O erro de Enderson (por Walace Cestari)

enderson moreira alexandre loureiro

E estamos nós, debruçados sobre resultados, remoendo as possibilidades e querendo o que já dispensamos. Somos a insatisfação em forma de torcida. A incoerência patológica em gritos passionais. Um caso freudiano, sem dúvida ou com dúvidas, certamente. Queremos a saída do treinador dos maus resultados das últimas rodadas. Volta Abel. Volta Cuca. Amamos hoje aqueles que pedimos para sair no passado.

Entra treinador. Amor eterno. Sai treinador. Ódio mortal. Somos uma ciranda. Somos anualmente versos de Chico Buarque. Só neste ano, três comandantes já se expuseram à nossa inconsistência. Sou o Fluminense, o time dos muitos técnicos. O clube das trocas de comando.

O primeiro nos chegou como quem vem do vizinho. Trouxe um bom futebol passado e um suspiro de alegria. Prometeu tanta mudança, uma base aguerrida, nos mostrou os seus scouts e pregava a evolução. Nos encontrou no Carioca e empatou com o pobre Tigres. Raivosa com Cristóvão, a torcida disse não.

O segundo nos chegou como quem vem da livraria. Trouxe quilos de artigos, de livros e revistas. Um nome complicado e um passado invisível, desenhava vinte esquemas, planejava rodízio e substituição. Não passava mais de um jogo sem fazer uma invenção. Nos encontrou por pouco tempo e goleado no Brasileirão. Revoltada com o Drubscky, a torcida disse não.

O terceiro nos chegou como quem chega do nada. Nada dele esperávamos e nada ele prometeu. Pouca expectativa, mas receio de montão. Nosso único desejo: contrariar a previsão. Mas, de repente, algo mudou. Guerreiros ressurgiam, G4, campeão! Oito jogos e derrotas, acabou a ilusão. Como nada não é tudo, a torcida agora lhe diz não.

Paródias à parte, Enderson não é o pior treinador que já passou pelo Fluminense. Aliás, não é nem mesmo o pior do ano. Seu grande erro foi nos dar, em algum momento, esperança.

Enderson enfrenta problemas que dificultam o trabalho como a chegada de novos jogadores, desfalques e contusões, preparação física. E confunde, se atrapalha, escala mal, substitui errado. Por quê? Porque não é genial. É um treinador dentro da média de quase todos os outros do país. Tirá-lo para colocar outro de mesmo nível? Não faz sentido. Já expulsamos do clube gente de mais nome. Ele não conseguiu arrumar a zaga? Quem conseguiu nesses últimos anos?

Enderson precisa ser empoderado. Não pode viver com a sombra do que deve ou não escalar. Deve montar seu time e as peças devem se encaixar no esquema. Assim voltaremos a vencer. Talvez não sejamos campeões. Nem mesmo cheguemos à Libertadores. Queremos, mas não é nossa obrigação. Não era no começo do campeonato.

Colocando na balanças os erros de arbitragem e aquelas coisas do futebol, vacilamos feio contra Chapecoense, Avaí e Joinville, contra quem nenhum apito pode nos tomar a vitória. Jogamos mal contra Vasco e Atlético. Não foi má atuação diante do Corinthians, líder, em casa, reforçado de Sandro Meira Ricci. Mas fomos bem em inúmeros outros jogos improváveis antes deste. Mas a memória é curta nas críticas.

Queria ter ganho todos os jogos. Queria que Enderson fosse o Guardiola. Mas não é. E não vejo nenhum Mourinho por aí dando sopa para treinar o Flu. Uma ciranda de treinadores não fará esse time jogar bola. Sabemos disso.

O erro de Enderson foi nos fazer sonhar com mais do que achávamos poder ter no início do campeonato.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Imagem: Alexandre Loureiro/Lancepress

o fluminense que eu vivi tour outubro 2015

3 Comments

  1. Genial!!! Só com arte para abrandarmos a esquizofrenia da torcida Tricolor. Parabéns.

  2. Ser racional, falando de algo que é pura paixão, ainda mais parodiando o genial Chico Buarque, não é para qualquer um. Sigo o voto do relator!!!

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