Copa de 70. Eu com oito anos. Lembro-me mais do VT do que propriamente da TV. Não sei bem quando, mas foi naquele tempo mesmo, assisti a alguns jogos do Brasil, em videoteipe. Brasil x Itália, enjoei. No bom sentido, é claro. Aquele lance em que Clodoaldo dribla meio time e, dali, sai uma jogada de gol, foi fantástico. A Itália estava morta de cansada, é verdade. A semifinal contra a Alemanha foi uma maratona de 120 minutos. Um dia desses passou novamente em um canal por assinatura. Um dos jogos mais malucos que já vi.
Uma Copa que ficou marcada pela maior Seleção de todas e, também, por uma série de genialidades de Pelé. Engraçado é que não resultaram em gol: o chute do meio campo, a devolução de primeira em que Mazurkievski deu muita sorte, o drible de corpo no mesmo goleiro, a cabeçada na qual Banks praticou a chamada “maior defesa de todos os tempos”. Sorte que as imagens materializaram a fantasia, senão, ficaria no imaginário, como feitos de outros nos tempos em que a tecnologia ainda era ficção.
Era um futebol em câmera lenta. O último, talvez. A bola corria de pé em pé. De vez em quando, alguém dava um pique. Alguns deles para continuar, por terra, o arco aéreo de Gérson. Precisão cirúrgica.
Contra os ingleses foi difícil. Os Bobbies, os Charltons, os Moores, de um lado. Pelé, Rivelino, Tostão, Jairzinho, Paulo César, de outro. Banks voou e deu um tapa para cima, suficiente para pular o travessão. Ali, seria 1 x 0 ainda no primeiro tempo. Talvez, tudo ficasse mais fácil. A bola sobra para o atacante inglês, na entrada da pequena área. Lee voa de peixinho. Papel pega no reflexo. Ali, seria 0 x 1. Talvez, o sonho acabasse prematuramente. No fim, o Furacão varreu os Bretões do mapa.
Fim de jogo, 4 x 1, fim de Copa. Vi toda a minha pequena cidade na rua. Depois, fiquei sabendo que o Brasil inteiro foi para as ruas. Época em que as ruas ainda suportavam multidões e carros. Hoje, o engarrafamento invadiria e nos prensaria contra a parede da nossa própria casa.
Não tinha, ainda, noção do que era um Brasil. Ouvia que eram noventa milhões em ação. Um, dois, três, até mil, tinha noção, mas 90 milhões? Que as praias eram ensolaradas. O que era praia? Ouvia que era uma corrente pra frente. Metáforas sem saber que eram metáforas. Meu coração é verde, amarelo, branco, azul anil. Eu imaginava. Ninguém segura a juventude do Brasil, mas ame-o ou deixe-o. Como assim? E aquelas fotografias pregadas nos postes?
Salve a Seleção! Tricampeã. Bandeiras de times misturavam-se às verde-amarelas. Tentava-se ter orgulho. Até lutava-se para ter orgulho e para que a liberdade voltasse a ser livre. O time de Zagallo tentou e, por um tempo, conseguiu dividir a atmosfera de chumbo.
Panorama Tricolor
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Revisão preliminar: Rosa Jácome
Imagem: UOL