Renato Gaúcho
Renato sempre foi uma figura polêmica, curiosa até. Assim como minha coluna de hoje, e como tudo na vida, Renato tem dois lados (pelo menos). Mas o que o distingue como indivíduo é que ambos sejam igualmente resplandecentes. Para explicar, parto de minhas impressões e já me explico.
Sempre fui fã inconteste do futebol de Renato. Quem não o viu jogar pode achar papo de fanfarrão (que é) a comparação que ele mesmo propôs com Cristiano Ronaldo. Honestamente, acho injusto com Renato, que pegou o futebol numa época muito mais farta em termos de material humano e brilhou por onde passou (ou quase). Ponta-direita (sim, ele era ponta-direita) dos melhores da história do futebol (dos que eu vi, claro), Renato destacou-se ainda garoto e aposentou-se craque como sempre, embora tenha, vez por outra, sido obrigado, por razões diversas (de contusões a armações) a dar um tempo dos gramados.
O mesmo Renato que encantava nos campos, vez por outra aprontava, dentro e fora dele. Estourado, exibicionista, falastrão, comprou brigas necessárias e desnecessárias, envolveu-se em polêmicas gratuitas contra adversários abstratos e deixou passar oportunidades de ouro (a Copa de 86 é a mais clara delas). Torcedores de nosso rival petit, aqui do Rio, até hoje não engolem o papelão que Renato aprontou na final do Brasileiro de 1992, o que abriu o caminho para que a taça caísse no colo do time muito inferior, tecnicamente falando, do Flamengo.
No Flu, Renato foi uma síntese de sua carreira, tanto como jogador, quanto como técnico. Encheu-nos de orgulho no título estadual de 1995 do primeiro semestre, mas nos frustrou na semifinal do brasileiro do mesmo ano, apresentando-se sem condições de jogo numa partida decisiva e que parecia decidida. Em 1996, foi mal em campo, mas corajoso para pôr a cara na frente de um clube fadado ao rebaixamento. Seu nome ligou-se novamente à nossa história em 2007, ano em que conquistou o título mais importante de seu currículo como treinador e um dos mais importantes da história do clube, pois nos tirou de uma fila de 23 anos de conquistas nacionais, expressivas de verdade.
2008 poderia ter colocado Renato, de fato e de direito, na eternidade tricolor. Poderia mesmo fazer dele um dos técnicos mais importantes da história do clube. Renato tinha nas mãos um time extraordinário. Pense num esquadrão que reúne Thiago Silva, Cícero, Conca, Thiago Neves, bons laterais (Gabriel e Junior Cesar), dois matadores (Washington e Dodô). É um time que teria tudo para ser campeão da Libertadores. Não foi, entre outras razões, por causa de Renato, que não apenas bancou o patético Ygor na equipe, contra tudo e todos, mas também fez algumas das mais absurdas substituições da história do futebol na partida derradeira: precisando de mais um gol, trocou um atacante por um zagueiro e um volante por outro.
Sua atuação na final foi obscurecida pela declaração bastante infeliz, quase imbecil, de que iria brincar no Brasileiro. Depois dessa sequência de tropeços, todos ou quase todos no Flu – eu certamente –, nutriram certa aversão ao Renato, sofrendo calafrios assim que seu nome era ventilado na imprensa como possível novo técnico do time. Parecia sempre o nome errado, um nome que remetia ao passado, àquele dia terrível no Maracanã, para mim o mais triste de minha trajetória como torcedor.
Mas o tempo passa… o tempo faz o improvável tornar-se efetivo, o indesejável, necessário. Quem diria que teríamos uma campanha de rebaixamento num ano pós-título com um elenco em que trabalhavam 4 jogadores selecionados para a seleção brasileira durante o próprio ano, um dos quais o único titular da seleção que joga no Brasil? Quem imaginaria que um clube sofreria uma campanha difamatória tão ostensiva quanto a que o Fluminense sofreu? Quem diria que toda a imprensa esportiva, em plena era das redes sociais, tentaria impor uma mentira expressa como verdade?
