 Fluminense; Fluminense 2 x 1 Sport.