Meu caro ídolo, permita-me usar esta expressão que tem cada vez menos sentido, ao menos nesse negócio chamado futebol, que tanto amamos.
Era para eu escrever sobre choro, saudade e distância.
Vamos deixar isso de lado.
Prefiro lembrar daqueles anos incríveis onde você comemorava com aqueles pulinhos e palmas com o nosso Washington.
É fácil demais lembrar de tantas alegrias que você, ele e o resto da turma nos deu, mas dia desses eu lembrei de um jogo que ganhamos bem, não fomos campeões mas pusemos água no chope do Vasco: 3 a 0, você marcou, eles lotaram o nosso saudoso Maracanã, jogavam por um empate para ganhar a Taça Guanabara e nós é que saímos felizes. Coisa de 1987, bem antes da “fundação” do clube. Quem diria? Everaldo Antônio de treinador.
Meu herói Assis, este seu velho fã anda sofrendo. O coração dói, os tempos são outros. O nosso Fluminense está vivíssimo da Silva, mas anda um pouco maltratado. Os hômi, sabe como é? Tropeçam nas próprias gravatas da empáfia, o rei na barriga tem cara de dois de Copas, o que se vê no verbo não é o que se lê no cotidiano. Longe da linhagem de Schwartz, Castro Gil, Villela e outros próceres. Imagine, gente que debocha até das características físicas dos outros. O sobrenome não faz o caráter.
De bom, falo que vamos comemorar mais um aniversário em quinze dias. Vai ter festa, livro, foto e não terá um único convidado que não fale com carinho sobre você. Todo ano a gente olha para trás e aquilo tudo tão longe tem o delicioso sabor de ontem.
De preocupante, exatamente hoje: temos um jogo contra o Ypiranga pela Copa do Brasil. Seria barbada nos teus tempos, agora não é. A torcida está irritada, o time está desacertado, o treinador andou papagaiando demais e o presidente, bom, deixe pra lá.
“Aqui na Terra vão jogando futebol. Tem muito samba, muito choro e rock n’ roll. Nuns dias chove, noutros dias bate sol, mas o que eu quero lhe dizer é que a coisa aqui tá preta.”
Tudo bem. Naquele tempo em que você chegou, as coisas pareciam bem nubladas, até abrir um verão de três anos-luz. A gente segue acreditando, torcendo, chorando, esperando goles de felicidade e respirando o Fluminense feito o eterno presente em que vivemos.
Hoje era um dia em que precisávamos muito de você, não apenas pela condição de craque. Estão faltando a tua elegância, a tua discrição, a tua simplicidade e outros predicados mais. O Fluminense das coisas e pessoas simples, sem fanfarronices ou megalomanias de Mr. Kane. O Fluminense dos sorrisos sinceros e dos bons gestos.
Imagine que há quem sonhe com um shopping center bem em cima do campo onde você pisou – e eu também pisei, comemorando os títulos. A onda agora é fazer um estádio em Jacarepaguá, uma ideia tão moderna que foi defendida por Carlos Lacerda na Câmara dos Deputados no meio dos anos 1940, felizmente fuzilada para que o Maracanã nascesse onde viveu até 2010, até falecer e virar um trambolhão. Enquanto isso, somos nômades do campeonato.
Meu eterno Assis, volta e meia sonhamos com você, Romerito, Tato, Ricardo, todo mundo junto aqui. Sabemos que é impossível. Porém, se desse para você vir junto com João Santos, Alberto, Zé Maria e Eduardo já ajudava bastante. A garotada que subia e ficava.
Agora teremos um centro de treinamento novinho em folha. Nosso engenheiro, tricolor apaixonado, mandou fazer. Já era hora. O Farid teria feito se tivessem deixado, mas aí é outra história, acho. E pertinho da casa e da discoteca dos jogadores.
Nem tudo são flores, nem tudo é derrota. O problema, meu caro Assis, é que estamos numa crise de identidade e isso precisa mudar logo, antes que a indiferença se torne realidade. No fim, o Fluminense somos todos nós, mas o que acontece que alguns realmente acreditam ser mais do que os outros? Melhor seria se fôssemos todos unidos por um Flu forte. Que fim levou nossa mocidade independente?
Aquele pó de arroz que cobria toda a arquibancada precisa voltar de uma vez. Na dança dos rostos, cada um é um escudo. Dentro do campo, gente simples, tranquila e letal para os adversários como você sempre foi, mesmo com nome de santo e a camisa 10 feito águia do Atlântico Sul.
Receba esta carta com amor e alegria. Mande aquela força para o Washington e para os nossos eternos dirigentes também. O Deley, agora com Y, manda um lançamento eterno. O Gonzalez manda lembranças. Do Zezé, não sei.
Logo mais tem mais.
E, claro, obrigado por tudo. É sempre bom te ver de alguma forma.
Aquele abraço. Volte logo.
Você faz uma falta descomunal, acredite.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @pauloandel
Imagem: rap
Estive ausente por uns dias cuidando do meu velho. Está com 87 anos e a saúde já preocupa. Li, reli, revivi. E o meu domingo começa cheio de saudade. Logo mais tem sofrimento…..