Esta semana fui surpreendido com a notícia de que o Fluminense foi declarado revel numa ação trabalhista movida por seu ex-treinador Levir Culpi, que cobra do clube o montante de dois milhões e oitocentos mil reais. A revelia decorreu da ausência do advogado do Fluminense e, por conseguinte, da contestação ao pedido formulado pelo autor da demanda em audiência.
Trata-se de uma irresponsabilidade grave. A perda de prazos, ausência a audiências, revelias provocadas por desídias profissionais são erros considerados imperdoáveis, primários, no exercício da advocacia. Quando esse erro enseja a la perte d’une chance – perda de uma chance – então, torna-se ainda mais pernicioso.
Não se pode afirmar que a presença do advogado do Fluminense e a devida contestação ao pedido do autor seria suficiente a invalidar a sua pretensão, ou seja, Levir, mesmo em face da defesa constituída nos autos pelo Fluminense, poderia sair vencedor do pleito. O Tricolor seria responsável, assim, pelo pagamento de mais um acervo trabalhista deixado pelo antigo presidente do clube.
Ocorre que, a desídia do Fluminense – se é do seu corpo jurídico também é sua – torna as coisas bem mais fáceis para Levir Culpi, cuja pretensão, sem a oposição Tricolor, certamente será julgada procedente ainda que ele tenha pedido mais do que lhe é devido, arestas que poderiam ter sido aparadas, diminuindo-se, por conseguinte, o valor requerido na defesa formulada na contestação. Eis aí um dos efeitos da revelia a que foi submetido o Fluminense pela ausência de seu advogado, o pedido do autor, se não for teratológico, provavelmente será atendido em sua totalidade.
A falha do corpo jurídico do Fluminense ensejou, assim, a perda de uma chance, que se pode definir mais ou menos como uma omissão negligente, ou seja, desídia no exercício da atividade laboral em que há falha na utilização dos meios – não no resultado desfavorável – como, por exemplo, na perda de prazo para recorrer, na ausência de defesa que acarreta a revelia, em que o cliente “perde a chance” de contrapor o pedido do autor ou uma decisão judicial que lhe foi desfavorável.
O Fluminense emitiu uma nota, em face da repercussão do caso, aduzindo que estava tratando de um acordo extrajudicial com Levir. Ora, trata-se de uma desculpa que não cola. Poderia tratar do acordo antes mesmo do ajuizamento da ação, ou durante a mesma, sem que, irresponsavelmente, deixasse de contestar o pedido de seu ex-treinador. Uma coisa não impede a outra. Agora, com a demanda praticamente decidida a seu favor, Levir não terá nenhum interesse em eventual acordo, pois este só lhe traria, no máximo, aquilo que a própria ação pode lhe dar.
O clube perdeu, assim, a chance de impugnar a pretensão de Levir. Será condenado naquilo que ele pediu e, pior, numa época em que o dinheiro não é farto nas Laranjeiras. Ao contrário, conta-se qualquer migalha para custear as despesas para se conseguir chegar ao fim do ano.
E o que o Fluminense poderia fazer para reduzir esse estrago? Primeiro, exigir judicialmente a reparação pela “perda da chance” dos responsáveis jurídicos pela desídia. Assim, leciona o mestre Sergio Novais Dias: “(…) nos casos de perda de uma chance o advogado é responsável pelos danos sofridos pelo cliente desde que exista uma relação de causalidade adequada entre o ato ou a omissão do advogado e o dano, ou seja, que, em termos de probabilidade, num prognóstico feito a posteriori, os danos tenham decorrido, necessariamente, direta e imediatamente da falha cometida pelo advogado.”
Não repararia o prejuízo sofrido na sua totalidade, até porque a dívida existe e deveria ser quitada, mas amenizaria o rombo nos cofres reparando-se o pagamento de valores pedidos por Levir e que extrapolam o que, legalmente, lhe é devido e que não foi impugnado em virtude da revelia.
Em segundo lugar, rescindiria o contrato com os prestadores de serviço. Nenhum escritório que cometa um erro como este, primário em todos os sentidos, pode servir aos interesses do Fluminense. Hoje foi uma causa de dois milhões e oitocentos mil, mas amnahã pode ser muito maior. O corpo jurídico do Flu deve ser à altura da sua grandeza e das demandas em que se envolve. Nada menos que isso.
Abad parece que tem bons propósitos, mas um erro com esse – e o seu erro consistiu na má escolha de profissionais – pode marcar negativamente a sua administração e dar ainda mais munição à oposição. Deve agir, portanto, para evitar que esse grave fato não se repita, mas não através de uma nota-piada e sim através de medidas efetivas. E a primeira deveria ser a rescisão contratual dos prestadores de serviço responsáveis pela conduta desidiosa que prejudicou os interesses do Fluminense.
Panorama Tricolor
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Se não houver a rescisão contratual dos prestadores de serviço, que se aplique o disposto da alínea “c” do art.53 do Estatuto do Clube.