“Esse livro dá dinheiro para o Fluminense?” (por Paulo-Roberto Andel)

Na segunda-feira passada (25), foi comemorado o Dia do Escritor Nacional.

Embora tenha uma das maiores bibliografias da América Latina, em sua maioria escrita por abnegados sem quaisquer vínculos profissionais ou similares com a instituição, o Fluminense fez o tradicional silêncio de cara de paisagem sobre a data.

Não é difícil compreender tal comportamento.

Afinal, o Fluminense é feito por pessoas, dentro e fora do clube, todas transitórias mas às vezes contaminadas pelo veneno que faz a individualidade ser mais importante do que a coletividade.

Em primeiro lugar, os poderes do clube – pessoas – se incomodam com o que não podem controlar. E não podem mesmo. Um autor contratado por uma editora tem relação jurídica com a própria e, caso ambos não firam a lei, ninguém mete o bedelho nisso.

Em segundo lugar, volta e meia paira no ar uma velha discussão que beira o ridículo: se um livro sobre o Fluminense é melhor ou pior por ser oficial ou não. Não é isso que determina a qualidade de uma obra literária, exceto para farsantes e ignorantes.

Não existe literatura oficial, a não ser na cabeça oca de viúvas do totalitarismo.

O que existe são livros que o Fluminense produz via campanhas de financiamento, com funcionários remunerados e/ou colaboradores, somados a todos os outros de sua bibliografia, bancados por editoras ou pelos próprios autores.

Para que um livro seja oficial, licenciado pelo clube para receber royalties, basta o autor procurar a instituição para fazê-lo. Se não houver um acontecimento extraterrestre, o licenciamento é garantido, sem qualquer dependência da qualidade da obra, por sinal a maneira correta – quem decide se um livro e seu autor são bons é o leitor. E aí, parte do valor de venda é revertido para o Fluminense. Evidentemente que se trata de valor insignificante para o movimento multimilionário mensal da casa.

Acontece que eu me recusei a fazer qualquer licenciamento, e explico as razões.

Durante oito anos, sofri um processo espúrio, uma farsa judicial tramada dentro das dependências do clube, que pleiteava a DESTRUIÇÃO de um livro meu. Por incrível que pareça (mas nem tão incrível assim), o presidente do clube à época lavou as mãos, e o vice-presidente de futebol/jurídico etc me ofereceu um acordo, algo que beirava o absurdo – imagine se eu dirijo o Fluminense, um funcionário do clube entra na Justiça para destruir um livro que enaltece o clube e eu não ajo contra isso? Pois é, foi o que aconteceu. Claro que esse processo não nasceu à toa: ele foi muito conveniente para gente que, dentro do clube, se incomodava com meu trabalho. Tinham certeza de que eu me calaria. Quebraram a cara.

Salvo uma única ocasião, onde pude fazer uma pesquisa no Flu Memória em 2011 – que não passou de duas tardes -, e outra, quando fui convidado para ser o headliner do encerramento do stand do clube na Bienal do Livro em 2013, o Fluminense, por meio de seus dirigentes e funcionários, jamais ofereceu qualquer prestígio, apoio, suporte, visibilidade ou incentivo ao meu trabalho. O que fez, com justiça por sinal, foi me agradecer pelos serviços prestados no anexo do processo que sofri. E só. Meus compromissos diretos com o clube se limitam ao meu amor como torcedor e às minhas obrigações enquanto sócio, e só. Ninguém do Fluminense vai pautar o meu trabalho. Claro, isso incomodou, incomoda e vai continuar incomodando muita gente por diversas razões.

Há dez anos, eu mantenho este site sobre o Fluminense com conteúdo diário sobre o clube – afora os conteúdos de Facebook, Instagram e Twitter, pagando as despesas mensais e arregimentando colaboradores voluntários para o mesmo, trazendo milhões de acessos para quem se interessa sobre o universo tricolor. Aqui há mais de 16.000 páginas gratuitas de produção própria para leitura sobre o clube, afora outras 600 páginas da série de nove livros digitais Roda Viva, também disponível gratuitamente para download. Ah, sim, desde que este PANORAMA nasceu, eu pago mensalidades regulares no clube e compro ingressos para pelo menos três jogos mensais.

Não conheço um único escritor de futebol que viva exclusivamente da venda de seus livros. No mercado literário do futebol, se um autor vender 500 livros, ele já é um best-seller. Se for contratado por uma editora, recebe se muito 10% do preço de capa. Se o seu livro custar 40 reais e vender 500 exemplares, você receberá R$ 2.000,00 em suaves parcelas. Alguém vive disso?

Por conta do meu trabalho voluntário, o Fluminense tem visibilidade positiva em grandes portais como o maravilhoso Museu da Pelada, que possui 250.000 seguidores. Muitas vezes minhas crônicas lá publicadas versam sobre o clube. O mesmo vale para o Correio da Manhã.

Quantas horas de trabalho mensal o PANORAMA e o CANTINHO fazem pelo Fluminense sem qualquer remuneração? Pelo contrário: pagando do próprio bolso.

“Esse livro dá dinheiro para o Fluminense?”

Alguém acha que o Tricolor não lucra de alguma forma com todo esse trabalho, mesmo que não seja monetariamente?

Diante de tais fatos, por que eu ainda deveria “dar dinheiro” para o clube? Já faço isso como sócio, vendendo livros ou não. O Fluminense tem centenas de milhões de reais para ter que se preocupar com isso: basta que ajuste suas contas multimilionárias sem engodos. As contratações do Cris Moldávia e do Caio Paulista custam quantos milhares de livros?

Meu compromisso é com o Fluminense, a torcida, a arquibancada, e não com dirigentes e funcionários do clube, bem como seus respectivos bajuladores.

Dentre os autores de livros sobre o clube, há gente muito séria, com longa estrada literária e que não se limita a escrever sobre o Fluminense. Roberto Sander e João Garcez, por exemplo. E sem falsa modéstia, eu. Nós três respondemos por mais de 40 livros sobre o Fluminense, número mais do que expressivo por si só.

São muitos e muitos nomes, que não se limitam a nenhuma patotinha ou panelinha. Basta clicar no link abaixo.

CLIQUE AQUI.

De resto, recito Cazuza: “eu vou sobrevivendo sem um arranhão da caridade de quem me detesta,”.

Se minúsculos setores do clube não têm apreço pela minha trajetória, o Museu do Futebol, a Biblioteca Nacional e milhares de leitores do PANORAMA têm, e isso é o que me importa.

Uma coisa é certa: por diversos meios, o medíocre pode esconder sua mediocridade de todo mundo, exceto de si mesmo.