Os bons companheiros
Meio-dia de domingo, hora de um possível bom almoço, o descanso justo no último dia antes do verdadeiro ano de 2013, findo o Carnaval. Depois de mil jogos como titular das arquibancadas, ver o jogo pela televisão entre Fluminense e Volta Redonda não me constituiria uma “tricolebagem” autêntica. Mas aí cometi o feliz “erro” de adentrar as redes sociais tricolores, Caldeira não espera, Carlinhos fez a chamada, veio um táxi na Cruz Vermelha e meia-hora depois já éramos incorporados aos sensacionais fiéis na estrada rumo à Cidade do Aço. Gosto de viajar para ver o Fluminense, essa pequena tensão saudável em ser estrangeiro na própria terra enquanto o time em campo é um símbolo da nossa localidade no mundo. Melhor ainda é que trata-se de um “jogo sem importância”, onde quem realmente vai é para vibrar e apoiar, tudo bem longe dos deslumbrados de plantão a tirarem fotos de si mesmo com seus celulares, de costas para o campo enquanto o Fluminense joga. Perguntem a Maurício Lima se há algum jogo do Fluminense sem importância, ora: a resposta será uma justa bordoada verbal capaz de fazer corar uma vovó em plena Cruz Vermelha.
Houve sol na estrada, muito sol, o calor infernal do verão e tempestade ao estacionar nosso ônibus, um típico prenúncio dos jogos tricolores. Chuva torrencial, vigorosa nos arredores do Raulino de Oliveira uma hora antes do jogo, tudo enquanto o Vasco, outrora Barcelona da Colina, penava contra o poderoso Audax até marcar seu primeiro gol.
Foi um jogo com os típicos ingredientes tricolores, repito. O começo tranquilo, o primeiro tempo com total domínio: 2 x 0 foi pouco, poderia ter sido 4 x 0 sem nenhum desrespeito ao Voltaço. Nossa tranquilidade fez casa nos pés de Deco, de volta aos gramados e, depois de dois passes iniciais errados que chegaram até a causar protestos naturalmente exagerados, fez o que quis: virou bolas de vinte ou trinta metros a granel, deu toques leves e desconcertantes, colocou o ataque de frente para o gol umas cinquenta vezes. Acho engraçado quando os míopes da memória o chamam de “velho” ou “bichado”, dois argumentos que por si só representam o pensamento mais esdrúxulo. Eu apenas lamento que Deco não tenha vestido nossa camisa dois ou três anos antes – se fossem cinco, em 2008, com ele em campo jamais teríamos deixado escapar a América. Jorand lembrou aqui hoje: infelizmente Deco grava os últimos capítulos de sua gloriosa carreira neste 2013 com nossa camisa. Vivamos cada jogo, cada passe, cada drible como se fosse uma eternidade. Como se fosse um solo de Robert Cray em campo. E justamente Deco explica indiretamente a queda de produção do Fluminense no segundo tempo: quando ele cansou, naturalmente o Volta Redonda explorou o fato e foi mais perigoso contra nós. Na primeira etapa, fomos senhores absolutos, sofremos apenas um perigo real quando tiramos uma bola no abafa quase em cima da linha. Depois veio o intervalo e a emocionante apresentação do jogador com necessidades especiais fazendo mil embaixadinhas e efeitos apenas com um pedaço da perna e as muletas como torres de vigia. Admirável.
Não posso deixar de falar do pênalti. Não persigamos Neves, mesmo que tenha sido uma quixotada. Ali ele foi generoso, a torcida toda apoiou, era a hora de Rhayner desencantar. Não deu certo. E se alguém me perguntasse “você faria o mesmo?”, não sei dizer. Mas compreendi a humanidade. Não era a hora ideal, mas aconteceu. E se Rhanyer sofre com a bola nos pés, seu esforço para acertar é comovente. Outro jogador que vinha em preocupante baixa e fez uma ótima partida ontem foi Diguinho: lutou como nos tempos de 2009 (mesmo sem a parafina no cabelo, uma espécie de amuleto), desarmou mil bolas, disputou cada naco de grama e também fez valer o ingresso. Samuel fez o que se espera: gols. Wellington Silva, muita força e pouco jeito. Gum e Elivélton, impecáveis. Anderson, às vezes engraçado como quase-volante, mas sem comprometer. Berna seguro, uma ou outra bola mais ensaboada por causa da chuva e também pelo ritmo de jogo.
