Fluminense: o tempo e as reflexões (por Paulo-Roberto Andel)

REFLETIR É VIVER

I

Há um mês, quando o assunto era Fluminense 2017, uma palavra resumia grande parte dos debates virtuais e reais na torcida tricolor, além do conteúdo publicado por boa parte da imprensa segmentada das três cores – salvo raríssimas exceções -, fosse aquela representada por suas canetas de fôlego caudaloso e respeitável, fosse pelas divisões inferiores: apedrejamento.

A se levar a sério o sumo do parágrafo anterior, a barra estava pesada em função do diagnóstico: o Flu era uma porcaria completa, não contratara ninguém de respeito, os jogadores ramanescentes eram absolutamente inúteis, o clube estava desabado e a nova diretoria era apenas um enfadonho remake da anterior, medíocre, sem chance de êxito. O rebaixamento era certo no Brasileiro e a vergonha no Carioca, inevitável.

Bastou um lote de ótimas atuações em pouquíssimas semanas, comandadas pelo new blood tricolor e a mão firme de Abelão, para que certezas absolutas virassem reticências e, na página seguinte, silêncios às vezes constrangedores. Em alguns casos, o detrator colérico de ontem virou o entusiasmado vendedor de elogios por ora.

Entre os torcedores em geral – e todos somos -, a contradição é um barato: vira-se a página e pronto. Agora, para formadores de opinião – ou pretensos – que prezem pela credibilidade – com ou sem aspas – vinculados a veículos de comunicação ou não – inclusive sem poupar colegas desta casa que coordeno -, abusar da verborragia colérica pré-temporada foi, no mínimo, no barato, uma equivocadíssima precipitação. Vale até para as nada modestas subsubcelebridades tricolores do subsolo…

De toda forma, vale a sentença genial do mais importante poeta contemporâneo do Brasil, Carlito Azevedo: “Eu não sou vigia da poesia alheia”. Só.

II

Futebol é momento e, por isso, exige sempre muito cuidado na hora de se analisar, seja na euforia ou no fracasso.

Nem tudo ao céu de brigadeiro, nem tudo ao caldeirão do inferno. As coisas mudam muito rápido para melhor ou pior, dependendo de cada caso.

Equilíbrio e ponderação sempre são importantes para vivenciar o futebol. Aliás, predicados que valem para todos os caminhos da vida.

III

Eu me surpreendi positivamente com as novas – e súbitas – direções dos Henriques, o zagueiro e o nove, no que novamente peço desculpas. Que bom: quebrei a cara. Critiquei e muito. Achei que não dava. Eu errei. Ufa! O erro ajuda a progredir, refletir, ampliar o campo de visão. De mais a mais, quem não erra? O mentiroso, ora.

Em tempo: no começo da temporada, escrevi por aqui que o Fluminense havia montado um time sem nada dever a Atlético-PR e Botafogo, integrantes do G6 em 2016 e que, por isso, disputam a classificação para a fase de grupos da Libertadores 2017. Imediatamente, um enraivecido celenterado vaticinou que eu deveria trocar de time, pois “quem é tricolor não pode comparar o Fluminense a times pequenos”.

Considerando que esta coluna tem o único objetivo de oferecer reflexões gratuitas sobre o nosso Tricolor, sem exercer o papel de curso de alfabetização ou de interpretação de textos, apenas ri.

O bom senso recomenda não polemizar com imbecis.

IV

O Fluminense não venceu absolutamente nada, ainda precisa de um milhão de coisas – a começar por reforços para o segundo semestre – e vai enfrentar um monte de dificuldades.

Hoje, ainda é uma promessa, uma bela esperança, um comecinho.

Então, o que comemorar até aqui?

A resposta é simples: o resgate da alma tricolor, com bom futebol e disposição em campo, com juventude e atitude, tudo exatamente ao contrário do padrão das últimas temporadas, salvo raros momentos.

Esse é o motivo de tanta euforia.

A primeira temporada em muitos anos – inclusive os vitoriosos – que começamos bem, com ânimos renovados. A esperança possível de fazer um time honesto e digno, sem fanfarronices travestidas de ciência, bravatas de manchete e boleiragens de várzea. O tempo dos bicheiros no futebol já passou.

