Sem deslumbramento.
De toda forma, eu vou entrar, esperar pelo Zezé que não vai aparecer, procurar o Seu Armando em vão, ganhar o carinho imaginário da Tia Helena que também não estará lá e, dolorosamente, lembrar que todas aquelas coisas maravilhosas que vivi como um garoto torcedor do Fluminense estão inapelavelmente mortas, exceto dentro de mim e dos livros que ainda pretendo escrever. Com quase quarenta anos ininterruptos de arquibancada (geral também, sempre), creio ter conhecimento e vivência de sobra para publicá-los. Mas nada alivia saber que tudo aquilo está irreversivelmente morto.
O Fluminense respira a eternidade do poema que é. Os homens, não.”
Foi assim que encerrei minha última crônica da semana passada. Não havia motivos para comemorar e nem há algum especial hoje.
Sim, o Fluminense venceu e isso sempre será bom.
Contudo, não me vejo em hora de tecer loas, principalmente depois de um momento em que o time vinha tão bem e subitamente desabou por motivos ainda não esclarecidos, que não podem ser varridos para baixo do tapete ao primeiro bom resultado. Para alguns, o gol sofrido não abate; no meu caso, a boa goleada não resolveu o mundo.
Não, não é hora de bancar o ranzinza chinfrim e menos ainda o bobo alegre deslumbrado. Uma nova sequência de bons jogos com garra e aí será possível estabelecer o que realmente se pode esperar do Fluminense nos próximos meses.
A primeira meia hora do jogo foi mais equilibrada, com o Sport tendo chutado uma bola na trave. Um time rápido, sem grande técnica mas muita disposição física. Aos poucos, o Flu apertou, mais com raça do que talento. Deu certo e fez 1 x 0 em bela jogada que ganhou a finalização de Cícero. Depois com o segundo gol, em boa cabeçada de Fred, o jogo ficou assentado de vez para o Tricolor. Ressalte-se que, ao contrário dos últimos jogos, o time correu na primeira etapa. Cícero e Conca foram pulmões incessantes. Klever, ironizado pelos reducionistas, esteve muito bem. Finalmente a promessa de um intervalo com calma, ou quase. E o Jean correu, hein?
A fatura foi liquidada no segundo tempo logo de cara pelo chutaço do Conca pela direita, que o goleiro Magrão amigo aceitou. Depois, os dois times tiveram oportunidades, mas o Fluminense não sofreu grandes ameaças. Perdeu Valencia e Edson, contundidos – um havia substituído o outro e levou uma entrada horrível de Diego Souza. Já no final, o cruzamento desviado de Bruno e a trapalhada da defesa permitiram outro belo gol de cabeça de Fred, de quem falarei mais tarde.
Nem nos piores momentos da terceira divisão, vi tanta maluquice nas arquibancadas quanto ontem. O som me lembrava os discos mais experimentais de Frank Zappa. De maluquice eu entendo: fui estagiário do Hospital Philippe Pinel em 1990, Era Collor. Cada um puxava uma coisa, gente que xingava aplaudindo, pequenas porradas, o Savioli tentando entender que planeta era aquele. Natural, depois de toda a zona recente: dois sujeitos chamando Cristóvão, Fred, Sobis de imbecis e geniais na mesma frase. Gente, o Fluminense é muito maior do que qualquer jogador. Gente, somos uma torcida só, com bandeirões e bandeirinhas. Conto com a lucidez coletiva. Não virando mulambada, estou satisfeito. O Savioli também riu ao ouvir que, nesse novo e asséptico Maracanã, a torcida é única no mundo: a direita senta na esquerda, a esquerda senta na direita e no meio. Bom ver o Kote e o Márcio, amigos de verdade.
Fred tem talento inesgotável, que funciona quando a boa vontade liga a seta. Dois gols, um bonito, passou a bola para outro. Fez o que dele se espera – e para o que é muitíssimo bem pago, contando inclusive com o apoio da torcida depois de ter servido como o Judas malhado da Flapress na Copa. Oxalá permaneça assim dentro das quatro linhas (sem cobrar pênaltis). Fora, seria fantástico que se aposentasse da carreira de cronista de sandices no Facebook: a patética ameaça de greve tirou 20 mil pessoas das arquibancadas e uns 300 mil reais dos cofres do clube, que se esfalfa para não deixar de pagar os superstars via A Investidora. Ele bem no campo, melhor que nós escrevamos por aqui. Cada macaco no seu galho.
