Tricolores de sangue grená, nesta sexta-feira, dia em que escrevi estas linhas, completaram-se 13 anos que o Fluminense passou pela maior tragédia esportiva de sua história (excluindo os rebaixamentos). Esse, certamente, é um dia que todos nós preferiríamos esquecer, mas que com certeza não seria necessária a minha coluna para lembrá-los. E não é pra falar da campanha em si, nem lembrar com detalhes do fatídico dia, mas para falar de sonhos e sentimentos, que decidi dedicar este texto. Quem já leu meus textos já deve ter percebido algo curioso: não sou ligado a efemérides. Raramente me lembro de datas comemorativas – até mesmo de títulos do Fluminense – mas o 2 de julho é uma baita exceção. Talvez porque tenha vivido intensamente a primeira Libertadores que me lembro de ter visto o Fluminense jogar, talvez por ter ido a vários dos jogos, incluindo a finalíssima… ou talvez porque tenha sido uma das últimas vezes que vi a torcida tão unida, tão em uníssono, tão focada naquela conquista. O Maracanã nunca esteve tão belo quanto nas nossas partidas, tampouco viu festa tão extraordinária quanto as das noites derradeiras.
Talvez a data simbolize tudo o que o Fluminense poderia ser hoje, e que acabou não sendo. Não no sentido desportivo, pois não precisa disso, mas no extracampo mesmo, nas arquibancadas. Alguns dias após a final, lembro de ter visto um vídeo no ainda incipiente Youtube que jamais esqueci. Se chamava “Fluminense – Homenagem aos heróis de 2 de Julho”, e até hoje você pode assisti-lo através deste link: https://www.youtube.com/watch?v=bKMbC_Xi3d8. Algo que chama a atenção nesse vídeo é a valorização da torcida, algo que hoje está sendo perdido, principalmente após este longo período sem público. O único lugar onde a vemos atuar é nas redes sociais e, recentemente, não tem feito um papel muito belo. Aliás, a torcida está dividida de uma maneira que jamais esteve. É difícil conceber uma final de Libertadores envolvendo o Fluminense em que haja uma união tão perfeita quanto a que vimos em 2008, e talvez o fato de não termos recuperado aquela magia e, pior ainda, cada vez mais nos afastarmos dela, é o que na verdade nos faz não conseguir esquecer de modo algum aquela noite.
Agora, em 2021, parece que estamos virando torcedores de um clube cuja relação não é mais intrínseca conosco, e sim artificial. Estamos sendo despromovidos a meros consumidores, e alguns passaram a assumir o manto de defensores da marca, não do escudo; do fornecedor de produtos, não do clube. Enfim, parte de nós não está mais tão interessada nos títulos, mas nas campanhas. E talvez isso tenha começado lá mesmo em 2008 como um mecanismo de defesa, uma forma de lidar com o luto da perda. Ninguém normalmente se lembra muito do segundo colocado, mas nós fizemos questão de lembrar. E, hoje, treze anos depois, eu começo a me questionar… a troco de quê, exatamente? Hoje achamos “excelente” uma temporada em que fomos vice-campeões cariocas, caímos na primeira fase da Copa Sul-Americana pro Unión La Calera, fomos eliminados antes das oitavas de final da Copa do Brasil pelo Atlético de Goiás e alcançamos o quinto lugar no Brasileirão. Zero título. E havia vários torcedores extremamente contentes por termos voltado à Libertadores, que o Flu deveria jogar todos os anos.
A única coisa que eu sei é que 2 de julho me dói muito até hoje, mas não pelos motivos que seriam de se imaginar, mas porque sinto que ali o Fluminense perdeu uma chance muito única de mudar completamente os rumos de sua história. Ao perder um título cobiçado há muito tempo em seu estádio diante da massa festiva de sua torcida, precisou exaltar o segundo lugar para lidar com a tragédia que havia ocorrido. Todos nós precisamos. Eu estive entre eles, e tenho minha parcela de culpa. Mas infelizmente isso foi retomado recentemente. Não capitalizamos em torno de 2010 e 2012, tomamos decisões erradas nas Libertadores em sequência que disputamos e perdemos a chance de vingar 2008 rapidamente e evitar que isso nos assombrasse até hoje. E aí, de 2013 para cá, um baita jejum. Sem público, as redes sociais viraram as arquibancadas, e os perfis se misturaram. A parte da torcida exigente (a maioria) passou a lidar com tricolores que quase não viram arquibancadas, ou que não entendem a grandeza do clube, dividindo o mesmo espaço e tendo a mesma voz. E deu no que deu.
Hoje, temos Roger Machado no comando técnico, um treinador arrogante, que não deixou saudade por onde passou e que comete os mesmos erros seguidamente sem pedir desculpas sequer uma vez. O “apoio incondicional” de parte da massa tricolor começa a cobrar seu preço: presidente que diz que para alguém opinar precisa ter dado dois treinos, vice de qualquer coisa que fala que a torcida não assina os cheques do clube e, pra arrematar, treinador que diz com todas as letras que a opinião da torcida e nada pra ele são a mesma coisa. E, a exemplo de 2008, a torcida precisa entender que o engajamento é a única saída para mudar essa situação. Não temos previsão de volta do público, logo as cobranças continuarão apenas de modo virtual, a não ser que grupos queiram se aglomerar para protestar nas Laranjeiras ou no CT, o que não considero plausível nesse momento, uma vez que a vacina não chegou a todos. Faça a sua parte, torcedor consciente. Não exija nada menos que um Fluminense que aspire à vitória e à grandeza. Somente assim talvez consigamos lembrar ao mundo que os principais heróis daquele dia 2 de julho fomos nós.
Curtas:
– Sentiram falta do comentário dos últimos jogos? O time jogou melhor com 10 que com 11 contra o Corinthians e empatou a partida. Quando esteve perto de conseguir a vitória, Roger retrancou o time e achou melhor levar um ponto. Na partida seguinte, saiu na frente, fez bons 20 minutos, o time se enrolou, tomou o empate, Roger fez uma substituição draconiana no segundo tempo, o time perdeu o meio e levou uma goleada. E ele ainda teve a pachorra de colocar os garotos com o jogo perdido. E foi isso.
– Com a derrota acachapante, o Fluminense agora está na parte de baixo da tabela, com 10 pontos, em 13º lugar. De positivo, o fato de que ainda estamos relativamente distantes da zona maldita (5 pontos), e uma vitória no próximo jogo pode nos catapultar ao G6 ou G8. De negativo, o baixo número de vitórias, a distância ainda maior pra liderança (8 pontos) e um clássico regional ensebado no estádio do Corinthians contra uma das melhores equipes do Brasil. Se quiser ter alguma esperança de reação, Roger precisa vencer o Fla x Flu de qualquer maneira, senão o caldo que já estava pingando pelas beiradas vai ser derramado de vez no chão.
– É difícil até prever como o Fluminense vai jogar (não os nomes, mas o jeito mesmo), uma vez que alterna entre o manjado, mas organizado, e o completamente novo, mas pardalesco. O mau momento técnico de alguns jogadores, somado a ausências importantes e à inabilidade de Roger de resolver problemas de longa data começam a fazer a diferença e preocupam muito para a Libertadores. O jogo com o Cerro será daqui a menos de duas semanas. Se o time não começar a dar liga de novo, o ano pode acabar em agosto.
– Palpites para os próximos jogos: Flamengo 1 x 1 Fluminense; Fluminense 2 x 0 Ceará; Sport 1 x 3 Fluminense.