Para muitos como eu, um início tão vibrante quanto o do segundo semestre de 1980, quando o Flu começou o Carioca com nove jovens jogadores formados na base – e vários outros desacreditados, vindos de temporadas anteriores fracassadas. Deu título tricolor em cima de feras consagradas como Pintinho, Paulo Cezar Caju e Roberto Dinamite. Quem sabe não dá de novo? Torcer é para isso.

V

Temporadas fracassadas. Dos times campeões do Fluminense nos últimos 50 anos, nenhum escapou de ter vários jogadores oriundos de temporadas sem título. Repetindo: NENHUM. Na linguagem moderna, atletas retrofitados. Abel, decano das Laranjeiras, sabia em que cumbuca estava metendo a mão. Não foi o caso dos profetas do apocalipse, das carpideiras rancorosas e das cracatoas eleitorais, que abusaram da precipitação irresponsável.

VI

Ninguém sabe o que vem adiante, ainda que nossos sonhos sejam os melhores possíveis. Não é possível prever o futuro, mas que está sendo excelente vivenciar o presente de bom futebol e suor à camisa, é fato. Este é o grande troféu que conquistamos neste começo de temporada: o da volta da alegria em torcer, sem sermos enganados por fachadas mofadas.

Tomara que este início leve a um desfecho grandioso, é o que todos esperamos, ao menos os que torcem mais para o Fluminense do que pelo monopólio da razão.

Garantia de sucesso? Certeza da derrota? No futebol isso simplesmente não existe. Aí está o desastre de dezembro aplaudido de pé em fevereiro – e que se mantenha assim.

VII

É natural criticar a direção do clube quando as coisas vão mal – e quando há motivo justo, a crítica é válida, importante, ajuda a manter os pés no chão. Mas não custa elogiá-la quando ela é diretamente responsável pela mudança do paradigma tricolor para melhor.

Até aqui, a nova gestão do Flu cravou tudo em 2017, justificando cada milímetro do meu voto.

Parabéns. Que continue assim.

E se não continuar, serei o primeiro a criticar neste espaço, porque não tenho compromisso com candidatos, diretores, gestores e conselheiros, mas com o Fluminense.

O PANORAMA não está disponível para aluguel ou venda de opiniões.

FLU IX – CENTRO I

Em homenagem ao aniversário do clube em julho, anuncio o lançamento de meu novo livro – o de número 9 -, a princípio nas Laranjeiras. Por enquanto, ele é diferente dos anteriores por explorar mais o lirismo do que a história.

Depois do Carnaval tem mais detalhes. Por enquanto, uma imagenzinha, ok?

Ah, e para quem curte literatura fora do futebol, meu livro “Cenas do Centro do Rio”, que acabou de sair, está à venda na Livraria Arlequim do Paço Imperial – ou por inbox. Em crônicas e poemas, escrevi pequenas ficções ambientadas no coração da cidade, desde os anos 1950 até hoje.

A direção é do escritor Zeh Augusto Catalano, nosso bacalhau predileto da casa.

O prefácio é da escritora Elika Takimoto, prêmio Saraiva de literatura em 2015.

Ainda colaborou o cracaço jornalista Caio Barbosa com uma foto sensacional, a única do miolo.

Um auxílio luxuosíssimo.

CARNAVAL 2017

O PANORAMA funcionará em regime light, mas com a plena cobertura do Fluzão, preferencialmente rumo ao título da Taça GB. Abraçaço geral.

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: curvelo/rap

7 Comments

  1. Andel, que confusão essa história dos jogos das semifinais, hein? Todo ano é essa mesma coisa. Se os jogos são no Carnaval e não tem turista, para que jogo nesta época? Um abraço.

  2. Ainda tenho dúvidas se esse time vai ser a coca cola que todos vocês dizem, mas o começo é dos mais animadores. Só que aconteceu outras vezes. No mais, excelente. ST.

    1. Andel: sim, tivemos outras oportunidades, Geraldo, mas no começo de temporada, com tantos jovens da base e com partidas tão consistentes – mesmo contra adversários fracos -, eu não me lembro desde o começo do segundo semestre de 1980. Abraço. ST.

  3. “Considerando que esta coluna tem o único objetivo de oferecer reflexões gratuitas sobre o nosso Tricolor, sem exercer o papel de curso de alfabetização ou de interpretação de textos, apenas ri.” rsrsrs

    Que essa “molecada” continue nos fazendo sorrir. Que o sorriso se transforme na “risada escandalosa” do grande tricolor Ivan Lins. Para desespero dos que necessitam odiar ao invés de viver.

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