É certo que a paixão alimenta a vida e no futebol não seria diferente. Se não houvesse paixão, como este PANORAMA se manteria há dez anos sem lucro? Aí está uma boa questão.
O problema da paixão é quando, pelo excesso, ela prevalece acima de todos os argumentos. A lucidez começa a correr sérios riscos e até mesmo as sentenças mais estapafúrdias passam a fazer sentido.
Caso de agora. Terminada a temporada, o Fluminense iniciou seu ciclo de contratações. Certo senso comum passou a ditar que os descontentes com as últimas notícias “torcem contra” ou “não são tricolores”, tudo para explicar que o melhor volante do futebol brasileiro seja barrado ou deslocado para a entrada de um ex-jogador mediano, que nunca passou de coadjuvante em qualquer conquista de sua carreira. Em tom professoral, espones explicam: “vai jogar de terceiro zagueiro”. Fantástico. A se confirmarem todas as especulações, o clube terá um elenco envelhecido sem precedentes na história de times brasileiros campeões. Para os adeptos da paixonite é puro preconceito, embora ninguém saiba apontar um time nacional com sucesso em grandes competições, tendo dez ou quinze atletas com idade acima de 34 anos.
Se estivéssemos numa situação normal, o sétimo lugar no Brasileiro seria motivo de cobranças, não da quase comemoração de um título. Mas os tempos mudaram e, pelo visto, para pior: o sarrafo foi abaixado e uma posição medíocre tem ares de vitória. Vida que segue.
Será que os torcedores que viveram e conheceram a verdadeira trajetória do Fluminense deveriam se adaptar ao “novo”? Penso que não. Embora um dos maiores patrimônios da nossa torcida – o senso crítico – tenha se dissipado no tempo, muita gente acha anormal questionar contratações antes da estreia, algo que sempre aconteceu. O Flu teve 110 anos como protagonista dos campeonatos que disputou e, se a última década aplaudiu o mediano Fluham, os nove anos sem conquistas expressivas dão o tom de agora. Fato.
Por fim, existe uma diferença enorme entre criticar o modus operandi do Fluminense e torcer contra ele. A história mostra que algumas grandes campanhas tricolores foram precedidas por intensa cobrança da torcida. Torcer para dar certo é obrigação de todo torcedor, mas ninguém precisa brigar com os fatos ou viver uma realidade paralela em nome do Flu.
Tomara que 2022 seja um ano de glórias para o Fluminense, mas todo cronista tem o dever de escrever sobre os acontecimentos, e não sobre seus desejos pessoais nem sempre confirmados. Isso, ao menos, para quem busque respeito e reconhecimento profissional por suas crônicas.