O uso das Laranjeiras para jogos oficiais (por Hugo Jácome)

Hoje este espaço vai abordar um tema que gera muitas paixões e discussões nas redes sociais, blogs e fóruns tricolores: o uso de Laranjeiras para jogos oficiais. O tema voltou a ser pauta, sobretudo, pelo prejuízo de mais de R$ 300.000,00 apontado pelo borderô na estreia do Fluminense, no Maracanã, contra a Portuguesa.

Ao longo do período eleitoral, o tema parecia contar com a simpatia de Mário Bittencourt. Inclusive, seu pai foi nomeado para compor um comitê que trabalharia em conjunto com o grupo Laranjeiras XXI nos estudos de viabilidade, prospecção de recursos, desenvolvimento de projetos e efetiva reforma do espaço.

Antes de qualquer opinião, algumas premissas precisam se estabelecer:

* todo e qualquer patrimônio do Clube deve ser preservado e, portanto, a reforma do espaço é bem vinda;

* qualquer esforço de tricolores abnegados em prol de algum movimento pró-Fluminense merece aplausos;

* a opinião a seguir é feita com base nas notícias divulgadas pela imprensa a respeito do estudo promovido pelo Grupo Laranjeiras XXI, grupo apolítico, que conta com pessoas de diversos grupos políticos e não políticos e, sobretudo, tricolores abnegados.

Feitas tais considerações, mais um detalhe: meu sonho era que o Clube Social fosse demolido em cada centímetro e no mesmo espaço fosse construído um complexo esportivo, com um estádio para 30/40 mil pessoas, com um ginásio anexo, praça de alimentação, espaço para eventos e prédio administrativo, tudo reproduzindo a fachada do Clube, tombada como patrimônio histórico-cultural. Uma utilização voltada para o futebol e, eventualmente, outros esportes de alto rendimento e sustentáveis. Chega de Clube de bairro deficitário e decadente.

Infelizmente, essa situação não é possível e, por isso, o projeto apresentado pelo grupo utiliza basicamente o mesmo espaço que o atual estádio ocupa, mudando a disposição das arquibancadas e construindo mais um lance de arquibancadas paralelo à Pinheiro Machado.

Como resultado, pelo que foi noticiado, será necessário um investimento (frise-se: com recursos externos, sem um centavo do Clube) que varia entre R$50 e R$100 milhões, para um estádio de capacidade máxima de 15 mil pessoas.

Por mais que o projeto mereça aplausos e a reforma de Laranjeiras seja necessária, não acredito que o melhor caminho a ser seguido seja o de voltar a mandar partidas oficiais no estádio. Este é um modelo que, no curto prazo, atrairia torcedores e geraria demanda, mas, no longo prazo, geraria o efeito reverso e afastaria o grande público do estádio.

Explico. O Fluminense, em 2019, como mandante no Maracanã teve uma média de público de 18.781 pagantes. Foram 600.992 pagantes, para 32 partidas. Arrecadou R$16.202.550,00, logo, um ticket médio de R$26,95. Laranjeiras prevê o máximo de 15 mil pessoas.

Vale ressaltar: esses números foram alcançados sem qualquer esforço e trabalho de aproximação do Clube com seu torcedor e sem comprometimento de ter sempre um estádio bem ocupado. Pelo contrário: ao longo de todos os últimos anos o torcedor se deparou com times sofríveis, com gestões que faziam questão de estar longe do torcedor e só lembravam de sua existência nas últimas rodadas do Brasileiro, com a corda no pescoço e com a necessidade de encher o estádio para fugir do rebaixamento.

O torcedor tricolor gosta de ir ao estádio. Mas, antes disso, gosta de ver um time competitivo, em uma competição atrativa. Na Sul-Americana sempre é feita uma linda festa; no Brasileiro, em regra, é mantida uma média de público aceitável. E tudo isso, repito, sem nenhum trabalho de aproximação do Clube com seu torcedor.

