ATENÇÃO: COLUNA IMPRÓPRIA PARA MENORES DE 18 ANOS. CONTEÚDO SEXUAL EXPLÍCITO, SUGERIDO E LINGUAGEM HARDCORE.
VI
MEET EL PRESIDENTE
Sonhava e sorria. Sábado seria o dia de sua consagração. A festa no club seria o marco de suas demonstrações de poder supremo. Queria ser cumprimentado pelos torcedores, bajulado pelos dirigentes, procurado pelos garotões tricolores que tanto desejava em Pecadópolis. Queria ser um Coringa de Tim Burton, um Kane de Orson Welles ou até um robertomarinho.
https://youtu.be/kQVWYu4BdMo
Passara os dias anteriores nas redes antissociais, praguejando contra inimigos, caçando blogueiros comunistas, sonhando com um lutador calvo e maduro a cobrir-lhe o corpo trêmulo de desejos que não ousam dizer seu nome.
Era – ou acreditava ser – o dono do Fluminense, de fato e de direito. O exemplo a ser seguido. Um homem branco, de bem, contra a corrupção, defensor do Estado Mínimo e da nova ordem tricolor. Um sócio respeitável e influente, um verdadeiro líder.
SCROOTCHTRRRRSKOINGGGG!
Um copo espatifado no chão era a diferença entre a fantasia e a realidade. Estava de volta ao mundo real, onde era um merda, um zero à esquerda, um escroque de pequenas malandragens. Despertado, mexeu no smartphone e uma mensagem de whatsapp colocou o terror no quarto do marido de Esmeralda:
“Seu feladaputa (sic), tá pensano (sic) o que nessa porra? Que pode fazer o que quiser, seu merda? Ficar botano (sic) foto noça (sic) em público? Fique você sabeno (sic 2) que eu sou uma selebridade (sic)o pesidente (sic) de uma poderoza (sic) página na internet; tenho fama, fãs, e poço (sic) fazer com que você seja banido da Terra. Tome vergonha nessa cara, seu pederasta safado duma figa! Eu acabo com a tua fama, sua bixa (sic) velha.”
Pensou em responder de primeira, mas limitou-se a mandar um polegar positivo para encerrar a questão. Em vez de bancar o machão, recuou. Afinal, fazer papel de macho man aí seria demais.
No passado, coisa do começo, havia a explicação: Zanzi já tinha vivido emoções diferentes e pecados gulosos com El Presidente. Frequentaram o GGG do Scala pelo menos duas vezes em anos diferentes. E tomaram o famoso “banho da alegria” no clube ao menos cinco vezes.
A vingança contra o poderozo neotricolor não tardaria. E seria firme. Ninguém pode desafiar o Fred Mercury prateado das Laranjeiras sem sofrer retalhações.
II
FAREJADOR DA PORRA ALHEIA
Sempre com a certeza de ser um matreiro, Chiquinho chegou antes ao psicanalista. Precisava levar um lero com o doutor Freud da bicharada, sugerindo como deveria ser conduzido o tratamento de Garrastazu. Em algumas horas, o papagaio lá chegaria levado por Esmeralda. Ela estava absolutamente crente de que algumas sessões de hipnose poderiam revelar o trauma que havia levado Garrastazu à perda da fala. Queria tomar seu café da manhã ao som de “eu te amo, meu Brasil, eu te amo! Meu coração é verde, amarelo, branco, azul-anil!”
Zanzibar pagou a manhã inteira de consultas, numa espécie de abadá-veterinário, para ter a certeza de que teria comprado tempo suficiente para convencer o hipnotizador a pensar na sua proposta: inocular uma história em Garrastazu, de que ele teria sido criado por indígenas indolentes e vagabundos, verdadeiros silvícolas cachaceiros de short adidas, e que havia participado de tudo o quanto fosse ritual de sexo xamânico, com ayuasca a dar e vender. Teria se lembrado disso ao ver Chiquinho se arrumar, todo perfumoso, para o grupo de estudos do Minha Luta, quando ainda só estava de toalhinhas, uma na cintura e outra, como um turbante. A recordação da suruba cosmológica na aldeia teria vindo forte, impactante, vendo seu dono como se fosse um cacique gostoso.
Queria desmerecer toda e qualquer frase do louro, dando um levadinho ao doutor das almas para que dissesse à Esmeralda que qualquer coisa que fugisse desse script seria neurose das brabas, difícil de curar. Era preciso acessar o perigoso inconsciente de Garratazu, que só com muitas e muitas sessões poderia, quem sabe, começar a melhorar. Zanzibar combinou que, se o pet, por algum acaso, se engraçasse e começasse a revelar tudo o que havia visto, tanto no apê da Siqueira Campos como nas derradeiras saudosas sessões de agitado bate-papo do DOI-CODI, cada um dos encontros na vet seria um pesadelo inesquecível: penas, unhas, olhos e bico, fora o brioco cloaquento, sentiriam a fúria chiquínica de cada bofe que tivesse lhe dado um fora na sauna do clube do seu coração.
