Taça de Prata 1970 presente (por Paulo-Roberto Andel)

Eu tinha dois aninhos e não vi nada ao vivo, mas o maravilhoso Campeonato Brasileiro de 1970 conquistado pelo Fluminense marcou toda a minha geração. O motivo é simples: quando começamos a entender o que era o nosso time, país, tios, padrinhos, amigos dos pais, todos os jovens e adultos nos falavam de Denilson, o Rei Zulu, de Félix – primeiro jogador de futebol que conheci -, de Assis, Galhardo e Marco Antônio, de Samarone e Lula, de Flávio e Mickey, de Cláudio Garcia. Então, depois vi um pouco da Máquina e aí mergulhei de vez para sempre neste assunto que preenche as nossas vidas.

Penso demais em meu pai, que faz tanta falta. Lembro das falas de admiração dele. Quando ganhamos nosso primeiro Brasileiro ele era um garoto, tinha 29 anos, viu tudo in loco. E vibrava. Muito tempo depois, quando foi infeliz para sempre, é certo que seus dias de alívio passaram pelas melhores memórias do Fluminense. Lembro dele agora falando desse título e me dando a revista Placar especial que falava dessa conquista.

O título brasileiro de 1970 precisa ser celebrado porque coroou campeonato mais difícil de todos os tempos, em precisa observação feita pelo escritor Roberto Sander em seu livro sobre a conquista. Nunca mais a competição nacional teve tantos times fortes com tantos craques extraordinários. Para vencê-lo, o Fluminense precisou bater na fase final o Cruzeiro, o Palmeiras e o Atlético Mineiro. Procurem conhecer as escalações desses times e aí vão entender porque este título é imortal. E, num país onde a cada quinze anos as pessoas se esquecem do que aconteceu nos últimos quinze anos – outra máxima de São Ivan Lessa -, se as pessoas falam de um time que foi campeão há 50 anos, não há a menor dúvida sobre a importância do fato.

Entre meados dos anos 1960 e a primeira metade dos anos 1980, o Fluminense foi avassalador, salvo pequenos intervalos de mediocridade dos dirigentes. Ganhou nove Estaduais, dois Brasileiros, dominou o Maracanã, foi reconhecido e consagrado internacionalmente. Um time grande que entrava em crise se ficasse três anos sem uma conquista. Tudo começou com o título cintilante de 1969, mas a Taça de Prata deu ao Flu o selo de qualidade que poucos grandes clubes tinham – nosso rival da Gávea só foi tê-lo dez anos depois, por exemplo. E dela o Fluminense arrancou para uma década e meia de supremacia.

Muitos heróis de 1970 ainda estão vivos e saudáveis. Merecem o nosso apreço e reconhecimento. Ganharam um campeonato contra Pelé, Edu, Jairzinho, Paulo Cezar Caju, Afonsinho, Ademir da Guia, Tostão, Gerson, Rivellino, Dirceu Lopes, Dicá, Manfrini, Pedro Rocha e muitas outras feras do futebol brasileiro. Que equipes no mundo conseguiram façanha semelhante?

Agora procuro meu pai em algum infinito, entre as lágrimas que ele me traz todos os dias. Ele sonhando com Denilson e Samarone, com Assis e Galhardo, com Marco Antônio e Lula. Félix voando. Queria ser criança outra vez, sonhando com o dia em que eu iria ao Maracanã ver aqueles nomes que ele tanto repetia. O sonho de 1970 resiste na memória – o ano em que fomos os melhores entre os melhores do mundo. Sonhar é melhor do que viver nestes tempos tão difíceis.

As crianças tricolores de 1970 e arredores foram muito felizes. Tomara que o Fluminense mude logo para melhor, para que as crianças de agora também possam ver nas três cores algum sentido de felicidade, daqui a muito, muito tempo. Félix, Oliveira, Assis, Galhardo e Marco Antônio…