Antes de qualquer coisa: o futebol não deveria ter voltado, é uma aberração e ponto. Já que aconteceu, cabia torcer pelo Fluminense pelo que realmente ele é: um irmão, um parente, um amigo de toda a vida. E torcer mais ainda por conta das barbaridades jurídicas que cercaram o Fla-Flu ano 108.
A verdade é que em futebol vale o pós, não o pré. Antes de um jogo, um time é tudo e o outro, nada. Depois, muda tudo e tudo de novo. Então, quando soube que o Flu viria renovado para a partida, comecei a achar que dava.
Jogo duro, brigado, de pouca beleza mas muito suor. Saímos na frente com justiça, ainda que numa jogada de pouco planejamento. E poderíamos ter feito pelo menos mais um. Não deu, eles empataram perto do fim e os narizes afobados já sentiram o cheirão. O castigo não poderia ter sido pior: o velho placar emblemático de 3 a 2 nos pênaltis, com Muriel pegando dois. Aí, o campeonato que terminaria nesta quarta ganhou uma sobrevida de uma semana. Eu já tinha me sentido bem quando um vizinho do trabalho veio com galhofa, cravando o Flamengo e tratando o Fluminense como piada. Quem conhece os sestros e as dolências do futebol não age assim.
Sobre a vitória, ela foi gigantesca. Ali estavam os campeões da Libertadores, os donos do pedaço com seus dirigentes peitos de pombo, cheios de sorrisos professorais e certezas de isopor. Sem brilho mas com muita atitude, o Fluminense na encarou o Flamengo face a face. Ninguém é louco de achar que tudo está às mil maravilhas, mas pelo menos por uma noite dessa cidade triste a gente teve algum momento para comemorar. O Fluminense resgatou o Rio de Janeiro: ficou ao lado do povo, lutou contra muitos poderes, voltou sem ritmo algum para o Carioca e, mesmo com três partidas ruins e as aberrações que cercaram a possível transmissão das partidas, acertou sua pedrinha de Davi na testa do gigante Golias da Gávea. Outra vez 3 a 2, oh, crueldade!
Nesta quinta-feira ou sexta a gente volta ao normal. O Flu continua com problemas, precisa solucionar seus impasses e não é o favorito para a conquista do Estadual. Só que, ao honrar suas tradições e camisa, fazendo o papel da mosca na sopa do genial Raul Seixas, o time das três cores imortais chamou o colega rubro-negro para o canto, lhe avisando “Tira onda com os outros, mas aqui não, ok? Não fode!”. É briga de times grandes, só os boçais acreditam que são senhores do mundo.
É claro que todo tricolor quer o título de vez, mas só em derrotar o pré-campeao mundial, o Fluminense conquistou nesta quarta-feira um de seus troféus mais difíceis e valiosos. Não foi apenas um jogo de futebol, mas uma disputa de mão cheia entre a ética e a barbaridade, entre um Rio de empatia e outro de empáfia, entre a carteira devolvida e a mão grande, entre a cidadania e a escrotidão, entre a lucidez e a Terra plana. Venceu quem soube ter dignidade. Para nossa alegria, é o Tricolor com suas três cores em riste.
O silêncio do Maracanã encheu a tela do YouTube, mas dava pra pensar num show de nuvens de talco e bandeiras impecáveis. Era tudo Fluminense, mas só soubemos depois. O Fluminense que eu vivi e que vale a pena sempre recordar. Estamos na final, será muito difícil repetir as performances de guerra mas uma coisa é certa: este Fla-Flu manteve seu cartaz pela atitude e desempenho. Indícios fortes de que estamos chegando. Vai que dá?
Panorama Tricolor
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