O ano era 2010. Após a terra arrasada de 2008 e o milagre de 2009, vivíamos o sonho do tão desejado tetra…
– Mãe, nós vamos ao jogo do Fluminense, não vamos?, pergunta Filipe com a súplica de um menino de nove anos que ama futebol desde os três.
Aqui, cabe uma pequena observação: a primeira paixão do garoto foi pelo futsal representado no brilhantismo de Falcão. Aos três anos, o presente de Dia das Crianças pedido fora um uniforme completo preto da Malwee com o número 12 estampado nas costas. Por ele, voltei ao Maracanã, após a morte de meu pai.
– Se conseguirmos comprar os ingressos, vamos sim, Lipe…
Adquirir entradas em 2010 ainda implicava em irmos a uma bilheteria ou ponto de vendas e enfrentar filas imensas, desorganizadas e sem a garantia de sairmos com as desejadas entradas. Mas havia prometido ao pequeno que tentaria dentro das minhas possibilidades.
Filipe não me deixou esquecer por um só dia que “mãe, você precisa comprar os ingressos, já viu quando começam as vendas, já viu onde serão vendidos, mãe, mãe, mãe…” Mas o que ele me pediu viria a se revelar uma missão quase impossível, praticamente o décimo terceiro trabalho de Hércules!
O jogo? Ah! Fluminense e Guarani, dia 05 de dezembro de 2010, aquele que viria a nos sagrar campeões após 26 anos de jejum.
Fiquei atenta ao dia em que os ingressos começariam a ser vendidos, pesquisei o melhor ponto de vendas para mim e decidi por tentar a sorte nas bilheterias em frente à casa da minha mãe.
As vendas começariam em um dia de semana. No dia anterior, fui visitá-la com as crianças. Todos no carro tagarelando, animados e ansiosos com a possibilidade de estarmos presentes no estádio e vermos o Fluminense campeão brasileiro de 2010.
Nessa altura, já berrávamos no carro “soooooooooooou, sou tricolor de coraçãããããão…”, quando me calei. Nada havia me preparado para o que vi quando chegamos à rua de minha mãe, por volta das oito da noite. Uma fila imensa com pessoas sentadas em cadeiras de praia, lanchando, bebendo, conversando, já havia se formado e estava dando voltas sobre si mesma. Olhei para Filipe e senti meu coração murchar, já prevendo a decepção do menino por não conseguirmos as entradas.
– Lipe, olha o tamanho da fila um dia antes de começarem as vendas, não temos a menor chance de conseguir…Tentei preparar o pequeno.
Aqui cabe outra observação. Filipe tem os olhos imensos, expressivos, cativantes e… suplicantes, olhos que se encheram d’água ao me ouvir…
– Mas mãe, a gente vai tentar, não vai? Não podemos desistir, por favor…
Silêncio…
Estacionei o carro, entramos todos na casa da minha mãe. Não sabia o que fazer diante daquela fila já formada no dia anterior ao início das vendas. Não queria desapontar meu pequeno torcedor, ao mesmo tempo em que eu própria queria muito estar presente nesse momento ímpar. Nos imaginei no estádio, lembrei do meu pai em 1984 e disse: – Gente, vamos para a fila! Gritaria, euforia e esperança puderam ser vistos naquele instante.
Pegamos duas cadeiras de praia, um travesseiro, uma canga de praia, água, biscoitos e fomos todos para a fila, não sem a reprovação explícita da avó zelosa dizendo que era loucura passar a noite na rua com as crianças.
Se conseguimos os tão sonhados ingressos? Claro que sim! Após uma noite na calçada da rua, vinte e duas horas de espera, incertezas, informações desencontradas e olhos ardendo com o spray de pimenta covardemente jogado em todos nós que estávamos na desorganizada fila.
Dia 5 de dezembro de 2010 estávamos todos lá, prontos para gritar É CAMPEÃO!
E Filipe? Tornou-se o mais fiel torcedor que conheço até hoje…
E você? Como vivenciou 2010?
Saudações Tricolores
(Cabe uma terceira observação. Não há nenhuma tentativa de romantizar ou enaltecer a missão que foi comprar os ingressos. Houve falta de organização e de respeito ao torcedor que se viu submetido ao descaso do Clube em nome de uma paixão.)
Panorama Tricolor
@PanoramaTri