Sem autofagias (por Sergio Trigo)

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Prezados amigos, saudações tricolores!

Depois de muito tempo afastado do teclado, por falta de disponibilidade mental para escrever sobre os assuntos do Fluminense ou talvez por falta de capacidade de digerir determinados assuntos a tempo de processá-los na velocidade adequada, arrisco-me novamente a tratar de algo que há muito me salta aos olhos: a autofagia que parece ter se instalado nas Laranjeiras.

Certa vez, durante o desenrolar de um episódio em que a autofagia tricolor se fez perceber por meio de um processo judicial em que se pleiteava a destruição de exemplares de uma obra de exaltação ao Fluminense, comentei com o autor (do livro) e réu (da ação): “Nunca vi um clube tão autofágico quanto o Fluminense. Não precisamos de inimigos externos”.

Episódios de autofagia, aliás, acumulam-se atualmente nas Laranjeiras do mesmo modo em que se acumulavam taças e troféus, em nossos melhores momentos. Somos parte de um todo, ou deveríamos ser, mas as vaidades e os interesses difusos não nos têm permitido manter a unidade.

O diretor ataca o funcionário. O funcionário ataca um autor. Autores atacam-se entre si. O ex-diretor ataca todo mundo. A antiga patrocinadora ataca a diretoria. A situação ataca a oposição. A oposição ataca a situação. Opositores atacam-se entre si. Ídolo e treinador não se entendem. A torcida ataca o ídolo. A diretoria ataca o bom senso. O treinador ataca a tradição. Tricolores com posições políticas divergentes atacam-se entre si…

E assim vamos…

Para ficar somente nos assuntos da bola, a sucessão de trainees que antecederam ao atual treinador, somada a outros tantos problemas inerentes a um clube de futebol (e outros nem tanto!), afastaram o clube de disputas relevantes nas últimas temporadas, o que torna o ano de 2016 ainda mais relevante em termos de conquistas. Desde a conquista do Campeonato Brasileiro de 2012, o clube já cumpriu três temporadas inteiras sem levantar uma taça. Nem de turno. Nada.

Diferentemente de outros, a quem respeito e admiro, até, recuso-me a achar isso normal. Somos o Fluminense e, nas Laranjeiras, três anos sem taça são uma eternidade, ainda mais quando sequer chegamos perto dos títulos. Resignar-se com a falta de conquistas é aceitar que o clube se apequene.

Apesar de tudo, os desígnios da bola nos proporcionaram duas decisões em um espaço de apenas três dias. Foi o suficiente para o clube entrar em mais um dos muitos processos autofágicos que temos experimentado recentemente. De suas próprias entranhas, o clube gerou uma crise tão inócua quanto desnecessária (mais uma!), que não produziu efeito algum a não ser desgastar ainda mais a relação entre a torcida e o único jogador do elenco que talvez ainda possa desfrutar da condição de ídolo, além, é claro, de afastá-lo dos treinamentos por alguns dias, como se isso também fosse absolutamente dispensável e o jogador vivesse uma fase esplendorosa.

Para ajudar, às vésperas da primeira das duas decisões que o clube teria pela frente, o treinador decidiu “poupar” cinco jogadores na partida que valeria, não somente o título de Campeão da Taça Guanabara, como também a vantagem do empate em uma eventual decisão. E que me desculpem aqueles que pensam diferente, mas o título não é simbólico. Todos os títulos são importantes, ainda mais para um clube grande que já soma três temporadas completas levantar uma taça. Somos Fluminense e o Fluminense tem a obrigação de disputar tudo para ganhar. Ou não?

Como se não bastasse, a Diretoria ainda havia assentido previamente com a transferência da partida para Manaus em troca de dinheiro, em um movimento que só trouxe benefícios desportivos para o seu adversário, que teria um compromisso em Belém, dias antes da decisão. Não teria sido possível lucrar também em outras praças?

Ainda assim, se era para levar a partida para uma nova fronteira, porque não entrar com força máxima e lutar pela conquista da Taça Guanabara a fim de formar novos torcedores na região e aumentar a popularidade do Fluminense no país?

Por fim, quando a bola rolou, de forma tão previsível quanto habitual na Rubens League, a arbitragem decidiu a partida em favor do Vasco da Gama, invalidando um tento tricolor que certamente teria alterado o panorama da decisão. Lamentavelmente, até o momento, não se tem notícia de qualquer reclamação mais contundente vinda das Laranjeiras, que não as poucas lamúrias balbuciadas pelo treinador.

A resignação com que muitos tricolores dos meus círculos de amizade receberam a derrota em Manaus causou-me um misto de espanto e irritação, confesso. Ainda não aprendi a não me incomodar quando vejo o Fluminense abrir mão de lutar por uma taça e não faço a menor questão de aprender.

“É só mais uma Taça Guanabara, um título simbólico”, argumentaram alguns, na tentativa de me convencer a não me importar com a derrota, mas não tenho a menor ideia de como de como se faz isso. E acho que prefiro continuar sem saber como se faz. O dia em que não mais me importar a derrota do Fluminense, talvez eu não me reconheça mais.

“Agora é hora de apoiar do Fluminense na decisão da Primeira Liga”. E ontem, então, não era? Eu quero apoiar o Fluminense sempre. O Fluminense que luta pelas vitórias, que não se entrega nunca, que não se acostuma a perder, mesmo quando, para muitos, o jogo “não vale nada”.

De qualquer forma, espero que a “estratégia” adotada para a “disputa” da Taça Guanabara traga o resultado esperado na decisão da Primeira Liga. Ao poupar seus titulares, o treinador tricolor colocou um peso ainda maior na partida contra o Atlético-PR e a vitória passou a ser ainda mais importante.

Que nenhum outro processo autofágico se inicie nas Laranjeiras até a noite de quarta-feira. Que ninguém decida que a Primeira Liga é só um torneio amistoso, que sequer foi oficializado pela CBF. Que ninguém resolva poupar titulares para as semifinais do Estadual ou para o que quer que seja. Que ninguém se desentenda publicamente. Que nada nos tire do caminho de mais um título. Nem mesmo os adversários…

E que venha o título da Primeira Liga!

Panorama Tricolor

@PanoramaTri

Imagem: sat

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