Gérson hoje completa 80 anos de idade. Um dos maiores jogadores de todos os tempos, um monstro. Pouco importa que tenha jogado no Fluminense em seu final de carreira, ou que tenha sido por duas temporadas somente – o tempo de idolatria não é medido em anos. Basta pensar que, na época mais importante da história do futebol mundial, quando a Seleção Brasileira ganhou três das quatro Copas que disputou entre 1958 e 1970, dois de seus principais jogadores foram Didi e Gérson, símbolos do melhor futebol do planeta – e ambos defenderam as cores do Fluminense.
É impossível contar a história de Gérson em uma coluna, então apenas falarei de dois momentos que vivi com o Canhotinha de Ouro.
O primeiro, em 2005, foi a primeira vez que entrevistei uma personalidade que torcia para o Fluminense. Eu estava com Raul e Rita Sussekind, mais Álvaro Dória, intermediados que fomos pelo Seu Celso para a entrevista com Gérson, realizada no Estádio de Caio Martins. Ao contrário do habitual bom humor em frente às câmeras e microfones, o Gérson daquele dia foi muito sério, como se estivesse jogando uma partida. Conversamos por três horas, falando sobre tudo e, num momento, foi emocionante demais quando ele contou que sua estreia profissional no rival da Gávea foi em 1960, depois de ter disputado as Olimpíadas de Roma. Ao entrar em campo, ele se sentiu bastante estranho em ver a sua torcida como rival, mas durante o jogo é que veio o drama: num choque com seu ídolo Castilho, Gerson teve uma séria pancada nas costelas, precisou sair de campo na maca e ficou um tempo sem jogar. Emocionado àquela altura, ele lembrou que, em todas as vezes que encontrou Castilho, em partidas e fora delas, o eterno goleiro tricolor lhe pedia desculpas pelo involuntário acontecimento – e foi impressionante ver com o tempo a quantidade de pessoas que, ao falar de Castilho, se emocionaram.
Quis o destino que eu tivesse a oportunidade de dividir a mesa com Gerson nos tempos em que ele trabalhava no SBT. Estive lá algumas vezes, a convite da querida produtora Natália Pereira. Eu achava incrível como ele, Garotinho e Gilson Ricardo mal se viam a um ou dois minutos antes de entrarem no ar e, a seguir, mostravam o entrosamento fantástico sobre todos os temas. Coisa de craques. Pois bem: no programa havia uma cena cômica em que Gérson literalmente chutava o balde em alguma crítica. Sentado ao lado dele, tive a oportunidade de vê-lo chutar o recipiente com efeito, fazendo uma curva por cima das câmeras e quicando ainda com efeito no fundo do estúdio. Lamentei não poder gravar a cena no smartphone e foi o mais próximo que eu pude estar de uma jogada feita por um tricampeão mundial, o que me permitiu entender o que jogaram aqueles caras – quando Gérson deu esse chute, já tinha mais de 75 anos de idade.
É um orgulho saber que um dos maiores jogadores de todos os tempos defendeu as cores do Fluminense, foi campeão e, como se não bastasse, torce pelo Flu como se fosse de uma T.O. Isso não é de hoje: décadas atrás, quando os jogos de futebol eram até escassos na TV, lá estava o velho Gerson acompanhando o Fluminense como nunca. No histórico Campeonato Carioca de 1995, ele fez parte da equipe da Band com Januário de Oliveira e Pierri Carvalho – era o Fluminense nos microfones até debaixo d’água.
Que Gerson chegue a cem anos. Ele, o Fluminense e o futebol merecem.
Foto: Silvio Almeida