Flu 2 x 1 Portuguesa (por Paulo-Roberto Andel)

THIERRY

NOSSO FUTURO AOS OLHOS

Quase UMA da manhã de hoje. Miles Davis, “Round about midnight”, 1955. Acabei de comer duas fatias de pizza e um suco de abacaxi no Big Big, Vieira não havia. Vi Carla na São Francisco Xavier e dei-lhe um beijo de vitória. Antes, uma rápida caldereta de chope com Caldeira. Ah, ainda pude estar ao lado do ônibus da delegação bem na Praça da Bandeira – o Volks da vitória. Ninguém viu. Onde está Marina?

E antes disso, antes, antes desde sempre, a vitória mais emblemática, sofrida, digna e completamente Fluminense neste 2013 que já começa: aquela de demolir pensamentos de abutres das redações à madrugada – já tinham a tragédia pronta, mas sucedeu o contrário.

ENTÃO o Fluminense parece aquele bon vivant, sempre cercado de belas mulheres em sua trilha de casamentos. Foi o caso do uniforme novo. O grená entrou para a história como um dos mais lindos de todos os tempos – veio o laranja e sua beleza infinita à vista. Um poema. Para viver um novo amor, libertar-se do antigo amor – ou mantê-lo como um fantasma de Hart Crane, bem-vindo.

Em campo, um primeiro tempo de futebol aparvalhado, insosso, entrecortado por alguns bons momentos. Coisa coletiva mesmo, ninguém no papel de Judas. Íamos à grande área, ninguém finalizava, éramos solidão. A Lusa, num balão em nossa direção de perigo, fez um gol daqueles que depois nos perguntamos como foi possível, de tão bobo. Foi um soco no queixo. Fizemos silêncio de morte, o time abaixou a cabeça, alguém pensou no pior mas apenas por um instante. Quase Sobis fez um golaço de cabeça. Descemos mal. Rafinha saiu para a entrada de Biro-Biro. Apanhamos bastante e árbitro gostou do que fingiu não ver. E Luxemburgo, que foi expulso e ninguém viu? – todos nas lanchonetes, um cheiro de pipoca e cinema no ar – souvenirs, roupas e garotas, garotas!

O time voltou outro do vestiário, disposto a passar por cima de todas as suas limitações momentâneas. Edinho e Wagner, nulidades de outro dia, correram como nunca – curiosamente Rhayner, velocista, não estava em dia de grandes corridas.

Uma, duas, três, quatro tentativas, Anderson incrivelmente quase faz um golaço de bicicleta antes do pênalti marcado. Mais que quase, a cobrança furiosa do pênalti por Sobis no meio do gol. E o toma-lá-dá-cá, bate-volta, pingue-pongue em máquina de flipper que resultou na grande virada da partida – Wagner até surpreso com seu gol, peito nu e um alívio de três mil mares.

DEPOIS uma confusão enorme, a Portuguesa agredindo e o Fluminense defendendo a vida em campo. Quinze minutos e chutávamos para onde fosse permitido. Cavalieri voou heroico no chão e salvou um lance capital, como já tinha feito no primeiro tempo, cortando o cruzamento. Felipe trouxe arte a alguns belos passos, jazz. Samuel? Um balaço no ângulo!

Entre bicões e porradas, o Flu aguentou como pôde. Nesse ínterim, fiz uma grande amizade nas arquibancadas: meu amigo Thierry, tricolor de mil continentes com apenas um ano e sete meses de vida. Parecia à vontade no meio de gritos e barulheira. Eu tenho quarenta e cinco anos; quando Thierry tiver a minha idade, já estarei pós-morto – o que importa é o hoje, o agora, somos dois irmãos a campo, ele numa felicidade enorme. Thierry é o futuro da nossa arquibancada, nossa mocidade independente. Alguém dirá: este jogo contra a Portuguesa significou atravessar três desertos até um oásis de chocolate. Ou rever o olhar de cobra verde da mulher mais linda do mundo. Ave Thierry! João de Deus com sua força nos cânticos.

Descemos a rampa com gritos de alívio. O Fluminense nunca mais voltará para o inferno, ao contrário do que os outros acreditam. Foram três pontos que valeram bálsamo, gozo, luxúria: vencer ou vencer mesmo que o talento fosse esquálido. A fúria vestiu nossas camisas e, por isso, ganhamos de forma emblemática e magistral. Foi uma noite de luta contra todas as adversidades, as alheias e as nossas mesmo.

Hoje está bem menos difícil do que ontem.

Alguma coisa quer me dizer que este jogo de ontem foi uma declaração de paixão absoluta. Um olhar de cobra verde, um verso livre e torto. Agora os tricolores bocejam sonhos de calma num domingo brilhante.

Inferno e céu, sonho e crueza, fascínio e glória: palavras que parecem tão pequenas diante do nome do Fluminense e este orgulho que nos causou.

Lembraremos de um jogo onde os passes eram imprecisos, a bola queimava, o caos era o caminho, mas houve o pênalti e tudo mudou. Vejam novamente a fúria de Sobis na cobrança, o chute implacável, rasteiro, meio do gol. Quando as coisas não vão pelo jeito, use-se a força. E se Wagner estava no momento certo onde devia, é porque temos um norte a zelar. Lembraremos também da primeira vez deste nosso lindo uniforme laranja, oficial em campo, mais nossas mulheres de arrepiar nas arquibancadas – nestas, não se pisca uma única vez sem que se veja uma bela mulher apaixonada pelo Fluminense – estátuas de carne a desfilar por entre os estreitos caminhos das cadeiras azuis – todo mundo respeita – eu tenho um amor.

E foi assim que vencemos uma das maiores partidas de todos os tempos: sem o talento devido, sem a precisão desejada, mas com uma vontade louca, enorme, catalânica, capaz de varrer um império do mau agouro. Fomos um berro de Jim Morrison. Nosso louco amor brilhou num sábado à noite e ainda pulsa nos pensamentos.

Hoje é domingo. Uma grande semana a caminho. O Fluminense mais perto do topo do que se imagina ou entende. Nós somos assim.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: PRA

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Andel, Couceiro, Botelho, Janot, Garcez e Santa Ana – a revolução da literatura tricolor.

5 Comments

  1. Se o time tivesse a precisão de sua escrita, estaríamos na ponta da tabela. Sds Tricolores

  2. No momento estou viajando a trabalho mas nao perco um so jogo do fluzão!Ontem fiquei arrepiado com a torcida que cantava como se o maraca estivesse totalmente lotado, a portuguesa sentiu claro que sentiu como é!!O time corresponde com garra e coração Sobis e cada vez mais tricolor e vamos que vamos!!

  3. Frente ao impossível, tentaremos!
    Esse é o meu Fluzão!
    A energia do maraca ontem, foi avassalador!
    ST

  4. Dormir longe e fora da zona é bom. O time está melhorando e vamos subir. A TORCIDA deu show e eu morri de inveja assistindo a 1.200km de distância. Vamos FLUZÃO!

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