O tricolor, para ir ao Maracanã, por exemplo, em um dia de semana, pega um trem/metrô lotado, esmagado, desce na estação Maracanã, praticamente jogado para fora do vagão entupido, passa por dezenas de ambulantes vendendo cerveja quente ou produtos falsificados do Clube, além dos sempre presentes cambistas querendo se dar bem às custas dele. Paga um valor caro pelo ingresso (R$ 40 contra a Portuguesa na estreia do Carioca). Se reúne próximo ao Bar dos Esportes na Eurico Rabelo, onde toma mais umas duas cervejas e entra. Lá dentro a cerveja é R$ 10,00, os lanches são caros e, em regra, ruins. Ainda assim, nem todos os bares estão disponíveis, formando filas para comprar qualquer produto. Fora um estande ali ou acolá, quase não se vê a comercialização de produtos licenciados do Clube, além dos já repetitivos (e caros) copos, que, ainda assim, fazem certo sucesso. Para fechar, o tricolor se acostumou com um time ruim em campo e com resultados tristes. E, como se tudo isso não fosse suficiente, conseguimos 18 mil torcedores, em média, em 2019.

A solução para o torcedor tricolor voltar a frequentar o estádio, não é voltar para Laranjeiras. Isto pelo contrário, é afastar o tricolor: ora, se o projeto prevê 15 mil lugares e nossa média é de 18 mil, são 3 mil pessoas que serão obrigadas a assistir de casa aos jogos. Neste momento, vem o argumento: “ah, mas seriam só os jogos do Carioca!”. Num exercício de futurologia, infelizmente, não seria isso que aconteceria. No primeiro momento, mandaríamos os jogos do Carioca. Faria sucesso. Claro, o torcedor tricolor, em geral, sente saudades de Laranjeiras. A demanda seria alta, a atratividade seria grande e a novidade faria com que o estádio estivesse cheio.

Em um segundo momento, com o “sucesso de público” no Carioca, entre aspas porque o máximo que o estádio aceitaria seriam 15 mil pessoas, mas geraria uma busca superior à demanda, os gestores tricolores pensariam: podemos mandar jogos das fases iniciais de Copa do Brasil e contra pequenos no Brasileiro. Mais uma vez, daria certo. Logo, logo, a temporada toda estaria sendo disputada no centenário estádio das Laranjeiras e esses 18 mil que estavam lá no Maracanã apoiando o Clube, estariam restritos a 15 mil em Laranjeiras, mesmo em jogos de muito maior potencial de atração de público.

No longo prazo, o torcedor tricolor se afastaria do estádio, restrito aos 15 mil presentes nas Laranjeiras, insuficientes para lotar qualquer estádio do tamanho da grandeza do Fluminense. Ir ao estádio é fruto do costume, é um hábito como ir à praia, como almoçar aos domingos com a família, enfim, é um costume adquirido com o tempo, com a repetição, que deve, sempre, ser incentivado. A partir do momento em que tirou essa prática do dia-a-dia do torcedor, o hábito começa a desaparecer e não se traz ele de volta, afinal, o conforto do sofá, consideradas toda aquela saga contada ali atrás, tem muito valor.

O Fluminense tem uma grande oportunidade nas mãos: o Maracanã. Basta entender que o torcedor é, no fundo, um consumidor, que quer ter uma experiência agradável no estádio. Quer uma ida tranquila, quer opções interessantes do lado de fora do estádio, quer poder curtir a arquibancada e, claro, quer um bom time em campo. E, em cada detalhe desse, tem uma infinidade de oportunidades para os gestores fazerem o torcedor aproveitar cada segundo da experiência de ir ao estádio e, assim, jogo a jogo, melhorar a sua média de público, sua receita e a experiência do torcedor como consumidor. E, principalmente, fomentando o hábito do torcedor de estar sempre presente no estádio.

Assim, a reforma de Laranjeiras é bem vinda: jogos da base, treinos do profissional, eventos com torcedores, tudo isto seria muito interessante no histórico estádio. Jogos do profissional? Temos muito potencial de atrair o torcedor tricolor para o Maracanã, basta reativar a conexão time-torcida e tornar a experiência atrativa. Laranjeiras deverá ser sempre cultuada como o berço do futebol. E, com tudo isto, voltaremos a ter um Maracanã financeiramente atrativo e com as arquibancadas lotadas de camisas com as três cores que traduzem tradição.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

#credibilidade

1 Comments

  1. Não entendi a sua conta. Público médio de 18 mil não significa esse número de torcedores em jogos contra Madureira e semelhantes. Jogos contra clubes pequenos sempre serão deficitários no Maracanã, não vejo outra solução, em curto e médio prazo, senão jogá-los em Laranjeiras. A nossa torcida diminuiu ao longo dos tempos, graças a incompetência de nossos dirigentes. Ninguém pretende fazer um clássico em Laranjeiras, apenas jogar as partidas deficitárias lá, o que nos daria um lucro muito bem…

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