Só o futebol salvará Flu do caos (por Marcelo Savioli)

Amigos, amigas, Marcelo vem se notabilizando nas últimas partidas do Fluminense como uma poderosa arma ofensiva. Quase empatou um jogo perdido contra o São Paulo, acertando a trave, fez golaço contra o Cerro e ontem, diante do Alianza Lima, construiu toda a jogada de mais um golaço por ele próprio marcado.

Ainda, porém, que venha mostrando inesperada evolução física, continua sendo um perigo, também, para a nossa defesa. Com apenas seis minutos de jogo, após cobrança de escanteio, Marcelo, que, aparentemente, marcava o homem da sobra, não subiu para cortar a cobrança que buscava um ponto entre a marca do pênalti e a meia lua da nossa grande área. O resultado foi uma cabeçada potente, sem chances para Fábio.

O que fazer com Marcelo? Bem, no ano passado, já a partir do jogo decisivo da conquista do bicampeonato fluminense, o nosso lado esquerdo defensivo era coberto por Alexsander, que, até então, atuara na própria lateral esquerda.

Por que isso não foi feito ontem? Ora, como é que você atua com apenas dois jogadores no setor de marcação do meio de campo e desloca um deles para cobrir a subida do lateral?

Sim, Diniz resolveu, na noite de ontem, exibir sua infindável criatividade, recriando o seu 4-2-4 para atuar contra um adversário que precisava da vitória para sobreviver na competição, podendo, então, ser uma presa fácil, já que não poderia brincar de estacionar um ônibus na frente de sua área.

Para não deixar dúvidas de que podendo complicar não há por que simplificar, deixou Ganso no banco, substituído por JK, que jogou o primeiro tempo inteiro de costas para a área, errando tudo que tentava.

Com o gol, porém, o Alianza se fechou e deixou o Fluminense trocando passes e rondando a área como o moço tímido, que não tem coragem de chegar na menina. Tirando uma cabeçada na trave de Keno, em jogada de bola parada, os peruanos pouco ou nada foram molestados defensivamente.

Voltando do intervalo, Diniz trouxe Ganso, Marquinhos e Marlon para o jogo, com a saída de Alexsander, Guga e Felipe Melo, sem renunciar ao 4-2-4. Se nossa defesa se portava como uma mãe acolhedora, sempre de braços abertos e coração generoso, pelo menos ofensivamente o Fluminense se tornou bem mais proficiente.

Foi assim que vencemos por 3 a 2, num jogo em que nenhuma injustiça teria havido se terminasse empatado.

Haverá quem diga que o mais importante é que conseguimos nosso objetivo. Primeiro lugar no grupo, quatorze jogos de invencibilidade na Libertadores, quarta melhor campanha da primeira fase e mais alguns milhões na conta. Isso, porém, não nos basta.

Analisando a situação financeira do Fluminense, com base nos demonstrativos financeiros, não consigo deixar de experimentar enorme desconforto. Não é só preocupação, porque estou falando de algo alarmante.

O Fluminense, no ano passado, teve uma despesa total de quase 600 milhões de reais. Sim, é isso que você leu: quase 600 milhões. Como é possível que nossa meta orçamentária de 2024 seja de 520 milhões, se tudo indica que essa despesa vai aumentar esse ano, com a chegada de Thiago Silva e outros tantos veteranos vitaminados?

Não basta vender 120 milhões em direitos de atletas, tem que ser o dobro disso, o que significaria perdermos de dois a quatro pilares da equipe que sobrevive a essa política suicida do futebol tricolor.

É bom, porém, que o futebol do Fluminense rompa com esse círculo vicioso em que vem entrando, sem que muitos percebessem, desde o ano passado. Qualquer criança de dois anos olharia para o nosso elenco e montaria um time titular temível, candidato a conquistar todos os títulos da temporada.

Mas, se você quer montar o seu, aproveite enquanto há tempo. Não sabemos o que sobrará depois da janela do meio do ano. Mas não se preocupe tanto. O noticiário já dá conta de que o Fluminense irá ao mercado para inflar nossa folha de pagamento com contratações duvidosas de jogadores com idade avançada.

O sonhado círculo virtuoso corre iminente risco de se transformar num círculo vicioso, numa bola de neve, que pode levar morro abaixo nossa temporada, nossas finanças e, não em tão longo prazo, nossa existência enquanto força esportiva nacional.

Para se ter uma ideia de como é o planejamento financeiro do Fluminense, tivemos déficit de cerca de 20 milhões em 2023. Vocês sabem o que isso significa? Que, somados, recebemos cerca de R$ 240 milhões pela conquista da Libertadores e pela venda de direitos da LFF. Essas receitas foram consumidas pelas despesas.

Você sabe o que isso significa? Que não fosse a conquista da Libertadores e esse dinheiro da Liga, teríamos tido um prejuízo de mais de 200 milhões no exercício de 2023. Nossa dívida, com isso, estaria na casa de R$ 1 bilhão.

E o pior de tudo é que você só vende um direito realizável no futuro, como foi a venda dos 20% dos direitos da LFF, se for para fazer um investimento ou para amortizar o passivo, mas esse dinheiro foi engolido pelas despesas, que engolirão o que ainda temos a receber.

Isso bota fim em qualquer esperança que eu pudesse ter na sanidade dessa gestão. O que estamos vendo é a repetição do que presenciamos na segunda metade da década passada, com muita distração, maquiagem, ilusionismo e falsas narrativas. Todos viram no que deu.

Lá, era a cobertura diária da construção do CT, a efeméride Ronaldinho Gaúcho, a maior venda da história e os acordos que reduziam dívidas, mas eram usados para produzir falsa narrativa de superávit no exercício, enquanto a gestão financeira ia, cada vez mais, comprometendo a sobrevivência do clube.

Eu não quero estragar a alegria de ninguém, mas a verdade tem que ser dita. A história está se repetindo, com cores mais alegres, é bem verdade, talvez com um desfecho que contrarie as tendências, mas eu temo pelo que vai encontrar o próximo Abad, o que assumirá o que sobrar do Fluminense em 2026.

Nosso único final feliz possível é um crescimento econômico capaz de frear, de alguma forma, esse endividamento, o que passa pelas mãos de Fernando Diniz e da nossa torcida, que precisa ter consciência da realidade e lotar o Maracanã em todos os jogos daqui para frente.

Só títulos e mais títulos nos salvarão até o final dessa gestão. Uma gestão que confia na sorte e não no bom senso. Que se diz austera, mas tal afirmação não sobrevive a um exame minimamente capacitado.

Que pelo menos o Diniz nos devolva o futebol brilhante que esse elenco ainda pode proporcionar se escalado corretamente.

Saudações Tricolores!