Resolvi tirar poucas horas de paz entre dívidas e dores. Trabalhei em home office, escrevi pacas, divulguei discos e livros, fiz uma live e, das oito da noite em diante, minha única preocupação era ver o jogo. Tinha outra também: receber o lanche.
Não sei exatamente o motivo, se pelo fato do Maracanã estar vazio, sei lá, mas deixei de lado todas as coisas e me senti novamente com quinze ou vinte anos de idade, quando meu único objetivo era ver o Flu de perto, preferencialmente com uma vitória.
A lanchonete vizinha, que sempre traz o sanduíche com velocidade máxima, desta vez se atrasou. Então perdi a marcação da falta e o golaço do Nenê, numa cobrança de falta tão bonita que, mesmo raspando numa cabeça da barreira, foi no ângulo esquerdo e deslizou na rede. Bonito demais. Vi no intervalo.
Alguma coisa aconteceu que me senti bem demais. A garra do time, o uniforme tricolor que está lindo demais, até o Maracanã parecia o de antigamente. Descemos para o intervalo ganhando de um a zero. Precisamos de outro gol para a classificação.
No começo do segundo tempo o Nenê deu outro bom chute. A bola bateu novamente num zagueiro e encobriu Sidão, o goleiro do Figueirense. Golão, dois a zero, classificação. Vamos ver se confirma. Talvez seja o canto do cisne de Nenê, perto dos 40 anos de idade, mas que aparenta 10 a menos.
Essa é uma partida simples, que nem sabemos se terá alguma relevância no futuro, mas acabo lembrando do inevitável: a final de 2007. Claro que tudo é diferente treze anos depois, mas o passado vitorioso ajuda a temperar a confiança no presente. Tudo passou rápido demais, a torcida ainda lotava a arquibancada, ainda se podia ir a estádios. Thiago Neves cruza, Adriano Magrão empata um jogo perdido. Adriano Magrão cruza e Roger finaliza feito um camisa 10. Naquela decisão, os gols do Flu tiveram distância mínima, descontando-se a semana de intervalo entre os jogos: empatamos no finalzinho do primeiro e marcamos o gol do título no comecinho do segundo.
O futebol também tem suas crueldades. Marquinho está no Figueirense. Ele fez o gol salvador de 2009 e foi um leão em 2010. Um proletário da bola. Com ele o Heverton Santos, que passou rapidamente pelo Flu. Ei, Arouca, ei: está no banco. Paulo Ricardo, que não jogou nada ano passado e se mandou. Lucas, passou rápido. Quem se lembra de que, há muito tempo, do Figueira para o Flu vieram Cícero e Soares? E que o Wellington Nem foi emprestado para eles antes de ser reconhecido?
Vinte e nove minutos do segundo tempo. Parece que está tudo encaminhado. Calegari é um garoto mas está lutando muito. Já que é dia de folga e volto a ter quinze anos de idade, paro por aqui. Tomara que dê tudo certo. Parece que o Ganso vai entrar em campo. Tem alguma coisa de 1983 nesse jogo que não sei explicar. E daí? Só importa o amor.
Antes de encerrar estas linhas, teve pênalti no Iago. O pessoal do Figueirense chiou demais à toa. Nenê colocou a bola embaixo do braço, foi para a marca fatal, esperou pacientemente o fim da catimba catarinense e deu um porradaço no canto esquerdo. Três a zero, três gols do veterano comandante, o único veterano imprescindível do Fluminense de hoje. Se for o canto do cisne, que seja o mais belo dos cantos. Saio mais cedo: agora estou na geral atrás do gol, dando pulinhos e rindo, sonhando com a faculdade e o futuro, namorando as três cores da minha vida e nem ligo quando a bola bate no travessão de Muriel. Por uma noite estou em paz.
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