Fla x Flu: onde a coruja dorme (por Paulo-Roberto Andel)

Num campeonato vapt-vupt que poderia ter sido muito melhor se houvesse vontade política, chega a hora do capítulo final em dois episódios, nesta quarta e no próximo domingo: a grande decisão. E como de praxe nos últimos anos, vai ter Fla x Flu.

É curiosa essa repetição de finais com o clássico imortal, até porque ela sucede uma seca: desde o apoteótico título do Centenário em 1995, que o mundo inteiro conhece por “gol de barriga”, uma nova decisão entre Flamengo e Fluminense só voltou a acontecer 22 anos depois, em 2017.

Então é isso: lá vem o Fla x Flu cheio de histórias, lembranças e referências. O jogo que nunca termina, a paixão que se renova há mais de um século, o clássico que é o maior do Brasil por se distinguir de todos os outros num detalhe de nascença: nenhum outro clube do país tem a relação umbilical que o Flamengo tem com o Fluminense. O adversário que é mais do que um rival, mas um membro da mesma família, que compartilha a mesma mesa. Uma história tão fascinante que só um gênio como o tricolor Nelson Rodrigues poderia defini-los: os irmãos Karamazov do futebol brasileiro, baseado no romance de Dostoiévski que, para ninguém menos do que Sigmund Freud, é o maior romance de toda a história.

Como quase sempre acontece, boa parte da imprensa esportiva crava o Flamengo como favorito, o que muitas vezes já foi bom para o Fluminense, que predomina nas decisões de títulos. Mas a verdade é que, independentemente de elencos e craques, os dois times entram em campo com quase 113 anos de história nas costas. É claro que a qualidade técnica conta, mas ela não é a única variável na decisão de um campeonato. E no Fla x Flu tudo pode acontecer, de jogadas espetaculares a gols no último minuto e até de barriga, desde os tempos das ruas Guanabara e Paissandu, passando pelo 1941 na Gávea e desaguando no terreiro imortal do Maracanã.

E tome Barthô, Valido, Domingos da Guia, Batatais, Dida, Didi, Castilho, Evaristo, Gerson, Waldo e mais dezenas e de nomes que escreveram a história do Fla x Flu. Tome Edinho, Pintinho e Rivellino contra Júnior, Zico e Tita. Nunes fez gols pros dois lados, Cláudio Adão também, Renato Gaúcho também, mas… deixa pra lá.

A cidade vai parar. O Rio vai ficar de olhos arregalados. Nos camarotes do céu, Adílio vai abraçar Assis e Washington, Cláudio Coutinho vai rir com Seu Pinheiro e muita gente boa vai lembrar os melhores anos de suas vidas na Terra. Aqui embaixo nós, pobres mortais, ficaremos de olhos e ouvidos atentos ao jogo que, de tão rico em história, nasceu 40 minutos antes do nada.

Na arquibancada a gente já sabe: nós de um lado, eles do outro. A gente sabe do que eles são capazes e a recíproca é verdadeira. Tem muito grito, canto e celebração, mas em alguns momentos vai ter até silêncio, típico de adversários que pavimentaram o futebol brasileiro e sabem do respeito que merecem.

Dois times, um roteiro de cinema e a briga pelo título: somente um vencerá. O que tiver de ser, será. Mas aí é a hora de me intrometer como parte minúscula dessa história: o Flamengo é um gigante, mas na hora da decisão o Fluminense vira Mike Tyson e Muhammad Ali numa só pessoa. Por isso, com todo respeito ao adversário, eu confio no que meu coração tem visto há mais de meio século. Portanto, dá Flu. E se não der, azar dos fatos.

Que venha a grande decisão! Viva o Fla x Flu!

@p.r.andel

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