Ao sair da veterinária, o ambiente erótico descabido da rua Ministro Viveiros de Castro, beliscando o seu saco escrotal com agulhadas quase mortais do gozo encruado, lhe trouxe, como numa espécie de transe, a 1987. O time super campeão, do casal de ébano e do craque de araque da Ponte da Amizade, deveria ser destruído. Pessoas que Zanzibar havia conseguido isolar do cartaz do Feliz dia do Amigo. Que alegria! Ninguém dali jamais quis saber de Zanzibar, e, naquele ano, a torcida ainda tinha esperanças de que alguns títulos poderiam surgir com o que restava do poderoso esquadrão. Mas era preciso fazer caixa, afinal, a revolução redentora e gloriosa já estava com seus dias contados e as jogadas de Chiquinho esgotavam-se. Das ante-salas dos gabinetes de Brasília, era necessário apontar as baterias de seus trambiques para a Rua Álvaro Chaves. Não sabia mais como fazer, depois de mover o mundo para negociar gente obscura para renovar o elenco. Isso! Renovação era preciso! Fazer uma Aliança Renovadora Nacional Tricolor, ARENA-Tri! Queria anos de jogadores sinistros, verdadeiros pernas de pau, quilos de esterco adubando diariamente o campo, amontoando de esgoto o coração da torcida. Essa turba mal acostumada! Zanzibar tinha a meta de sua vida: o time ir à segunda divisão, quiçá à terceira! Aí, seria uma festa danada! Jamais a escalação do time seria cantada de cor e salteado, entupindo seus ouvidos, enojando sua estranha verve tricolor com nós nas tripas! A cada partida, quase meio time mudaria, pra pior, numa ciranda da morte do futebol jamais vista nas Laranjeiras.
Essas lembranças faziam-no arrepiar-se, as bolas ficarem duras, e o ânus frouxo de volúpia sexual, sujando a fralda de caroço de feijão e milho. Nem ligava, porque, na sua imaginação devassa e canalha, só pensava na porra molhando suas nádegas. Naquele abril de 1987, em plena fila da comunhão na Igreja santa Cruz dos Militares, na missa de comemoração da revolução de 1964, ao lado de tantos amigos e conhecidos homens brancos meritocráticos de bem, desses que adoram censurar o trabalho dos outros, principalmente jornalistas críticos, teve uma ideia brilhante. Chiquinho começaria a plantar boatos sobre jogadores do time estarem cansados de jogar no clube, e só ficariam mais um tempo ali se tivessem um jeton nos vencimentos. Ele havia apoiado a eleição do presidente Faraó, e feito a cabeça do amigão de que era preciso mudar as coisas pra encher os bolsos. Por pura atração pela virilidade de homens de ouro dos tempos dos excessos necessários nas delegacias cariocas, fez o lobby para a contratação do Delegado das Alterosas para ser o comandante do time a ser esfacelado.
Naquele mesmo mês, encheu as caixinhas dos repórteres de rádio e televisão, de alguns comentaristas chegados ao pessoal de Arcanjo, aparentados, até, dos homens do bicho. Os boatos se espalharam. Muita gente feliz na corte de Zanzibar, sempre à custa do prejuízo de milhões de pessoas. Seria no jogo contra o Botafogo. Com certeza! O zero a zero estava confirmando seu plano. A chuva caía, molhando a camisa verde de Antonio, fazendo Zanzi morder os beiços de modo voraz, ficando vesgo da contração anal. Ficou tão feliz que deixou as tribunas e foi se lançar às bandeiras rasgadas da torcida destemida. No túnel de acesso, sentiu a arquibancada tremer e o grito de gol. A água molha sua cara de pau, as pesadas bandeiras maltrapilhas tremulando e a torcida, junto com o Careca do Talco, se abraçando. Zanzibar chorou de tristeza, escroquemente se misturando aos abraços emocionados com a chance de chegar a mais uma final. Os braços másculos faziam de suas lágrimas um poço de delírio erótico, mistura de sentimentos que lhe atordoavam. Mais um gol! Zanzibar não aguentava mais aquilo. Foi jogado pra lá e pra cá, degraus acima e abaixo das arquibancadas. Era preciso torcer contra na final de turno, e plantar o maior boato de todos.
