Naquele tempo (por Paulo-Roberto Andel)

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É sempre bom ver o Fluminense, mesmo que tenham feito todas as barbaridades no Maracanã em nome do progresso. Caso de daqui a pouco: velhos sentimentos num velho endereço com um belo e desalmado prédio.

Houve certa vez um Fluminense x Paysandu, sábado às cinco da tarde. Do fim da década de 1960 até o adeus ao século XX, cinco da tarde era o horário padrão do futebol nos finais de semana. Quarta ou quinta, nove da noite. A Globo ainda não mandava e desmandava de forma geral.

O jogo. Campeonato brasileiro de 1981. Vencemos por 4 a 1, Cláudio Adão fez os zagueiros baterem cabeça, a volta era no metrô de São Cristóvão até Botafogo. Lá, a baldeação para Copacabana no ônibus apelidado de “Mengão”. Ugh!

O climão era entrar na geral, deitar no concreto e ver a cobertura do estádio como se fosse um cinzeirão. Ou um telão no show do Pink Floyd.

Seu Armando cumprimentava a garotada, Tia Helena oferecia fidalguia aos tricolores novatos, Antonio e Zezé tramavam algum protesto contra a incompetência dos dirigentes.

O moço do refrigerante, o moço do cachorro quente Geneal, o moço do leite de minicaixinha CCPL. O moço do amendoim em cones de papel e latinha para esquentar. Testes no autofalante e o vozeirão do Victorio Gutemberg: SUDERRRRJ INFORMA.

Edinho era o comandante dentro do campo. Robertinho era um monstro na ponta-direita, Zezé na esquerda, o Mário chutava de canhota. Rubens Galaxe, pau para toda obra. Naquele dia jogou o Zezinho na lateral.

As pessoas tinham a exata noção de quem era Chico Buarque: um  escudo do Fluminense no melhor cancioneiro brasileiro.

Vivíamos os últimos anos da ditadura no país, mas o futebol era a verdadeira praça de libertação nacional.

Todo mundo cantava junto os sambas da Marquês de Sapucaí, ainda sem o Sambódromo e muito lucrativa para o sr. João Mendes, vide andaimes. E as batidas na iminência de fazer (ou sofrer) um gol eram uníssonas. Os surdos viravam orquestra de percussão. Bandeirões a granel.

Não que tudo fosse fácil, longe disso: o time perdia jogos onde era favoritíssimo e engrossava nos clássicos. Há 34 anos, o Fluminense era um vulcão ativo com os problemas de sempre: falta de grana, ingerências, vaidades et cetera. O campeão de 1980 só voltaria a brilhar em 1983: esse intervalo serviu para as idas e vindas necessárias.

Não tem mais gente humilde, nem preliminar nem geral. Ingresso é para quem tem grana, por menor que seja.

Aí está o Flu, vivo e feliz depois de tanta coisa boa e ruim. Nenhuma história se resume a títulos. O futebol é muito mais do que isso.

Logo mais, esperamos luta, garra e talento. Mesmo às sete da noite, com sushis e sashimis no processo de gourmetização do Maraca. Meu pai me puxava pela mão, agora eu puxo a Marina ou o filho de algum amigo. Meu amor não dorme, meu amor não sonha: não se fala mais de amor em Gotham City. Vendedores de amendoim na latinha?

Queremos o penta, a Copa do Brasil, o CT, o novo estádio. Queremos uma grande vitória, queremos nossos sonhos numa boa. Temos elenco para isso. E torceremos como sempre, mesmo que nosso Coliseu não seja mais a sombra do Maracanã de outrora. Sushis e sashimis são bem vindos. Gente do povo é essencial.

Cláudio Adão era um monstro, monstro demais. No campo, simulava uma Laís nas arquibancadas.

Copa do Brasil é coisa séria. Não se pode errar. Respeitar o Papão mas mostrar que a casa é nossa.

Olhar o cinzeirão? Os estíuartes não deixam. Isso aqui é primeiro mundo. O jeito é navegar a infância.

Gourmetização. Meu Deus.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: exulla

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