Etapa final, o Fluminense podia ter aumentado o marcador e resolvido o jogo. Mas aí seria uma partida completamente tricolor? Não. Era preciso a dor, o drama, a dificuldade. Com Deco cansado, nossa criatividade rareou, o Volta Redonda foi mais impetuoso, fez seu gol, a tensão rondou as arquibancadas do Raulino pelo risco do empate, o que felizmente não aconteceu. Então o garoto Marcos Junio veio a campo (Felipe também, os dois em lugar de Neves e eco) e, numa jogada de atitude, colocou a bola na frente pela esquerda, adentrou a área e, quase caindo, tocou em diagonal para marcar o terceiro gol no fim da partida, selando o mar da tranquilidade tricolor e recordando 2005. As arquibancadas foram mais felizes, os fiéis tentavam namoros de ocasião a todo custo, todos infrutíferos. E Bruno Vargas se coçou com um garfo para comemorar a vitória, se é que me entendem. Vários jogadores atiraram camisas para a torcida em sinal de agradecimento. Volta Redonda é nosso jardim de casa.
Na estrada deserta em pleno negrume da noite, voltamos para o Rio com o sabor da classificação encaminhada. Viajar é sempre expandir os caminhos. Ainda deu tempo à noite de falar ao telefone, lembrar de grandes amores, comer um sanduíche como um troféu. Foi uma vitória dos fiéis, dos que acreditam, dos que sabem cantar muito bem que arquibancada não é sofá ou sala VIP para ver e ser visto. Amanhã ou depois, caso suceda o grande – e importante – título da Guanabara, alguém há de lembrar: “Pavimentamos esta conquista em Volta Redonda”. O tempo não sabe esperar e, daqui a pouco, vem o confronto importante, perigoso e decisivo contra o mordido Grêmio pela América. Cheguei até esta linha e não mencionei um trunfo impecável que teremos na quarta, ausente ontem: Fred, o craque maior. Isso diz tudo.
Paulo-Roberto Andel
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @pauloandel
Imagem: PRA
Contato: Vitor Franklin
Rods comenta:
Eu acho ainda cedo pra dizer se o Rhayner foi um erro. É fácil perceber que ele é extremamente esforçado. Porém, tb é fácil perceber que tem uma cabeça de burro enterrada na casa dele. Ô rapaz azarado! Nada dá certo pra ele…
Eu só gostaria de lembrar que a contratação dele foi feita em cima da possibilidade de passar um longo período sem o Marcos Júnior, pois assim como todo mundo, o Abel e o Fluminense tb acharam que aquela seleçãozinha seguiria em frente e jogaria o mundial.
ST!
Diguinho, sempre foi guerreiro,passou por uma fase ruim e os tricolebas de plantão o massacraram e o crucificaram como sendo o único mal do time,causado pelas mas substituições do Abel…Diguinho fara muito ainda pelo Flu. Como o perfeito maestro DECO disse:quem tinha que cobrar o pênalti seria eu o TN que treinamos para isso.Concordo sempre com vc,maestro!
Ainda bem que o Deco voltou a tempo de participar e ajudar o Flu 4f contra o Grêmio.Vamos com tudo pra vencer e vencer!
Paulo, como sempre textos impecáveis! ST
Ainda esperarei um pouco pra detonar o Rhayner.
Lembro que o Mariano começou muito mal, e terminou
sua passagem pelo flu muito bem!
Sendo fundamental na “fuga” de 09 e no tri 10.
Nas semifinais nosso adversário jogará com a vantagem do empate.
Quanto ao Diguinho, concordo, foi muito bem ontem.
Quanto ao Rhayner…
O Fluminense não é time de várzea, jogo valendo classificação, 1×0, começo do jogo e ao invés de Deco ou TN, que treinam cobranças de penalti, colocam o Rhayner pra bater só porque ele não faz um gol há 2 anos.
Pensaram no Rhayner antes de pensarem no Fluminense, que isso jamais se repita.
Aliás o Rhayner foi um erro, Wellington Nem é o titular do time A, esse era um jogo pro Marcos Júnior pra dar mais oportunidade à ele, aumentar a evolução deste jogador atuando nestas partidas, mas não.
Abraços.
Texto maravilhoso. Vitória do Fluminense como manda a Tradição. Sem mais. ST!
Quer dizer que eu fui o culpado, né, maníaco? Kkk
Paulo comenta: foi! 🙂
Parabéns ..