A semana de clássico contra o Vasco, então freguês, foi tensa para Chiquinho. Se o time fosse campeão, seus planos com Faraó não poderiam seguir adiante. Pegou empréstimo com amigos da boa e velha caixinha da OBAN, numa rápida ponte-aérea, e aumentou o agrado aos formadores de fofocas: o goleiro estaria vendido! Ídolo da torcida há anos, criado no clube, era mais um a ter rejeitado historicamente as chegadas de Zanzi na tentativa de filar um banho da alegria. Era hora de queimar quem não quis fazer o mesmo com a sua rosca gostosa. Um a zero até o segundo tempo e nada de o adversário ameaçar. Duas jogadas, em minutos, fizeram de Chiquinho a pessoa mais feliz naquele estádio! Dois golpes muito parecidos acabariam com uma época de ouro no clube que nunca mais voltaria a ser o mesmo. Ali, sim, começaria o reinado de Chiquinho. O Bobo da Corte viraria um fiel cortesão de Faraó e seus asseclas, e mesmo em suas versões modernosas, em edições revistas e atualizadas.
Bebeu tantas latas de cerveja ao sair do estádio que foi parar em plena praça do Lido, suado, cagado, mijado. Transou sem camisinha com travestis atrás das colunas do edifício Chopin, porque não havia grades, naquela época de desbunde. Quem diria?!? Fazia sexo oral enquanto era carcado! Dois troncudos sanduichando o grande vencedor da noite. Sentia raiva daqueles que viviam sua sexualidade com liberdade pública, e até ganhando uma graninha. Zanzibar perdeu a cueca, e, depois de um copo de absinto, três carreiras de cocaína da boa e um skunk no banheiro de um dos restaurantes da Atlântica, caiu de cara no chão, diante do colégio público da praça. Buscava sua cueca, pedaços dela. Mas queria mesmo era camisinha usada cheia de porra! Como um perdigueiro astuto da rameirice, de quatro, seminu, como um Snoopy da putaria, farejava cada pedra portuguesa em busca de preservativos masculinos usados. Encontrava vários, lambia, sentia o gosto de porra alheia, de paus misteriosos, outrora rijos e melecados veiosos. Uma delas chegou a passar no ânus, enfiando de leve com o dedo anular, depois indo com tudo com o indicador. Peidou e tirou a proteção de borracha peniana de seu ninho arrombado da deliciosa transa louca da portaria do condomínio das celebridades. Foi assim, tesudo como nunca, prevendo dias de glória, até a Prado Júnior. Seus joelhos estavam em carne viva, fruto da verdadeira procissão da vitória, enlace de anos de tragédia tricolor. Nem a gonorréia dos dias subsequentes estragaria a insustentável leveza do seu ser, contemplada com uma escarrada na cara do goleiro, finalmente dispensado do clube. O primeiro da era faraônica que ali se perpetuaria.
De volta ao presente, era preciso ficar na moita, plantando a censura no clube, mas sem ser pego e se expor. Afinal, para todo malandro tem que ter um otário.
III
DÁ PRA ELE!
O dia amanhecia tenso na suíte presidencial do Palácio do Rei Hotel, na Haddock Lobo, na Tijuca. Chiquinho Zanzibar e sua cria de ocasião haviam passado a noite comemorando a vitória sobre as raposas do Cruzeiro. Mas o mal estar era latente.
Chiquinho, corroído pelos ciúmes numa intensa discussão, havia dado uma bofetada na cara do boyzinho, não parando de gritar:
“Puta que pariu… bofe desgraçado… me liga no meio da noite dizendo que queria fazer amor comigo, tenho que mentir para a gorda da Esmeralda…”
Zanzi inventou um apoteótico acidente de jet ski, em Angra dos Reis, na marina de Lorefredo de Cantabria y Leon, neto de um banqueiro espanhol falido, para escafeder-se cheio de tesão pensando no reizinho da pele branquinha que teria pela frente, imaginando tirar a calcinha do mancebo com a sua dentadura de dentes de ouro:
“Que amor, que nada! Passou a noite toda no Twitter falando e sacaneando esse comunista filho da puta do Martinez! Há 16 anos você só pensa nele… Cansei, seu metido!”
Chiquinho espumava de ódio. Já não bastasse que o seu dote sexual sem aditivo já não ficava 100% ereto, ainda tinha que ter a atenção do amado em doses econômicas. Estava transtornado, muito diferente do alegre senhor que horas antes perdera a virgindade ferroviária na viagem Edson Passos x Central do Brasil.
“Vai lá! Dá o cu pra ele, já que você gosta de machão! Pede pra ele te enfiar a porrada… quem sabe se você não goza sem ele te meter?”
Há exatos trinta e cinco anos não se via Chiquinho Zanzibar tão irritado, colérico, desde o fracassado intento de explodir o Riocentro, exatamente no dia 30 de abril de 1981, quando um companheiro seu de tortura morreu e o outro perdeu metade da densidade escrotal quando a bomba, aquela bomba, explodiu antes da hora dentro daquele Puma de cor cinza metálico.
