Não existe amor em SP (por Paulo-Roberto Andel)

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OS GRÃOS

Está tudo perdido


“Os sábios sabiam demais e mesmo que nada tenham feito para ajudar o time que amam, vaticinaram: tudo é uma merda. Tudo está errado, sempre esteve errado. Não há o que fazer: faltando cinco jogos para o fim do campeonato, o Fluminense já está rebaixado, mesmo que a matemática diga não, mesmo que este frágil campeonato tenha suas reviravoltas e nada do que passou tem importância. Resta o caos, o ódio e a dor. Não é possível vencer o Náutico, nem o time reserva do São Paulo e menos ainda o Atlético Mineiro às vésperas da viagem. E claro que o Vasco vai vencer no Sul, a Portuguesa no Maracanã e o Criciúma no Hulse. Não há o que fazer. Nós somos a derrota, o féretro, o fim. Eles são muito, mas muito melhores. Vejam suas grandes reações. O Náutico já caiu mas é muito melhor do que nós. Quaisquer times das séries B e C são melhores do que nós.”

“Caio Júnior iria nos salvar. Ou Celso Roth. Ou Péricles Chamusca. Que tal Paulo Campos?”

“Não seja ridículo!”

“Vamos ficar muito doidos numa onda lisérgica e acreditar que tudo vai mudar. Afinal, se o azul e o verde prevalecerem, muito verde com azul-limão, vamos ver as pessoas pescando pessoas no mar. Vamos nos afundar nas lingeries. Vamos pedir desculpas a nós mesmos por toda a nossa idiotice e, no fim, rirmos de tudo pelo alívio.”

“Você está louco?”

Nada vira do avesso sozinho. Temos uma crise sem tamanho. A dureza de acompanhar tudo à distância, mesmo que com um belo aparelho de TV na casa de meu amigo O Boto. Mais uma vez perdemos na última bola. Era um jogo medíocre, mas equilibrado. O Corinthians dominava, mas chutava pouco. Nós não chutávamos nunca. Marcelinho teve uma grande chance no segundo tempo, o ataque não faz gols. Diguinho estava bem até sair machucado. Valencia voltou com toda raça. Ah, a última bola, tortuosa e mortífera bola. O pênalti, o gol, o fim. O que será de nós? Oh, chegamos à zona de rebaixamento no último lance da partida – e quantos jogos temos perdido neste campeonato através da bola derradeira? Um mínimo de calma e não teria acontecido. Uma jogada tola. Faltou técnica, sobrou briga, a jogada final receitou a fragilidade dos nervos. Vanderlei… Vanderlei… nossos fiéis nas arquibancadas de Araraquara não mereciam isso. Ninguém merecia isso, nem mesmo os idiotas da objetividade que já cantam o samba da nossa morte nas ruas virtuais. O Fluminense perdeu dois jogos seguidos onde poderia ter conseguido quatro pontos. Não conseguiu nenhum e voltou ao velho desespero de anos anteriores na era dos pontos corridos. Se existe alguma diferença, é que hoje ainda se sonha com a volta de Fred; antes, era Josafá ou Evando. Tudo está muito difícil, difícil ao extremo de que nada que possa ser escrito aqui fará de si o bálsamo, mas existe uma distância abissal entre tudo estar difícil e tudo estar perdido.

“E se você achar que eu tou derrotado, saiba que ainda estão rolando os dados porque o tempo não para.”

“Dias sim, dias não, eu vou sobrevivendo sem um arranhão da caridade de quem me detesta.”

“Não existe amor em SP. Os bares estão cheios de almas tão vazias, a ganância vibra, a vaidade excita.”

“Coitado do homem que cai no canto de Ossanha traidor.”

“À essa altura do fato, nem fumaça tem cano de descarga.”

O que o mestre Nelson diria de tudo isso?

Não está tudo perdido

Nove pontos salvadores. Um time que não ganha desde setembro. Dor, tristeza, caos. Perda. Sombra. Luto, não. Não. Luto não!

Enquanto há vida, há Fluminense. Enquanto há Fluminense, há sempre a chance de que o impossível seja estupidamente ridicularizado perante seus fãs. Não morreu na segunda divisão. Não morreu na terceira divisão. Não morreu quatro vezes nos últimos dez anos, mesmo com todos os desmandos. Pode muito bem não fenecer agora.

O que resta é gritar nas arquibancadas e impedir a destruição de uma época. Quando o time assume matizes trágicas, só a torcida pode salvá-lo. O descaso foi cúmplice dos rebaixamentos em 1996, 1997 e 1998. O apoio foi alicerce dos salvamentos em 2003, 2006, 2008 e 2009 – e neles tudo era bem mais difícil. Caldeira foi novamente lúcido em sua chamada de hoje – todos ao Maracanã!

