Fragmentos de Flu x SP (por Paulo-Roberto Andel)

[Eu assisti o segundo jogo de 1986 na casa do Luiz. Já faz tempo.

No jogo de ida, com sol e despedida do meu amigo Gomão – de mudança para São Paulo, vencemos por 1 a 0, gol de Washington de cabeça. Saí do Maracanã e fui para a Rodoviária me despedir do camarada.

Quarta-feira à noite, nós com os olhos pregados na TV. O Flu só precisava do empate para passar, aguentou firme boa parte do jogo mas, perto do fim, Careca, sempre ele, acertou um chutaço, a bola no travessão, na trave esquerda, gol. Perdemos. Foi dolorido. Luiz ainda era um garoto. Bom, pelo menos ainda iríamos fazer muita festa naquele apartamento pelos três anos seguintes.

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[Dois anos antes, 1985, tínhamos perdido antes no Maracanã por dois a um. Nunca mais me esqueci desse jogo, porque foi a última vez que estive com meu pai na arquibancada. Nos encontramos depois da derrota, ele tinha ido com dois amigos. Voltamos juntos, com João Carlos, no 435. Vivíamos tempos muito difíceis, com muita pobreza, brigas em função do alcoolismo, mas aquela tarde ficou como uma data especial, de paz, de pai e filho. Não esqueço.

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[O mundo inteiro vibrou quando o Fluminense venceu o São Paulo com aquela cabeçada inesquecível de Washington em 2008. Nós éramos os melhores do mundo. Eu chorava em casa esperando a funerária remover meu pai. Veríamos o jogo juntos. Ele me devolveu uns 300 reais emprestados, foi para o quarto e morreu. Tudo num espaço de dois minutos. A vida é assim. Meu pai era paulista, viveu o diabo lá até 18 anos de idade, veio para o Rio e nunca mais voltou. Ele não era fácil, mas era uma pessoa muito boa. Tricolor de vez no Rio, nunca deixou sua admiração de infância pelo São Paulo, que eu herdei nos jogos de botão.

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[No primeiro Fluminense x São Paulo depois da Libertadores 2008, dois meses e meio depois daquela noite mágica, ganhamos de novo por 3 a 1 e Washington fez três gols – cinco, se somarmos os da Libertadores. Uma linda noite de arquibancadas vazias.

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[Fomos para Barueri bem cedo no domingo. Tínhamos muita confiança na vitória e no título de 2010. Na sexta anterior, tive uma notícia surpreendente: depois de treze anos de luta, eu teria a chance de publicar meu primeiro livro – e sobre o Fluminense! Saímos do Rio com a polícia ocupando o Complexo do Alemão. Passamos um domingo de glória em São Paulo: o Flu teve um grande segundo tempo, goleou por 4 a 1 (Richarlyson e Ceni ajudaram) e arrancou para seu título imortal.

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[Hoje é um sábado tranquilo. O Fluminense está classificado para a Libertadores, o que para muitos é um título. Outros creem livremente na maior gestão de todos os tempos… Outros sentenciam que com a SAF implementada imediatamente, o Flu estará resolvido para sempre…

Os homens, sempre embriagados pelo poder, pelo dinheiro e pela arrogância inútil. Os homens, com a força da prepotência aditivada. É tudo tão estúpido. Mentira, corrupção, dissimulação.

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[Eu tenho Pita, Serginho e Renato em botões de galalite. Vidrilha também. Do Flu são muitos times, muitos. Foram muitos jogos e campeonatos, muitos dias felizes.

Neste triste sábado frio, ouço ao longe o alto-falante do carro da pamonha.

Meu pai na arquibancada, João Carlos, aqueles campeonatos, nunca mais. O tempo está passando, o cerco está se fechando, meu coração vai explodir. Fiz o que pude pelo Fluminense etc. Agora cumpro uma pena sem ter cometido qualquer crime, exceto o de ser pobre, que não foi escolha minha.

Logo mais tem um bom jogo no Maracanã. Os jovens precisam se encontrar mais com seus pais na arquibancada, antes que seja tarde. Tudo passa rápido, o tempo não espera.

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[Fluminense e São Paulo reinaugurando lindamente Laranjeiras em 1986. Que alegria!