Pois bem, começamos 2014 nas cordas. Para sair delas, precisamos da natureza abusada de Renato. Precisamos de sua autoestima, de seus acertos e de seus erros, até para mudar a pauta. Tenho certeza de que Renato sairá do Flu sob uma chuva de vaias, gritos de burro. Esse dia sempre chega, chegou para Telê e Parreira, por que não chegará novamente para Renato? Mas espero que, até lá, o lado positivo de sua personalidade brilhante nos ajude muito. Por ora, em respeito ao passado, peço à torcida que receba um daqueles poucos que tem o nome gravado numa placa nas Laranjeiras com um sonoro “bem-vindo de volta ao lar”.
Estatuto do torcedor
Não sou advogado, sei pouco das leis. Não tenho competência, portanto, para assegurar que o argumento empregado pela Portuguesa e, em menor escala, pelo Flamengo para se agarrarem à Série A é juridicamente defensável. Meu trabalho é outro e envolve, em grande medida, um instrumento de que se valem também os que trabalham no campo do direito. Refiro-me aqui à hermenêutica, palavrão que designa a teoria da interpretação, aplicada a textos e outras formas de expressão da linguagem.
Enfrento problemas de ordem hermenêutica todos os dias em meu trabalho: duas interpretações diversas sobre o mesmo texto. Por vezes, a pendenga pode começar a ser superada por um recurso simples: pergunte ao autor. Quando o autor é morto, isso é certamente um obstáculo intransponível, que, no entanto, não impede uma resolução prática do problema, por razões que não interessam aqui.
O que interessa é que os autores (não foi um só) do Estatuto do Torcedor estão vivos. Um, o Dr. Heraldo Panhoca, declarou publicamente, em inúmeros veículos da grande mídia, que não havia nenhuma sobreposição ao CBJD e que, portanto, a decisão do STJD era perfeita e que deveria cair a Portuguesa no lugar do Flamengo. Outro autor do Estatuto do Torcedor é o atual advogado da CBF no caso, o Dr. Carlos Miguel Aidar, o que, por si só, evidencia sua posição.
Pois bem: perguntando ao autor, dá para saber quem tem razão no caso, sem saber nada de direito. Isso explica o recurso da grande mídia a rábulas travestidos de juristas e/ou advogados de respeito sem isenção suficiente para dar um pitaco sobre a questão. Enquadra-se na última condição o respeitável Dr. Ives Gandra Martins, um advogado renomado, muito distante da condição de rábula, pelo que ouvi falar. Seu currículo, no entanto, informa uma relação com a Portuguesa que impede que sua opinião seja considerada isenta, com todo respeito. Como disse e repito aqui: o senhor Ives Gandra Martins foi conselheiro da Portuguesa entre 80/82 e, portanto, é ligado ao clube há muito tempo. Pois não foi exatamente o seu parecer que embasou a decisão favorável à Portuguesa em juízo? Com uma justiça destas, temo sinceramente pelas decisões injustas.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri
Fotos: Bruno Haddad – Fluminense F.C. / Divulgação
PAGAR O QUÊ? – À venda em www.livrariacultura.com.br
O Renato gaúcho lembra um personagem da escolinha do professor Raimundo, o Sandoval quaresma, interpretado pelo saudoso Brandão filho. O professor fazia duas perguntas dificílimas e ele respondia certo, sem pestanejar, aí o professor dizia, ‘senhor Sandoval quaresma, pra ganhar o 10, responda, quanto é um mais uma?’ Ele respondia: ‘três”. É então o professor dava nota zero pra ele. Gosto do Renato como treinador, mas sempre na hora do 10, ele faz uma cagada, como fez na final da…
Libertadores 2008. st
Grande Sergio, não é muito diferente a opinião que tenho do Renato. De todo modo, faço questão de recordar que, antes da derrapada final, Renato muitas vezes contribui para o clube em que trabalha. Eu mesmo pensei que sua última passagem pelo clube teria sido a derradeira. Mas, como disse no texto, no atual cenário, precisamos de alguém assertivo. A recente entrevista no canal-marrom, na qual não se acanhou diante dos nossos detratores, prova que a oportunidade fez o treinador.
ST
João…
Vale ressaltar outro ponto, alem desse do ET. A logica da justica acima da lei que tantos jornalistas bradam furiosamente contra CBF, STJD e Fluminense, eh a mesma logica das milicias armadas e grupos paramilitares. Os imbecis nao entendem as consequencias de sua pregacao na midia de massa. Nao entendem as consequencias, em maior escala, das ideias que defendem publicamente.
Quem defende justica acima da lei faz apologia ao crime e deveria ser processado por isso.