Pelo visto, mesmo sem público presente a decisão de logo mais já esquentou. O motivo chega a ser quase inacreditável, mas vamos lá: o mosaico da torcida tricolor com a imagem de Oscar Cox, fundador prático do futebol brasileiro, mais a frase “Orgulho de não ser como vocês”, que parece ter gerado dores desproporcionais em parte da torcida da Gávea.
É certo que a frase faz referências diretas a absurdos ocorridos nos últimos sete dias, que vão desde a bandalheira da aglomeração planejada no primeiro jogo da decisão, um gesto esdrúxulo e irresponsável, à especulação da mudança de local do segundo jogo na marra, com público nas arquibancadas. Dois atos que, por si só, já explicariam a arte tricolor nas arquibancadas, mas há muito mais em jogo.
“Orgulho de não ser como vocês” poderia servir para inúmeras situações passadas. Afinal, não foi o Fluminense que inventou o tri em dois anos, o Aragalo em 1980, o ladrilheiro e o Serra Dourada de 1981, as Papeletas Amarelas de 1986, nem o “Roubado é mais gostoso” em 2014. Não foi o Fluminense que, em plena pandemia, forçou com tudo a volta do futebol para depois pedir adiamento de uma partida, em função de um surto de Covid19, isso para ficar somente nestes fatos comprovados e noticiados.
No futebol, muitas vezes a paixão ajuda a naturalizar barbaridades. Pessoas que primam na vida comum pela lucidez podem se desequilibrar por completo, o que está longe de ser bom. E torcer para um clube de futebol não é, ou melhor, não deveria ser, a completa passagem de pano para todas as eventuais sandices de seus dirigentes, torcedores e jogadores.
Os torcedores da Gávea que estejam perto ou acima dos 40 anos de idade se lembram perfeitamente de 24 de abril de 1994, um domingo de clássico no Maracanã entre Flamengo e Vasco. Dias antes, havia acontecido a tragédia que vitimou o jovem atacante vascaíno Denner, nome tido como certo em futuras Copas do Mundo. Com mais de 110 mil pessoas presentes no então maior estádio do mundo, o jogador falecido recebeu homenagens de sua torcida, mas a reação do rival não foi nada urbana.
Estas linhas não têm o objetivo de estabelecer lições de moral ou separar bons e ruins, mas sim recordar fatos que, comparativamente, foram muito piores do que qualquer mosaico que a torcida do Fluminense já tenha feito em sua história. História, aliás, que cada um tem nas costas, ainda que alguns insistam em editá-la conforme o desejo e a memória seletiva.
Portanto, que o mosaico tricolor deste sábado fique na memória exatamente pelo que é: um instrumento de manifestação democrática contra a hipocrisia, uma longa hipocrisia que muita libra já pesou.
Sem falar no herói tricolor Ricardo Gomes, que ao sofrer um avc em outro Flamengo e Vasco, ouviu: “uh! vai morrer!”
Faltou o ” PAGUEM AS FAMÍLIAS ” !!!