Um dia me perguntaram por que eu aparecia sorrindo em todas as fotos posadas, e não soube responder. Bem, não sabia até ontem, quando o Assis morreu. Nas muitas homenagens prestadas a ele, seja em postagens nas redes sociais ou em sites jornalísticos, em todas as fotos ele está sorrindo. Nada mais justo que eu, inconscientemente, me espelhasse nele.
Assis foi o primeiro jogador de futebol que me fez chorar de emoção. Foi quando ele recebeu o passe em profundidade de Deley e tocou na saída de Raul, aos 45 minutos do segundo tempo, no Fla x Flu que decidiu o campeonato carioca de 1983. O que leva um menino a chorar de felicidade por causa de um gol? A manifestação de algo divino, uma epifania cujo responsável estava destinado a se tornar o maior dos meus ídolos. Até porque, não satisfeito, ele repetiu a dose no ano seguinte. Virou o Carrasco. Que sorri não por sadismo em relação às suas “vítimas”, mas porque compreende a essência da rivalidade no futebol.
Anos mais tarde, quando eu discotecava na Casa da Matriz, alguém apareceu por lá trazendo um sujeito bigodudo e sorridente. O ídolo se materializava ali na minha frente pela primeira vez, e a reação frente à pista lotada foi a de parar a música, pegar o microfone e anunciar a presença ilustre puxando o coro: “Recordar é viver, Assis acabou com você”. E vocês acham que o Assis foi vaiado? A reação de tricolores e rubro-negros foi a mesma: enquanto estava por perto da cabine, muitos iam cumprimentá-lo, uns para agradecer pelos gols mágicos, outros para brincar com ele dizendo o quanto o Carrasco representou um trauma em suas infâncias.
Tomou cinco cervejas, sambou e foi embora com o mesmo sorriso no rosto. A cartela de consumo autografada eu guardo até hoje.
Ontem de manhã Assis me fez chorar mais uma vez, mas não foi de alegria. Sua morte repentina me pegou de surpresa. Como aqueles casais que não conseguem suportar o vazio deixado pela ausência do outro, Assis foi atrás de Washington, seu eterno companheiro de gols e sorrisos, que partiu 42 dias antes dele. O Casal 20 foi bater uma bola no céu.
De tarde, estava num casamento, quando, numa mesa ao longe, um senhor esguio, mulato, de cabeça branca me lembrou muito o Assis. Imaginei o Carrasco com aquela idade, 70, 80 anos, pisando no gramado do Maracanã para receber mais uma homenagem. Acenava para a torcida do Flu, que entoava o “Recordar é viver…”, enquanto eu, acompanhado dos filhos na arquibancada, mostrava aquele senhorzinho sorridente e contava da primeira vez em que chorei por causa do futebol.
Então chorei mais uma vez e desejei, que no futuro, o privilégio de ter um ídolo como Assis seja dos filhos que virão.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @marcelojanot