Lutar contra os 50% de descenso.

Lutar contra as manchetes. Lutar contra até quem se infiltra em nossa arquibancada para ver a nossa morte e lucrar com isso. Os chutes são escassos, qualquer bola contra nossa área é uma tormenta.

Ressalte que, desta vez, nem Tristão pôs a adaga em nossa carótida. Deve ter seus motivos.

As cadeiras azuis estarão cheias de fé

Os ateus vasculharão as arquibancadas em busca de Deus. Os religiosos gritarão seus cânticos para empurrar um time em frangalhos porque acreditam em Deus. O poeta sentenciou de que Deus está do lado de quem vai vencer.

O futuro ruge. Não há de repetir o passado pior.

Futebol é o sopro de uma semana. Os que desacreditam que o sol nascerá não viveram. A vida não sorri para os acovardados.

O que o mestre Nelson diria de tudo isso?

Panorama Tricolor

@PanoramaTri @pauloandel

Imagem: PRA

Citações de Toni Platão, Vinicius de Moraes, Criolo, Arnaldo Baptista, Cartola, Renato Russo e Cazuza

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1995 PEQUENO
DR PEQUENO

6 Comments

  1. Caro Andel, como você, também frequento o Maracanã (e outros estádios) sempre que posso, mas desde 1985. Nunca disse que a torcida não deve apoiar, apenas que algo além disso deve ser feito. E acabo de saber que o Luxemburgo foi demitido. Agora, fico mais esperançoso. ST.

    1. Retificação: eu frequento na verdade desde 1975. Utilizo o ano de 1978 como base porque foi a partir dele que eu comecei a ir semanalmente.

      Bom, é direito seu achar que a demissão de Luxemburgo te dá esperanças.

      Mas justamente por causa de 35 anos de arquibancadas regulares, não tenho a menor animação pelos nomes exóticos de Caio Júnior, Celso Roth e congêneres.

      Nenhum com identificação com o clube, nenhum com histórico de superações em momentos delicados.

      Haja o que houver, a bomba ficou na mão dos poucos tercedores que ainda toparão a empreitada. Por que se depender da beira do campo…

  2. Caro Andel,

    Ao final da partida de ontem me perguntei: O que ele escreverá?

    Reconheço e admiro o seu otimismo! Também sou otimista, mas este time não tem alma, falta coração e técnica! Passamos a partida inteira aguardando o triste fim, com medo!
    As esperanças querem morrer…

    Continuarei torcendo! Mas está difícil.

    Gum, LE e Anderson juntos. A bola pune!

    Wanderlei tem que afundar ou salvar o navio, e só! Desta Nau salvam-se poucos pelo profissionalismo, Sóbis e Cavalieri,…

    1. Raphael, minha ênfase na presença da torcida é uma maneira de retratar o caos.

      A conta é nossa.

      Esqueçamos time, tática, treinador, ídolo.

      Só tem a camisa e a torcida. O resto é perder tempo.

      Aterrisar esse avião em paz, espero, e traçar o novo Fluminense.

  3. Caro Andel, se não mudar o treinador, nada mudará. De que adiante 50 mil no Maraca se o time entra com 3 zagueiros e 3 cabeças de área, sem laterais e sem um atacante de verdade? Chegou a hora de mudar, ainda dá tempo.

    1. Caro Andrei, o que não adianta nada é torcedor só ficar reclamando e não fazer nada que lhe caiba.

      Basta dizer o que foi ontem a torcida vascaína com um time pior e em posição mais desfavorável ainda no começo da rodada.

      Se pudesse, eu entrava em campo. mas não posso.

      A conta de um rebaixamento explode nas mãos da torcida. E quem não tem compromisso em estar lá nas horas difíceis, pensando bem, iria se preocupar com o quê? Se não vale a pena lutar contra a morte, para que se preocupar com futebol?

      Vanderlei foi um equívoco; entretanto, sua mudança só serviria para talvez sacudir o ambiente (extremamente problemático por outros motivos). Ninguém vai aprender a fazer gols porque qualquer outro sujeito chegou para fazer milagre à beira do campo em cinco jogos.

      Os nomes apresentados para substituir Vanderlei foram tão estapafúrdios que, para mim, melhor era efetivar Júnior Lopes ou trazer Marcelo Veiga da base. Celso Roth, Caio Jr. e outrem são para chorar de rir – e o pior é que isso quase aconteceu.

      Estarei lá na quinta-feira como tenho feito há 35 anos.

      O time é fraco, o treinador está muito mal, mas eu não cometerei a sandice de abandonar as arquibancadas neste momento.

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