Era uma semana difícil, daquelas que só eu sei. Difícil pacas. Tem amor envolvido, distância, silêncio e morte. É difícil ser adulto, mesmo quando você já o é desde antes do devido. Mas viver é isso.
Daí o motivo do futebol ser tão importante para tanta gente. Pedro Bial disse que é a nossa Terra do Nunca e tem razão: diante do jogo, a gente volta a ter onze ou doze anos por duas horas, até precisar voltar à realidade. E pra quem persegue esse esporte, é assim para o resto da vida, mesmo que tenham derrubado o Maracanã, mesmo que a torcida seja outra, nada disso importa: é você e o seu time, numa união indissolúvel que independe de formato. Você pode estar no jogo, em casa, no bar, ouvindo no radinho e a conexão está lá pelo menos duas vezes por semana.
Aconteceu que o Fluminense saiu de um marasmo para um momento de vitórias como num estalo, a partir da chegada de Renato. E esta boa vitória sobre o Corinthians aumentou o ânimo, empolgou, renovou as esperanças. É o combustível da vida. A gente não tem a menor ideia se está inaugurado um grande circuito vitorioso ou se é apenas um modismo breve, mas os tricolores voltaram a sorrir e cantar. Nestas últimas vitórias, voltamos todos aos deliciosos momentos dos torcedores mirins vitoriosos.
Pra quem tem cinquenta e poucos anos, o clima de triunfo se firmou no sábado passado. É que Edinho foi ao CT, e no domingo assistiu o jogo no Maracanã com seu filho e neto. Quase setentão, Edinho ainda é aquele garoto que, depois do fim da Máquina, teve que carregar o Fluminense nos ombros até o magnífico ano de 1980. É o herói de todos nós, com suas arrancadas magníficas, sua garra estupenda de desarmes sensacionais. Na arquibancada, ele berrou loucamente do jeito que nós berramos por ele um dia. E o destino colocou sua cereja no bolo: gol no último lance, a cara do Fluminense. Edinho foi um bom presságio.
As famílias estão almoçando na tarde santa. Eu tenho 56 anos. Claro que sinto os sinais do tempo: as dores, as rugas, a melancolia. As pessoas que se foram para sempre. As traições. Em tantas décadas, ter o Fluminense foi sempre um alívio, um escape diante da aspereza da vida.
Quantas vezes o Fluminense foi minha única alegria, meu único amigo mudo, minha companhia do pensamento? Quantas vezes ele não trouxe de volta meus pais e meu irmão, para que experimentássemos o bom da família, na vitória ou na derrota? Desde o tempo em que a rádio tocava “Ring my bell” e a Última Hora ficava estampada na banca de jornais.
Eu conto as horas para o domingo chegar e ver o Flu. Aquela doce ilusão de estar de volta a 1980 e ter meu pai para me puxar pela mão rumo ao Maracanã, como eu também puxei meu irmão enquanto pude. Sonhar com os botões, as figurinhas, o escudo bordado e o belo número estilizado para se colocar numa camisa Hering branca. Sonhar com a lasanha da Trattoria Torna para o almoço, dar um beijo na mãe e atravessar a cidade.
Entre o sonho e a realidade, o Fluminense é a esperança. Crianças, seremos sempre; nenhum dirigente calhorda há de nos tirar isso. Ainda mais nesse domingo, da esperada Páscoa.