Torres pai, Torres filho (por Paulo-Roberto Andel)

ANDEL RED NEW

Na sexta passada, antes do jogo do Fluminense contra o Vitória, uma cena breve foi bastante emocionante para os torcedores que acompanharam o jogo pela TV. E merecia ter sido também transmitida pelos imponentes telões do Maracanã.

Naturalmente, o grande homenageado era Carlos Alberto Torres e nem poderia ser de outra forma. Mas se tem um momento que carregarei para sempre comigo desta partida, foi o acompanhar das palavras de seu filho, Alexandre Torres, que também foi um grande jogador do nosso clube por vários anos.

Sempre calmo, elegante e visivelmente emocionado por toda a situação, Alexandre Torres fez um agradecimento ao canal de TV, pela maneira carinhosa como acolheu profissionalmente seu pai por uma década. E depois foi só elogios ao Fluminense e sua torcida: falou da importância do clube na formação dele e de seu pai, da construção de carreiras vitoriosas e da emoção que sentia naquele momento ao se reencontrar com a nossa torcida, ainda que o momento fosse triste demais.

Alexandre Torres era o zagueiro clássico, alto, menos rápido e leve do que seu pai. Qualquer outra comparação que se faça é covardia: Carlos Alberto Torres foi um dos maiores laterais de todos os tempos. Alexandre Torres muitas vezes sofreu críticas veementes que vemos não somente no futebol, mas também nas artes, quando filhos talentosos são diminuídos frente a seus pais geniais e absolutamente fora da curva. Fernanda Torres sentiu na pele as comparações com Fernanda Montenegro. Maria Rita, por Elis Regina. Moreno Veloso, por Caetano. Às vezes, nem precisa ser filho, vide o sobrinho Ed Motta e seu tio Tim Maia. Lá fora, Ravi Coltrane pena por ser o herdeiro de John. Quem lembra de Jordi Cruyff?

O zagueiro filho do Capita jogou no Fluminense em uma época muito difícil. Estávamos fragilizados economicamente no final dos anos 1980 e começo dos 1990. O grande time tricampeão tinha sido todo rifado, sem grande retorno econômico para o Flu, assim como perdemos vários jogadores da base a troco de nada. Foi a época do bom, bonito e barato. E sofremos com nove anos sem títulos, mas é bom lembrar: esta seca só aconteceu porque fomos garfados em duas finais de campeonatos cariocas (1991 e 1993) e uma de Copa do Brasil (1992). Chegamos às semifinais dos campeonatos brasileiros de 1988 e 1991. Sofremos, mas estivemos nas disputas, o que é bem diferente de ser um mero figurante das competições.

Alexandre Torres teve vários parceiros de zaga, mas sua melhor dupla foi formada com Valber, um cracaço. A parceria não resultou em conquistas e nem foi prolongada, mas encheu os olhos dos torcedores que a acompanharam. Muitos anos depois, o Flu voltaria a ter um miolo de zaga qualificadíssimo e também efêmero, com o então desconhecido Thiago Silva ao lado do talentoso, meteórico e mutcho loko Thiago Gosling.

Torres Filho saiu do Fluminense há duas décadas e meia. A despedida conturbada à época não poluiu belas lembranças, grandes momentos e, principalmente, o significado de caráter que o ex-jogador, com o olhar marejado, fez questão de lembrar tanto tempo depois. Ele é de um tempo em que os jogadores tinham orgulho em defender a camisa tricolor, os torcedores tratavam seus semelhantes como irmãos de arquibancada, todos estavam juntos mesmo em momentos difíceis e sem títulos. Um tempo em que o Fluminense era Fluminense demais e, sinceramente, eu ainda sonho que um dia retornaremos o nosso senso crítico, a nossa civilidade tricolor. Um tempo em que o Fluminense era realmente todos nós – e que precisa ser resgatado.

Ao ver Alexandre Torres emocionado naquela sexta, eu pensei no tempo em que o vi no campo. Somos da mesma geração e eu também confesso que me emocionei. Tudo passou rápido demais e a vida é muito breve para ser desperdiçada com ódio e exclusão. Felizmente eu estava confortado na casa de Leo e todos estávamos felizes com Lucas ao nosso lado. Se a partida não ajudou aos nossos bons sentimentos, o pré jogo foi deveras emocionante.

Torres pai, Torres filho, obrigado por tudo.

Panorama Tricolor

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Imagem: rap