Contando, parece realismo fantástico, mas realmente aconteceu.
Na última rodada do Brasileiro de 2013, um time joga sua partida descompromissada a tal ponto dela ter sido antecipada para o sábado, mas escala um jogador irregular. A punição seria óbvia e evidente. Na véspera, jornais e TVs afirmavam que o dito jogador estava de fora da partida, mas acabou sendo escalado pela intervenção de um dirigente fanfarrão.
A perda de pontos, líquida e certa levaria o time ao risco inesperado e súbito de rebaixamento, mas incrivelmente nenhum dos jornalistas que cobriam a partida e que a resenharam em jornais e TVs lembrou-se do fato. É possível dizer que foi o maior erro crasso coletivo de informação jornalística do futebol brasileiro em todos os tempos, envolvendo pelo menos cem profissionais de imprensa.
Não houvesse o incrível erro, as manchetes do domingo, dias finais, apontariam uma completa mudança nas probabilidades de rebaixamento daquele dia. Mas nenhuma delas tocou no assunto.
Começam as partidas finais e todos os times disputam partidas ao mesmo tempo. Um deles, desesperado com o risco de queda, consegue virar seu jogo fora de casa – o que comprometeria completamente o time com um jogador irregular na véspera, caso o assunto viesse à tona. Imediatamente, a dois mil quilômetros de distância, um outro time que parecia seguro na competição cometeu um erro incrível: também colocou um jogador irregular em campo. Céus!
Um terceiro time envolvido na luta contra o rebaixamento teve um verdadeiro sururu de porrada no estádio onde jogava, por falta de policiamento. A partida foi paralisada por mais de uma hora. Em condições normais, ela jamais teria sido retomada, mas incrivelmente acabou acontecendo. Afinal, se acontecesse o adiamento, somado à descoberta daquela confusão do jogador irregular no sábado, esta partida retomada poderia modificar todo o campeonato e os times rebaixados.
É impressionante o encadeamento de coincidências.
Como ninguém sabia da história num todo – ou fez questão de esquecer -, para as finalidades oficiais, Fluminense e Vasco foram rebaixados.
Dois dias depois, o escândalo veio à tona.
Colérica, boa parte da imprensa esportiva tomou o Fluminense como Geni e tacou-lhe pedra: o clube foi ofendido por dois meses diariamente em todos os veículos de comunicação (com total inércia de toda a sua diretoria), torcedores foram ameaçados e agredidos nas ruas e só no dia do julgamento é que o Flu se fez presente – ainda que tenha prevalecido certa autopromoção pessoal, desvelada a seguir.
Defensores da ética no futebol estupraram o Fluminense em jornais e redações incessantemente, furiosos.
Nunca se deu um pio sobre o primeiro time, aquele do sábado, com um cheirinho de trapaça trash em campo.
O treinador que escalou o segundo jogador irregular no domingo nunca foi perguntado direito sobre o assunto.
O jogador, também não. Os jogadores: nem o do domingo, nem o do sábado.
Os dirigentes, também não.
Aos poucos o assunto tomou ares de deixa pra lá. Sumiu. Ainda bem que os escritores não se esqueceram.
Hoje completam-se cinco anos desta incrível história. Você não vai ver uma linha ou fala na grande imprensa esportiva sobre o assunto.
Quem se lembra de André Santos naquela ocasião? De Hewerton? De Guto Ferreira? De Manuel da Lupa?
O Fluminense continua sendo o grande culpado, o vilão supremo da corrupção no futebol brasileiro, pouco importando as evidências contundentes do caso. Contudo, o que resta é o pequeno cheiro de um silêncio hipócrita, sepulcral. Um cheirinho, pois.
Muita gente percebeu ou sabe o que aconteceu, mas a versão deturpada é repetida permanentemente em rádio, jornal e televisão quando o assunto é rebaixamento ou “virada de mesa”. A tal verdade conveniente. Foi assim também no caso do ladrilheiro, do chororô, do Serra Dourada e tantos outros.
Não chega a constituir surpresa num país onde as pessoas comemoram euforicamente a eleição de corruptos visando combater a corrupção, para depois emudecerem frente a óbvias decepções, hipócrita ou ingenuamente falando.
Panorama Tricolor
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