O maravilhoso universo paralelo tricolor do Presidente Mario (por Raul Sussekind)


 
Mario hoje começou devagar, abatido. Parecia gripado e desanimado. Lendo uma apresentação semi-tosca, que elencava os avanços do clube em seus três anos de (sic) gestão. “Austeridade, credibilidade e estabilidade”, segundo suas palavras. Mencionou consertos no aquecimento das piscinas e reduções nas contas de consumo de água e luz, obras nos escritórios das Laranjeiras, implantação de sistemas de gestão financeiros para operação do clube. Sem dúvida, aspectos importantes para o dia-a-dia de um clube social, mas cujo interesse para a torcida do clube de futebol é zero.
 
Aos poucos foi entrando na narrativa que o caracteriza, que é a de presidente eficiente, de gestor responsável, que está tirando o clube do caos e o levando ao profissionalismo. Aí parece que acordou, e passou a rechear seu discurso com aqueles termos jurídico-empresarias que adora, que compõem o personagem de grande executivo: “compliance, equacionamento de dívidas, reconstrução, trabalho em equipe”. Disse que as dívidas cíveis e trabalhistas estão equacionadas, mas esqueceu de dizer que estão lastreadas em medida judicial liminar, e que portanto tudo pode mudar da noite para o dia. Disse que as dívidas tributárias estão em fase final de renegociação, e que a Certidão Negativa de Débitos (CND) está próxima, mas esqueceu de mencionar que, nas Demonstrações Financeiras do clube, o auditor independente ressalvou o valor das dívidas do PROFUT, o que equivale a dizer que não se sabe de quanto é essa dívida, em linguagem contábil. E, para finalizar a parte administrativa, ressaltou o protagonismo e a liderança de sua gestão nas grandes discussões do futebol no Brasil, como a SAF, a LIBRA e a participação na Comissão Nacional de Clubes da CBF. Oi? Nesse ponto da exposição, eu pensei em desistir e ouvir Pink Floyd. Se é para deixar a mente navegar em realidades paralelas, que pelo menos seja ouvindo arte genial.
 
Mas o melhor (ou não), ainda estava por vir. Mario resolveu enfatizar as conquistas do futebol. Mencionou o título estadual de 2022. E aqui faço uma pausa para concordar com ele. Conquista maravilhosa e importantíssima para a torcida. Para mim, Estadual é coisa séria e decidir contra o Flamengo é duplamente sério. Título a ser comemorado e exaltado sim! Mas, afora isso, foi uma ode ao apequenamento do clube. Ele celebrou o fato de o time terminar dois campeonatos brasileiros na “primeira página da tabela”, celebrou duas classificações à Libertadores (Pré-Libertadores vale?) e celebrou o aproveitamento de aproximadamente 55% dos pontos disputados nos 206 jogos sob sua gestão. Oiiii? Presidente, eu te faço uma pergunta que os jornalistas não fizeram: qual o clube que o senhor crê que está dirigindo? Aproveitamento de 55% sendo celebrado como performance de sucesso? Foi melancólico. Triste. Deprimente.
 
Para fechar, anunciou, com grande pompa, a assinatura de um contrato de mandato a uma instituição financeira, para que esta busque alternativas de crédito e renegociação de dívidas no mercado. Anunciou como sendo uma conquista e um passo decisivo para a reconstrução do clube. Evidentemente não se tem os exatos termos deste contrato, mas da forma com que foi anunciado, em bom Português, pode ser resumido como “tenta alguma coisa para nós, e se conseguir, vamos avaliar”. É importante abrir essa alternativa? Sem dúvida nenhuma. Mas o efeito prático e concreto do contrato no momento é zero. É manchete para jornal, para tweets, para contribuir com a narrativa de grande gestão.
 
Depois respondeu algumas perguntas, em meio às quais deu a única notícia relevante e positiva da tarde-noite: garantiu que André, o melhor volante do Brasil, não será vendido nesta janela de transferências. É possível que seja verdade, pois as eleições se avizinham no clube.
 
Por fim, agradeceu à torcida por aplaudir o time numa derrota por 2 a 0, em casa, para um adversário modesto. Disse que o fato repercutiu muito bem no vestiário e que o emocionou muito. Felizmente esse foi o ponto final, porque eu realmente já havia exigido do meu estômago mais do que ele poderia aguentar.

4 Comments

  1. Lamentavelmente, as últimas gestões do Fluminense têm sido suspeitas e inconfiáveis ! Oremos por uma nova gestão, que saiba e queira cumprir com maestria o real significado dessa palavra !! ST !!

  2. Isso mostra o quanto os dirigentes de clubes são mambembes…. Imaginar que um Barcelona, na década de 90 abriu mão de patrocínio e tinha aquele time…. Não, futebol no Brasil não é sério. O quê assusta é essa falta de compromisso e tendo alguns resultados positivos…. Podemos falar dos dirigentes, mas é a cadeia toda dos clubes. O time tem um treinador e suas estrelas. Caso o treinador dê uma chamada na estrela do time, pronto…crise na certa e em 4 rodadas o treinador cai.. Isso não é sério. Um time de base está todo entrosado, chega um empresário influente e quer colocar seu “menino” para aparecer….Isso não é sério. Isso não é o mercado do futebol, isso é a corrupção dos nossos times e dirigentes… Temos tudo para sermos uma poderosa força desse esporte, mas somos apenas as “vacas” de onde retiram o leite do futebol.

  3. Há algum tempo eu levantei a tese de que esse era o teto da administração Bittencourt. E pelo visto, eu estava certo.

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