Walter tem um talento enorme. Mas precisa de um psicólogo para ajudar no combate à compulsão por comida, senão jamais jogará mais do que dez minutos.
No fim, a dez pontos do Cruzeiro, ficou a impressão de que tudo podia ter sido diferente ainda neste 2014, caso as três partidas recentes não tivessem sido disputadas com pés de manteiga, bagunçando tudo. Agora é ver no que dá, torcendo muito pelo time.
Cícero e Conca foram monstruosos. Klever calou os idiotas da objetividade. Fred, calado e jogando com vontade, foi poético. Sul-Americana na quinta contra o Goiás, seis da tarde. Savioli vai continuar sem entender o planeta, eu também. Quem vier aqui dizer que eu defendo vagabundo, vou chamar de flamenguista para cima. Sobre o presidente Peter, a quem muito respeito e nem sempre concordo, falou para amenizar, é seu papel. A crise não foi fabricada, mas exposta a olhos nus em plena grama. Não viu quem não quis.
Que bom que o Fluminense ganhou, é por ele que eu torço. Que bom! Mas o meu tapete ninguém vai deixar sujo embaixo não. A caravana não para, Seu Limão e a Ana tem os pés quentes demais.
Esqueci do Cristóvão. Merece meu respeito. Graças ao time com vergonha na cara desta vez, os que rosnavam chamando-o de burro ficaram com cara de tacho. Mas quinta é outro jogo. O torcedor é assim. Ou não.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @pauloandel
Imagem: pra/ seu limão
Paulo,
Sou leitor de seus textos algum tempo, mas um ótimo para o nosso deleite.
Tem muitas perguntas sem respostas. Referente a semana do Terror.
Por que o Time jogou com os pés de manteiga ??
Por que o Cristovão escalou tão mal o time ??
Organizadas tem o direito de fazer o que fez ?? Mesmo todos os torcedores putos com o time.
O Fred é o Barbosa dos anos 50 ??
Por que o Fred não se defende em relação a seleção ??
O Felipão chutou o balde em uma entrevista, pós jogo.
Abraço
***…
Caro Zair, obrigado pelas palavras.
Vamos lá: 1) pés de manteiga: ninguém se pronunciou indignado no time a respeito da facilitação contra o América RN por conta de querelas financeiras. Péssimo sinal; 2) Não sei dizer se Cristóvão tem escalado o time que quer ou se tem alguma interferência; 3) Ninguém tem o direito de tacar pedra em ninguém, ninguém tem o direito de fazer o Fluminense refém – seja jogador, dirigente, quem for; 4) Barbosa, que em breve receberá uma homenagem minha em livro, foi massacrado pela mídia, faleceu pobre e esquecido; Fred, depois da Copa, foi abraçado pela torcida do Fluminense (e massacrado pelo resto justamente por ser do Flu) para depois fazer chantagem com ameaça de greve – e sua vida tricolor já lhe garantiu cerca de R$ 35.000.000,00. É um grande jogador, precisa aprender mais para ser um verdadeiro ídolo; 5) Esse silêncio em relação à Seleção só ele pode explicar – para todos nós, terrível.
Grande abraço.
Meu amigo Paulo!
Concordo com o seu texto, exceto no final…
Não concordo com a parte do Cristóvão, pra mim, ele foi tão responsável quanto a má vontade nas derrotas. Só tiro dele a responsabilidade na contra o América/RN.
Fora isso, suas escalações e substituições foram pífias desde então.
Ontem, feliz ou infelizmente, ele não teve condições de fazer errado, por conta das lesões do Valencia e do Edson. Com isso matou 2 substituições, o que tirou a possibilidade de possíveis “invenções”…
Bela crônica!!
Valeu Seu Limão dando sorte ao Fluzão!!!!
Paulo, como sempre uma análise do jogo e da situação atual do Fluminense feita de forma consistente e inteligente. Obrigado por registrar a minha presença no grupo, depois da conversão oficial. E agora vamos ao trabalho. Abraços…
Muito bom Paulo!
Sua sensatez ao escrever é sempre uma aula.
Um “salve” para o Seu Limão!
…e a caravana não para .
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