Zanzi era um dos cavaleiros da ordem e da moral, todos eles ligados de alguma forma ao CIE, SNI e DOI-Codi, participantes da reunião no restaurante Cabana da Serra. Mapas sobre a mesa e ele havia saído, por ser o mais novo, com a missão de pichar “VPR” nas placas de trânsito da Grajaú-Jacarepaguá.
Naquela noite em que nada deu certo, enquanto o grande compositor Gonzaguinha terminava o show dizendo “Pessoas contra a democracia jogaram bombas lá fora para nos amedrontar”, Chiquinho Zanzibar chorava de raiva intensa pela falha no artefato, que explodiu antes da hora. Pelos cálculos dos torturadores, poderiam morrer umas duas mil pessoas, todas comunistas filhas da puta. Foi a maior chance da sua vida de entrar para a história da sociedade da extrema-direita carioca.
Três décadas e meia depois, agora a explosão de raiva de Chiquinho é outra: os ciúmes pela interferência indireta do troglodita entre ele e seu boyzinho da pele branquinha, tentando argumentar que só tinha olhos para o seu amo.
Ainda colérico, Zanzi deixou uma nota de 50 reais sobre o lençol, marcado por virulentas manchas marrons e de esperma. Desejava estar no clube antes do meio dia, para articular a movimentação do seu grupo na Flu Fest, a impactante celebração de aniversário do Fluminense em plena sede das Laranjeiras.
Em sua cabeça, o plano era neutralizar o grupo dos malditos e fedorentos blogueiros comunistas tricolores, quase uma quadrilha, uma falange vermelha de mierda: Andel, Vagner, Gustaf, D2, Gonçalvez, Coutcero, Titto, conhecidos pelas críticas ao stablishment e por denunciarem a lavagem cerebral feita pela seita que fundou a nova sociedade tricolor da ordem grâ-kavernista, da qual ele se sentia, o Ibrahim Sued, expressão maior dos tempos em que o “café society”, no seu particular “Gigi, eu chego lá!”.
No incensado templo da maçonaria tricolor e seus templários, Zanzi se sentia um semideus, onde a sua perversão dava vazão ao seu alto grau de libertinagem: homofóbico do mundo irreal, machão da “Pão com cocada (a geração)”, dos baseadinhos fumados no antigo píer de Ipanema que embaralhavam as mentes daqueles garotos perversos da Farme de Amoedo, a seguir um berço esplêndido do amor entre iguais. E começou os trabalhos.
Como um bom discípulo de Eduardo Cunha, Chiquinho sentia-se responsável por colocar em prática a marcação cerrada aos comunistas do manifesto. Sabia que tinha que proteger seu boyzinho da pele branquinha, figurinha ímpar da disseminação do ódio, valente de ar condicionado, putinha que é do Zanzibar, que também é putona de outros tantos ursos peludos das festas na rua do Catete.
Ao final da reunião, antes de se dirigir à manicure perguntou duas vezes:
“Será que eu consigo uma camisa autografada pessoalmente pelo Maranhão no vestiário? E afinal de contas, quando estreia o Murilinho em campo, que tem carinha de bom rapaz, com aquelas tatuagens todas?”
Apesar de que “cavalo não desce escada”, na máxima suediana, o gosto de Zanzibar pelos “Cocadinhas” do momento era incontrolável e apesar de que “Em sociedade tudo se sabe”, ao sair da reunião dos templários ele subitamente começava a articular o mais abominável de seus planos: tinha feito um seguro de vida para Esmeralda A Gorda (para ele, dentro de seus conflitos loucos, sempre gorda)… A morte dela seria no próximo carnaval, quando a sua fantasia com mil lâmpadas LED – tal qual a Árvore de natal da Lagoa – explodiria no alto do carro alegórico na Sapucaí, um remember do Riocentro, só que desta vez sem falhas.
Sem deixar terminar o dia, sacou seus poderosos smartphone e reservou duas passagens para o jogo contra o Atlético Paranaense: “Desta vez vou sozinho no sábado, para aproveitar a noite de véspera do jogo. Me falaram muito bem da “Sauna Caracala” no centro de Curitiba… quem sabe?…”
E, apesar de não passar de um “caixa baixa” com sua eterna muquiranagem, escolheu o seu modo de ser feliz nos devaneios privados e respeitosos da homoafetividade curitibana. Mais um final de semana longe de Esmeralda…
Entretanto, quem sou eu, Alva Benigno, para criticá-lo? Logo ele, o importantérrimo Chiquinho Zanzibar que está me levando ao estrelato! O conceito de ética neste mundo é realmente algo deveras elástico.
Mais um flashback de Ibrahim Sued: “Ademã, que eu vou em frente.”
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