No dia 10 de junho de 1975, o Maracanã viveu um dos dias mais icônicos de sua história. Nessa data, há quase cinquenta anos, a Máquina Tricolor do Fluminense liderada por Rivellino, derrotou o Bayern de Munique bi campeão europeu de Franz Beckenbauer. A sábia inquietude de Francisco Horta transformou, o que era para ser apena um amistoso, em um dos maiores duelos da história do futebol. A partida foi especial por vários fatores, viagem histórica que faremos agora.
O presidente Francisco Horta, o pai da Máquina, organizou o amistoso para celebrar a volta de Paulo Cézar Caju ao futebol brasileiro. O ponta estava retornando do Olympique de Marseille. A década de 1970, vencedora e gloriosa, foi marcada por times que honraram o pioneirismo, a grandeza e a tradição do Fluminense. Cabe ressaltar que o amistoso também tinha o objetivo de comemorar os títulos da Taça Guanabara e do Campeonato Carioca daquele ano.
Carlos Alberto Parreira, integrante da comissão técnica desde 1970, foi o treinador do Fluminense. O técnico Paulo Emílio foi liberado em virtude do falecimento de seu pai. Reza a história que o presidente Horta escalou dois jogadores. O primeiro foi o recém chegado Paulo Cézar, totalmente sem ritmo de jogo. O segundo foi Cafuringa. Como relata Paulo Andel em “Cotidiano Tricolor”, obra recente do célebre escritor, Gil estava com a perna engessada. O substituto seria Wilton, mas Horta quis Cafuringa por confiar no jogador. Wilton estava com o filho doente, o que pode ter contribuído para a decisão da diretoria.
As duas equipes jogavam no 4-3-3, o esquema mais utilizado à época, sempre com apenas um volante, um meia direita e um meia esquerda. O Bayern era o atual bicampeão europeu e ainda conquistaria o tricampeonato em 1976. O seu plantel contava com campeões mundiais em 74, com a Alemanha. Estamos falando de Maier (melhor goleiro do mundo), Schwarzenbeck, Beckenbauer (melhor zagueiro do mundo), Müller (maior artilheiro das Copas até 74) e Kapellmann.
No Flu, Caju estava sem jogar há tempos e, para participar, teve que jogar de centroavante. Manfrini foi o sacrificado para que PC pudesse atuar pelo menos no primeiro tempo. Mesmo sem ritmo, Paulo Cézar fez ótima dupla com Rivellino. Os dois promoveram um revezamento entre o apoio e o ataque que desnorteou a defesa alemã na entrada da área, além dos dribles de Mário Sérgio e da velocidade de Cafuringa, ponteiro agudo que honrou a confiança de Horta com muita habilidade e disposição.
O sistema defensivo teve atuação segura. Toninho subia mais pela direita, enquanto Marco Antônio ficava mais preso para ajudar a zaga. Zé Mário foi muito bem no controle do espaço e Cléber, elegante e voluntarioso, apareceu bem na defesa e no ataque. O gol único da partida, ocorrido no início do primeiro tempo, nasceu com um elástico mágico de Rivellino que deixou o alemão tonto. Após o drible, Riva rabiscou o gramado com passe preciso para Cléber. O meia entrou livre e chutou forte, momento em que Müller se afoba e, na tentativa de salvar, empurra contra o próprio gol.
Roberto Rivellino, como sempre, foi um capítulo à parte e o grande destaque do time. Mesmo com a marcação implacável de Zobel, jogou muito pela meia esquerda e quase marcou um golaço do meio da rua. Riva caía pelo centro para criar e disparar sua patada atômica, mas também mergulhava como atacante em seu revezamento com Caju. O campo tático abaixo mostra o 4-3-3 com faceta de 4-2-4 utilizado pelo Tricolor para amassar os alemães.
O Fluminense dominou grande parte do jogo, entretanto o que separou o Tricolor de uma goleada histórica, foi a atuação monstruosa do goleiro Maier. Cafuringa fez um primeiro tempo muito bom, com bastante intensidade pela direita. Pela esquerda, o Flu tinha o drible de Mário Sérgio e a genialidade ímpar de Rivellino. Após quase trinta minutos avassaladores, o Bayern equilibrou a partida, sobretudo com as subidas de Beckenbauer, líbero do escrete alemão que possuía liberdade de movimentação. Mas o Flu nunca deixou de controlar as ações, fazendo o difícil parecer simplório.
Na etapa final, Manfrini entrou na vaga de Paulo Cézar e intensificou a movimentação. O Fluminense teve boas chances, mas não conseguiu concretizá-las em gol. Mais uma vez, falando sobre a genialidade de Rivellino, três lances dele chamaram a atenção, entre os tantos que proporcionou. O elástico estonteante e o passe para Cléber que originou o gol, a tentativa de fazer um golaço quase do meio campo que obrigou Maier fazer grande defesa e o lançamento de quarenta metros que deixou Cafuringa na cara do gol. Mas, mais uma vez, o goleiro alemão salvou.
Em um dia de gala, o Maracanã teve mais de 60.000 pagantes, porém, com a falta de ingresso e a invasão da massa, mais de 100.000 sortudos presenciaram uma das grandes partidas da história do Fluminense. Época em que batíamos de frente com o campeão europeu e base da Alemanha campeã mundial pelo fato de que o nosso time também contava com jogadores campeões do mundo pela seleção brasileira e mais uma pá de craques de altíssimo nível. Felizmente o presidente Horta entendia a grandeza do clube e montou essa verdadeira seleção para ganhar e encantar todos que amam o futebol.
O Tricolor, com sua Máquina histórica, destroçava adversários com sutileza e classe, liderada pela genialidade sublime de Rivellino. Venceu com autoridade o temido Bayern que assombrava a Europa, lembrando que flertou com a goleada, sendo esta rechaçada pela atuação incrível de Maier. Esse duelo honrou aquela frase muito utilizada que afirma “Nós somos a História”. Todo tricolor, do céu e da terra, precisa entender a grandeza infinita das três cores que traduzem tradição. Só assim voltaremos a viver dias gloriosos como este 10 de junho de 1975.