Amigos, amigas, longos 71 anos nos separam da conquista do primeiro Mundial de Clubes, no longínquo ano de 1952, quando muitos de nós, inclusive eu, não éramos sequer nascidos.
Na ocasião, enfrentamos adversários problemáticos, como o artístico Sporting de Lisboa, o retranqueiro Grasshopper, da Suíça, semifinalista da Copa do Mundo dois anos depois, e o formidável Peñarol, base da Seleção Uruguaia, campeã da Copa do Mundo de 50, no mesmo lendário Maracanã.
Passamos pela fase classificatória em primeiro e massacramos o Áustria Viena nas semifinais para depois, diante do Corinthians, conquistarmos o cobiçado título internacional. A vitória mais marcante foi o 3 a 0 diante do Peñarol, ainda na fase de grupos, em que oito grandes forças do futebol internacional se enfrentavam, algo mais parecido com o que teremos a partir de 2025.
Na ocasião, o futebol brasileiro ainda amargava a perda do título da Copa de 50, o Palmeiras já vencera a edição anterior da Copa Rio e o que talvez ninguém soubesse ainda é que o Brasil se tornaria a grande força do futebol mundial, processo que teve início em 1958, com a conquista da primeira Copa do Mundo.
Naquela época, craques brasileiros e tricolores, como Didi, Pinheiro, Castilho, Marinho, Telê, Orlando e Cia, não eram exportados para o futebol europeu. Ainda que mais ricos desde então, atuavam com jogadores formados nos seus próprios países, época em que Rio de Janeiro e São Paulo, caso fossem países, estariam tranquilamente entre as cinco maiores forças do futebol mundial.
O tempo passou, vieram as conquistas da Seleção Brasileira e do Santos, o futebol brasileiro virou atração e os clubes daqui recebiam muito dinheiro para fazer exibições no exterior. Aos poucos, porém, a lógica começou a mudar. Cada vez mais craques brasileiros eram comprados pelo futebol europeu. Nada que afetasse nosso poderia, até que vieram as fatídicas Copas de 1982 e 1986. Não porque o Brasil, de Telê Santana, não tivesse estado à altura das nossas tradições, mas porque o título não veio e alguém decidiu que doravante nosso desafio era imitar os europeus.
Desde então, passamos a nos aculturar e a cada vez mais exportar nossos craques. Ainda assim, as conquistas da Seleção Brasileira e dos clubes marcavam nosso espaço com louvor. Houve, porém, um momento em que a Alemanha, derrotada pelo Brasil na final da Copa de 2002, resolver mudar totalmente as características do seu jogo.
Impulsionado pela máquina de Guardiola no Barcelona, com seu tic-taca, o futebol europeu mudou seus conceitos futebolísticos, até chegarmos ao que é hoje, mas não sem, ao longo desse processo, termos vivido nosso maior vexame, uma ferida ainda aberta, que foi o intragável 7 a 1 diante da Alemanha, dentro de nossos domínios, na semifinal da Copa de 2014.
Desde então, o futebol brasileiro esboça uma reação conceitual, tentando se livrar da cultura da correria insana, do futebol defensivo, do jogo por uma bola e das trombadas intermináveis sem ela. É um processo difícil. Já são onze anos sem ganhar um Mundial de Clubes, sendo que os três últimos foram conquistados em jogos em que os goleiros foram os grandes protagonistas.
A missão de interromper essa indesejável rotina caberá ao Fluminense Football Club a partir do dia 18 de dezembro. Um Fluminense que, ao mesmo tempo, resgata muito da essência do futebol brasileiro e propõe novos conceitos para esse esporte. Aproximações, toque de bola paciente, valorização da posse e ofensividade sem concessões.
Será que é possível que o Fluminense consiga cumprir essa nobre missão? Bom, em primeiro lugar, devemos reconhecer que não será uma eventual conquista tricolor que redimirá o futebol brasileiro. É preciso, dentro dessa mesma perspectiva, muito mais que isso. Não pode ser a famosa “vitória cagada”. Precisa ser algo mais parecido do que a final entre Liverpool e Dissidência, com jogo de igual para igual, apesar da derrota brasileira.
Só que o futebol brasileiro não se reduz ao Fluminense ou ao feito incompleto da Dissidência. É preciso muito mais que isso. É preciso uma reviravolta na correlação de forças econômicas, o que passa pela reorganização do futebol brasileiro e até mesmo pelo crescimento econômico do país. Se não é assim, uma eventual conquista tricolor, por mais contundente que seja, será não mais que uma efeméride.
Tirando tudo isso, não devemos subestimar o nosso Tricolor nessa competição. Temos coletividade e individualidades que podem nos levar à igualdade de ambição com qualquer um. O que precisamos é que Fernando Diniz mire no teto dessa equipe, aquele que foi alcançado tantas vezes ao longo das duas últimas temporadas. Até podemos contar com a sorte, contanto que sejamos capazes de sorrir com a mesma intensidade para ela.