Mal havia acabado de escrever e publicar sobre a confusão do Fla x Flu – e sua vulgarização inaceitável -, fiquei sabendo da (nova) punição à Bravo 52, por ter utilizado sinalizadores – ou algo parecido – numa festa fora do estádio, por ocasião do jogo contra o Corinthians, por ter invadido a grande área de raio de segurança que a praça esportiva deve ter (quem foi o desgraçado que calculou ou convencionou esse dito raio?).
Independentemente das questões relativas ao Gepe, e que são importantes sem dúvida, há um princípio que anda por demais escasso no mundo do football carioca e brasileiro: o da razoabilidade.
Criaram um tal número de regras para os torcedores, dentro e fora dos estádios, que chega a parecer quase uma sabotagem à presença daqueles nas arquibancadas, simplesmente porque querem ver seu time de coração e festejá-lo – ou ainda, como se os torcedores fossem os “sabotadores do espetáculo”. Muitas vezes, as restrições parecem ter sido arquitetadas por quem nunca frequentou uma arquibancada na vida. Aliás, no caso do Brasil isso parece uma maldita sina: 99% das pessoas que decidem coisas no mundo do futebol não têm a menor ideia sobre o que é futebol… em todos os seus cenários.
Quem já foi ao monstrengo que colocaram no lugar do Maracanã sabe o que quero dizer: um mar de gente dizendo “boa tarde”, “boa noite”, “sabe o que veio fazer aqui? “, “faça parte do espetáculo”, “não fale palavrões”, “não mostre o cofrinho ao sentar, mesmo que involuntariamente”, “nenhum pum, ok?”, “ao levantar de sua poltrona resinada, desembarque pelo lado direito”, “evite o engarrafamento de pedestres”.
O jogo de bolapé brasileiro fez escola para o mundo inteiro, não somente no gramado mas na celebração dos jogos. Para muitos, a maior festa de uma torcida já feita no Brasil foi a do Fluminense, ao disputar a final da Copa Libertadores de 2008. Toda a magia e beleza do espetáculo das arquibancadas naquela noite foi a consagração de um longo processo, que veio desde o ano de 1970, quando o Flu teve delineadas as suas principais torcidas organizadas. De lá para cá, não há um único torcedor tricolor de uma única geração que não saiba falar de uma festa nossa, tendo estado presente ou não.
A cada dia que passa, contato que meu amor pelo Fluminense segue irretocável, mas o mesmo não se aplica aos seus arredores. É preciso que os homens de decisão no football entendam de uma vez que o conceito de espetáculo não se limita ao campo – e, mesmo muito feliz com nossa campanha atual, não sou louco de dizer que temos dado espetáculos. O que faz o torcedor se apegar ao seu time, a ponto de seguir com ele pelos estádios afora, é a soma do time em campo com luzes, cores, bandeiras, festas, vibração, positividade. Qualquer um que já levou uma criança a um jogo de futebol sabe como ela reage e vibra com as celebrações.
Se hoje estou aqui com seiscentas e tantas colunas, mais uma penca de livros, é porque até hoje carrego comigo o garotinho que ficou enlouquecido com a espessa e indestrutível nuvem branca de pó de arroz, misturada a lindas bandeiras, cantos e… depois de um certo tempo, sinalizadores… nem tudo é perfeito. Eu vi a nuvem há quarenta anos atrás e ainda a persigo semanalmente.
Quando as torcidas, ou grupos de torcedores ou movimentos, são punidas sem razão constitucional convincente, o verdadeiro punido acaba sendo o próprio futebol. Qual a razão da existência de um clube do esporte bretão que não seja a sua torcida? Qual é o sentido de se punir quem não praticou nenhuma transgressão à lei?
Conclusão: querem fazer do torcedor um bonecão do posto com braços imóveis. Futebol não é Nouvelle Vague no confortável Espaço Itaú de Cinema (e isso não é jabá! – 1), nem apresentação de performance de vanguarda no refrigerado Oi Futuro (2). É claro que é preciso segurança e regras, mas a falta de razoabilidade no trato com os torcedores e suas celebrações é um tiro no pé do futebol. Depois não entendem porque estádios com capacidade para dez mil torcedores não lotam, ou porque as ruas estão cheias de garotinhos com camisas do Chelsea e do Bayern…
Na verdade, entendem. Cada assento vazio na arquibancada é um potencial espectador de TV, notebook ou smartphone. A todo o conjunto exposto aqui, chamam football moderno. Um chataralho.
Acontece que dinheiro não é tudo.
Panorama Tricolor
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