Certa música nos diria que “talvez amanhã esse temporal faça algum sentido”. A ensolarada manhã de hoje, nas Laranjeiras, vai nessa perspectiva.
O retorno de Fred ao seu cotidiano no Fluminense tende a ter um significado muito superior à simples volta de um atleta à sua função. Imerso em um temporal e dilúvio de críticas e insinuações, majoritariamente injustas e tradutoras de pouca compreensão, Fred descansou por dez dias na tentativa de recolocar seus abalados pensamentos em ordem.
Uma Copa em casa. Uma eliminação arrasadora. Mais do que isso: ser tido por muitos como o maior – ou único! – culpado de uma tragédia coletiva não restrita às quatro linhas, mas transcendente a elas por serem, afinal, sete gols não uma a goleada sobre um time e sim a mostra clara da obsolescência, adquirida a pequenas parcelas, de um modelo de “gestão” do futebol.
Reticências poderiam ilustrar a multiplicidade de fatores estressores aos quais o capitão tricolor foi submetido. Três “pontinhos” em sequência, entretanto, não seriam suficientes.
Circunstâncias tais quais ferem o orgulho e autoestima de qualquer atleta. Fred, hoje, já sorri, mas aquele que para mim é um ídolo encontra-se ainda verdadeiramente machucado.
O temporal, ainda que torrencial e arrasador, esvaece no parêntese do tempo. E os ares fundamentais a tanto foram o clube e, sobretudo, a torcida que hoje sopraram. Nosso estádio já sediou momentos de relevância histórica estupendas, porém de caráter afetivo tão impressionante quanto hoje, penso que foram poucos.
Sobre o Fluminense e tudo que o envolve, por sua grandeza, já enunciei outrora ser difícil tirar qualquer conclusão que seja ou ter plenas certezas: uma das poucas, porém, e que com felicidade reafirmo hoje, é que o maior patrimônio deste clube somos nós, os torcedores.
A iniciativa de nosso departamento de marketing foi esplêndida. Ainda que dotada de todo necessário caráter operacional e logístico, a compaixão e amor pelo atleta estão ali. Porém, o incremento de emoção mais pleno e puro vem daqueles que “anonimamente” ocupam cada um dos níveis das arquibancadas de nossa sede. No grito, sorriso e lágrima de cada uma daquelas de mais de cem crianças não há maldade ou qualquer intenção além à própria do acolhimento. No grito mais comedido dos mais calejados pela vida, o mesmo se revela a cada palavra de apoio.
As Laranjeiras e as ruas do Rio, não é fato novo, traduzem relevância histórica. Hoje, não o fizeram por menos: somaram, na realidade. Uma torcida não faz história apenas ao lotar um estádio; o faz também ao marcar a vida e carreira de seus ídolos. É uma via de mão dupla. E, hoje, fez-se à história de Fred de uma quinta comum um dia especial. É relevância histórica sim. E é, sobretudo, relevância afetiva e emocional como poucas vezes já vista.
Há um ser humano por trás da feição e dos pés de cada um neste mundo do futebol. O torcedor é assim. O jogador não é alheio à natureza humana. É poço de inseguranças, medos e alternâncias tal qual quem aqui escreve ou lê. É do íntimo ser. É intrínseco à espécie.
Dirão ser a retribuição por ele prometida, os gols, não mais do que sua obrigação. É, para muitos, apenas um atleta caro e de rendimento a se questionar.
Fred é sim digno de se cobrar.
A sinfonia do dia, porém, não é esta. A música que sai da corda hoje dedilhada pela torcida tricolor é acolhedora. E dela, por hoje, não convém aos meros escribas desafinar.
Fred, se não pediu, necessitava do abraço. A torcida, a ele, estendeu a mão e ofereceu o que mais precisava. Hoje, poderia, mas com fidalguia, não pediu mais nada em troca. Eis um dia especial.
Um dia da plena ciência que a emoção é aquilo que permeia as arquibancadas e a idolatria. A razão? Esta nós deixamos para demais campos da vida.
Esvaem-se as nuvens da tempestade. Sobre Fred, fica a nuvem de pó-de-arroz. Pacífica, vigorosa e esperançosa, como de costume, fazendo jus ao hino.
Somos fortes. Com Fred motivado, feliz e acolhido, saiba, meu caro leitor: somos infinitamente mais.
Esta queinta-feira pode ter sido mais decisivo do que parece ser à qualquer análise fria. E de emoções, nós, tricolores, entendemos muito bem.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @ericmcosta
Imagem: Fluminense FC/ acervo Fred
hehehe, e se ele voltar arrebentando, preparem-se, vão falar que o Fred na seleção estava se poupando para o Flu…
Natural que falem assim. E, de novo, o “culpado” será o Fluminense hahaha.
Obrigado pelo comentário.
Grande abraço!
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Meu caro Eric, gostaria de cumprimentá-lo pela crônica belíssima. Embora não seja tricolor, é impossível não se sensibilizar pela forma como constrói o texto, no qual existem muitas verdades. Um orgulho para quem o conhece, vê-lo escrevendo com tanta desenvoltura comum aos grandes colunistas deste país. Parabéns!
…1986 (Telê por ser pé-frio, Zico por estar frio ao bater o pênalti, Sócrates por não ter tomado distância ao bater o pênalti), 1990 (Dunga por ser brucutu e Lazzaroni por ser muito teórico), 1994 (Parreira pelo futebol feio, mesmo com o título), 1998 (Zagallo por ter escalado Ronaldo), 2006 (não lembro, mas houve), 2010 (Dunga por ser Dunga, Felipe Melo pelo destempero e Julio Cesar pela falha), 2014 (Felipão por não ter um plano B e Fred por ser do Fluminense).
Eric Costa,
Parabéns Pelo Belo Texto.
Mauro,
Em 2006 Culparam Roberto Carlos Por Estar Abaixado Na Entrada Dá Área Ajeitando O Meião No Momento Do Cruzamento Para O Gol De Henry.
Sds.
Excelente. Em toda tragédia, sente-se a necessidade de escolher um culpado. Resumindo em Copas, 1974 (Zagallo pelo desconhecimento da evolução da Holanda & Cia e PC Lima por estar pensando na França), 1978 (Peru por entregar o jogo), 1982 (Waldyr Perez pelo frango e Serginho por estar abaixo do nível dos demais)…