Não sei dizer quando o Fluminense não fez parte da minha vida. Em 1974 eu mal tinha cinco anos de idade e lá estava aquele nome escrito no antigo placar do – mais antigo ainda – Maracanã num 0 a 0 noturno. Não lembro do jogo nem da escalação nem do uniforme, mas lembro da força do nome publicada em minha memória, de modo que 45 anos depois ela se repetiu diariamente várias e várias vezes. Provavelmente é a palavra que mais disse, pensei e escrevi na vida, somadas as suas derivações: Flu, Fluzão, Tricolor e por aí vai.
Ele está nos meus botões, nas histórias que colecionei, nos amigos que fiz e em trocentos mil jogos por todos os campos. Para poder vê-lo mais, economizei muitos trocados de mesadinha para ir à geral. Em certa época pude ver jogos de graça porque era permitido o livre acesso dos escoteiros e aí descobri as antigas cadeiras azuis – que pouca gente gostava e só lotavam em decisões.
Ainda sei de cabeça meu velho ritual para ir aos jogos no Maracanã quando era um garoto de Copacabana: descer a Figueiredo Magalhães até a entrada da galeria do Cine Condor, onde tinha um ponto de ônibus, e esperar o 434 branco, com uma faixa vinho e outra azul escura. Podia ser o 435 também, que era mais rápido e ainda passava na porta do clube na ida e volta. Quantas e quantas vezes admirei os muros e sonhei com jogos lá – que acabariam voltando em 1986.
Tudo passou rápido demais mas foi maravilhoso. Quem esperava às quinze para as cinco da tarde para que todas as bandeiras das organizadas viessem do primeiro túnel à esquerda das cabines de rádio, e então fossem subindo em fila indiana até o meio da arquibancada, sabe o que foi ver um jogo do Fluminense um dia. Em seguida, aquele céu de talco que nos fazia literalmente estar nas nuvens. O time podia até perder – naqueles tempos ganhava muito -, mas não houve garoto que passasse imune a tamanha experiência. Muitos deles passaram a perseguir o Fluminense para sempre. Tudo por conta da Young Flu do Seu Armando e da Força Flu do Zezé e do Antonio.
Todo tricolor já foi Young Flu muitos dias. Entre 1986 e 1991 eu vi todos os meus jogos no Maracanã no último degrau da arquibancada, acima do mar branco, e por duas horas me sentia imortal.
Uma das melhores coisas que já me aconteceu foi quando fui aprovado para estudar na UERJ. A minha vida mudou para sempre e, além do mais, que alegria era atravessar a rua depois de uma aula para ver jogos do Fluzão! Por oito anos meus dois amores eram uma vizinhança.
As pessoas vieram e foram, os amores vieram e foram, os dinheiros, os empregos, os dias belos e tristes, tudo passou. Para mim só ficou o Fluminense. Ele veio me trazendo pela mão até aqui. Ainda sou capaz de chorar lembrando dos nossos momentos, pouco importando se eram de glória máxima ou de dor.
Hoje o Fluminense faz 117 anos. Diariamente ele dá sentido a vida de milhões de pessoas. Mora nas vozes dos seus torcedores mais humílimos e abonados. Carrega no ventre o sentimento de um verdadeiro exército de artistas, intelectuais, poetas, maravilhosos anônimos, veteranos em seus momentos derradeiros e jovens com toda a vida para a frente.
O Fluminense é o amor, não o ódio. É o pertencimento, não a exclusão. O Fluminense inventou o futebol brasileiro como ele é, ganhou o mundo nos anos 1950, criou fama com vitórias e superações tidas como impossíveis, escapou várias vezes da morte e continua aí a nos brindar com suas façanhas. Hoje estamos chateados por conta do Brasileiro, mas só por hoje vamos nos dar todas as mãos, um show de mãos, e lembrar de todas as coisas boas que as três cores siamesas da imortalidade já nos proporcionaram.
O Fluminense ainda é meu escudinho de 1,5 cm recortado na Revista Placar para colar num botão de vidrilha. Ou a linda bandeira que minha mãe fez para mim, e que foi solitariamente desfraldada na geral, naquela derrota para a Portuguesa da Ilha em 1982. Ontem à noite revi no YouTube os 6 a 0 sobre o Maranhão em 1979, e também aquele drible maravilhoso de Romário sobre Claudiomiro do Grêmio em 2002.
Graças ao Fluminense me tornei um escritor publicado e, agradecido, retribuí com mais 13 dos meus 26 livros. Somados às mais de 930 colunas neste PANORAMA e em outras centenas em outros veículos, já deve ter passado de cinco mil páginas. E, sinceramente, eu ainda não escrevi nada, porque só posso parar quando todo o meu amor estiver devidamente publicado. O que mais poderia ter me levado a conversar cara a cara com Gilberto Gil, Maria Bethânia e Bibi Ferreira? O Fluminense, claro!
Cheguei até aqui falando de pouquíssimos jogadores, nenhum dos nossos inúmeros títulos e nem mesmo das nossas grandes tristezas – não existe vida sem variações, ninguém nem nada é perfeito. Mas nem precisei: é que o Fluminense é muito mais do que um time de futebol ou um clube de futebol. Ele é um estado de espírito, uma presença ferrenha, uma travessia bravia de mar interminável, uma atmosfera que nos ganha os pulmões e permite respirar. Se fosse escrever sobre títulos, ídolos e grandes momentos, lá vinha um livro de duas mil páginas.
Fluminense, parabéns a você pelos 117 anos. Obrigado por tudo. Ninguém há de te macular, nenhum aproveitador barato. Obrigado por existir e me fazer entender o real sentido do amor. Que hoje seja um grande dia nas Laranjeiras, que na terça consigamos um grande resultado, que a tua vida seja cada vez mais digna e pacífica.
Nenseeeeeeee!
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @pauloandel
#credibilidade
Pqp, que foda, parabéns Andel
Excelente, comecei nos estádios em 66, Bangu x crf. Já tricolor de coração. Depois em 1969, fui ser campeão carioca contra eles, a partir daí, era frequente idas ao Maracanã, Laranjeiras ver minha eterna paixão jogar e vender. Hj com 6.2, já ñ sou assíduo nas arquibancadas como antes, muito pelo péssimo futebol apresentado atualmente. Mais minha paixão só cresce. Nenseeeeee. Abraço Paulo.