Quem diria… aquele fanfarrão mor do futebol brasileiro dos anos 1980 é agora um respeitável cinquentão. Nosso amigo Philippe Von Buren lembra que, numa entrevista ou reportagem, na verdade ele tinha nascido em janeiro mas só foi registrado oito meses depois. Doces querelas do Brasil varonil.
Galhofeiro, irreverente, gozador, não pensou duas vezes antes de trocar o Rio Grande do Sul pelas terras cariocas – era a sua vocação evidente.
A vida passa num instante.
Antes de chegar ao Fluminense, provavelmente Renato Gaúcho era um dos jogadores que mais provocavam o Flu em entrevistas e declarações. Foi assim por quase sete anos. Só que a vida dá voltas e voltas: num dado momento, o craque – dos maiores de seu tempo – que escolhia onde e quando iria jogar… ficou sem clube. Milionário, bem sucedido e… ameaçado de um fim de carreira no ocaso.
E aí começou uma das maiores histórias de todos os tempos.
O craque desprezado vestiu finalmente a camisa que tanto zombara. E tudo mudou para sempre.
Os mais jovens, que viram ao vivo apenas os equívocos do treinador, não puderam testemunhar o que foram os primeiros seis meses de 1995. Uma época tão intensa que ainda arrepia hoje, 21 anos depois.
É bom que se diga: há uma lenda quando se diz que Renato carregou o Fluminense sozinho nas costas até a consagração do gol de barriga. Havia, isso sim, um time de muita luta e que ainda merece o reconhecimento devido de muitos tricolores. E RG era naturalmente o mais talentoso e consagrado dos titulares tricolores. É certo que o camisa 7 jogou cada partida daquele Carioca como se fosse o último dia de sua vida. Liderou o time, ajudou dentro e fora das quatro linhas, resgatou o espaço midiático do Flu e, bem antes de 25 de junho, disse cerca de 726 vezes que o nosso time seria o campeão. Transformou a tristeza do desprezo que recebera dos rivais em uma força descomunal que fez o Tricolor bater o time do então melhor jogador do mundo em três oportunidades – e, da última, todos sabem a história. Por tudo isso, dá para entender o que ele sentiu no gramado do Maracanã quando Leo Feldman encerrou o maior Fla-Flu de todos os tempos. Ajoelhou-se e chorou como nunca. O fanfarrão é na verdade um emotivo de primeira.
Seis meses inesquecíveis.
Ele ainda acertaria e erraria no campo e à beira dele, mas jamais por omissão. E se a dor da Libertadores é muitas vezes atribuída exclusivamente a ele, o que dizer daquelas jornadas contra Boca Juniors e São Paulo? Ou ainda antes, quando o Fluminense conquistou a Copa do Brasil e voltou ao cenário internacional de ponta depois de 23 anos?
Renato não foi nem é perfeito. Nunca foi sua meta. Mas foi humano demais.
Não conheço outro jogador de futebol consagrado que tenha cuidado e ajudado a doze irmãos.
Muitas vezes o vi com a camisa adversária, o que detestava: ele jogava demais, juntando garra e talento como poucos. Se eu analisar apenas o Carioca de 1995, ali Renato foi um Edinho, um Conca no Brasileiro de 2010, um Romerito no tricampeonato estadual conquistado em 1985. Ou seja: monstruoso.
Renato faz 54 anos. Antes dos 33, a idade de Cristo, com sua fita de rambo na cabeça, um corpo indestrutível e um coração na mão, ele desprezou as cerimônias e, como grande líder, levou o Fluminense a um de seus títulos mais difíceis, sofridos e inquestionáveis de sua história. Por isso, conta com meu eterno apreço e respeito.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri
Imagem: google/ rap
Não se faz ídolos como aqueles, daqueles tempos, não mais.
ST