Naquele tempo tudo era Maracanã pra mim. Eu dava um jeito de ir a todos os jogos e também em outros estádios, quando o dinheiro permitia. Meu pai, mesmo sacrificado, sempre me dava uma mesada. Se o dinheiro dava para dois jogos, eu ia de geral para conseguir ver cinco, ou cortava o lanche semanal na rua, ou não contratava um craque para o meu time de botão – é bom que se diga: como dirigente esportivo, nunca contratei botões reservas de outros clubes a peso de ouro, nem veteranos decadentes a troco de acordos. Ponto. Reforço era reforço mesmo.
Joguinho gostoso no meio de semana à noite. Fluminense contra a simpática Internacional de Limeira pelo Campeonato Brasileiro. Um barato foi que minha mãe veio comigo, ela queria saber o que eu tanto gostava no Maracanã. Pegamos o 435 em Copacabana e chegamos rapidinho à lateral da UERJ, que anos depois seria minha casa e abrigo por um longo tempo.
Já no Maracanã, reparei que as luzes da arquibancada não estavam acesas com plena força. Tava meio escurecido. Sentamos, perto da gente estavam os Fôrça Flu tirando camisas novinhas do plástico e conversando. Um dos garotos usava um par de óculos redondinho, iguais aos tradicionais de John Lennon – meses depois eu copiei aquele óculos.
Era jogo de pouca gente e, sinceramente, lembro pouco da partida. Passei boa parte do tempo conversando coisas com a minha mãe, explicando sobre o Maracanã e suas peculiaridades. Mas não perdi tanto: o jogo foi de muita marcação, modorra e pouco brilho. Quem incomodava o Fluminense era o ponta-direita Lela, perturbando a defesa, mas acabou que o jogo não saiu de um zero a zero.
O curioso é pensar o quanto essa partida tem a ver com uma verdadeira revolução no clube em busca de títulos: Lela, o arisco ponteiro da Internacional de Limeira, logo seria contratado pelo Fluminense e trocado no ano seguinte por Leomir, do Coritiba, na montagem do time tricampeão em 1983-1985. A Fôrça Flu, já com suas camisas novas, faria muitos protestos no Maracanã e em Laranjeiras – com direito até a caixão na geral -, pressionando devidamente os dirigentes na busca de reforços. Desse levante, surgiria no futuro nada menos do que o Casal 20: Assis e Washington.
Naquele 1982 o Fluminense terminaria o Brasileiro na quinta colocação, ao perder para o Grêmio por 2 a 1 nas quartas de final. Depois faria um péssimo Torneio dos Campeões, um Carioca difícil e um novo Brasileiro opaco no ano seguinte, mas o segundo semestre faria os garotos da Fôrca cantarem nas arquibancadas como nunca. Do jogo duro com a Inter de Limeira, de pouco público e lembranças, o Fluminense chegaria até a estreia no Estadual de 1983 em cerca de um ano e meio.
Anos depois, a Inter aprontaria uma pra cima do Flu em pleno estádio das Laranjeiras: 1 a 0 em 1989. E o habilidoso ponta-direita Gilcimar, irmão do saudoso Gilson Gênio e jogador do Flu em 1982, encerrou a carreira no time alvinegro (campeão paulista de 1986), fixando residência em Limeira.
Saudades imensas da minha mãe, do bolso com moedinhas, do cachorro quente do Maracanã, das luzes apagadas na cobertura de concreto e, claro, da minha juventude. Era o Maraca, era o Flu, era 1982.
Como é bom recordar o Maracanã antigo, e ainda com a mãe.