ESTAR nas Laranjeiras alimenta a alma. Os que já tiveram a oportunidade de ver partidas oficiais, amistosas e treinos por lá sempre têm histórias para contar: mil e quatrocentas garrafadas no pobre Americano de Caixa D’água – cinquenta e cinco minutos do segundo tempo -, o jogo em que Ricardo acertou todos os desarmes sem cometer faltas, as bombas de Dago explodindo nas arquibancadas e alguém assustado: “Esse cara chuta pra cacete”.
Renato Gaúcho com fita no cabelo, correndo feito um touro, desimportando se no heróico 1995 ou numa das inúmeras passagens como treinador.
Onde Telê e Didi se abraçaram, Castilho foi mais Castilho do que nunca e Tato certa vez chegou com a cara colada no vidro do ônibus, sofrendo com as piadas de Romerito.
Há mais de trinta anos, o então novo Fluminense fazia um jogo treino, lotado, para começar a temporada 1983 – Cândido em vez de Branco. O time vinha de crise, continuou um tempo e depois ganhou tudo o que podia. No fim do ano, chapa única, setores unidos e três anos de vitórias colossais – só não fomos tetra por causa das papeletas amarelas.
AGORA somos 2015 e os tempos mudaram. Se as arquibancadas não ficaram tomadas – e nem poderiam ficar porque a parte superior é imprópria -, a torcida prestigiou em bom número o jogo-treino do sábado passado contra a Cabofriense.
Bom demais ver o mar branco da Young Flu com seus jovens leões rugindo vigorosamente, coro de assustar no começo. Bandeiras, fogos e sinalizadores. Por alguns minutos, viver é reviver. Era um outro Maracanã.
Ri mil vezes quando o Antonio recordou a história de protesto da Força Flu, música impublicável para o vice-presidente Antonio Castro Gil, crise de família, o Zezé de conciliador, parente era só da porta do clube para fora. Os mais velhos entendem, talvez.
Garotas lindas, os camaradas de sempre, pessoas amigas, todos se cumprimentam como se fosse uma festa de grande família. O calor, enorme. No intervalo, não sei dizer como Arlinei conseguiu seis garrafas de água, dez latas de cerveja e o escambau, com centenas de sedentos em volta do querido bar. O Kote registrou tudo, assim como o Marcos Silva Silva. Faltou o Maurício Lima, afora meus amigos cronistas, todos repousando de suas labutas.
Os novos jogadores contaram com apoio total da turma. No primeiro tempo, muito bem o Renato na lateral direita. Cavalieri evitou dois gols feitos. A Cabofriense marcou um. Era treino. Treino. Na volta, sem apertar tanto, o Fluminense virou, acertou algumas boas jogadas e naturalmente confundiu todo mundo com as substituições: quem é aquele cara ali mesmo? Os veteranos da equipe não foram nem bem nem mal. Os jovens correram e tentaram. Cícero foi aplaudido pela torcida, talvez em vão pelo que virá em frente – um grande jogador, pena. Há muito a viver, então vivamos.
Dizer por ora o que vai ser do Fluminense em dezembro seria o pior achismo. Vamos aguardar boas amostras para as conclusões. Nada de precipitações. A partir do domingo que vem, entenderemos melhor. Torcer ou torcer, sem revanchismos, divisionismos e outros ismos de estupidez intocável.
Um grande almoço com Beth, Guto, o Nelsão, Marina na Gaúcha, a enorme estátua na porta e ninguém do clube pagou nosso almoço indevido porque simplesmente não precisamos. Ainda nos demos ao luxo da gelatina multicolorida. Bar dos Guerreiros? Não há.
Certo mesmo é o pecado mortal das Laranjeiras servirem apenas para estas ocasiões quase informais. É o futebol em riste, às vísceras, a disputa em carne viva, a torcida a um metro do campo apertando o coração. Há projetos maravilhosos de retrofit do estádio, a iniciativa privada banca, falta vontade política. Ter o Maracanã nas mãos não deveria significar abrir mão da nossa casa, das nossas raízes. É possível melhorar tudo, basta perguntar ao Caíque. E também o pessoal parar de abanar a Revista do Rádio.
Olhar para o gramado e rever Flávio, Romeu, Pintinho, Welfare, Rodrigues em algum lugar da memória. Edinho gritando com os craques mais experientes sem qualquer cerimônia.
Assis sentado numa bola, Washington sorrindo, os dois com a camiseta da Le Coq Sportif. Perto, Paulinho Cascavel e Ricardo Lopes.
Olhei para o outro lado e me vi de mãos dadas com meu pai, depois de um treino dos garotos Zezé e Deley comendo a bola. Chorei. Vivi para contar e relembrar, por isso sorrio. Helio, querido.
As Laranjeiras estão impregnadas de história.
Panorama Tricolor
@PanoramaTri @pauloandel
Imagem: pra
#SejasóciodoFlu
Que venham infinitas crônicas. Seus textos são eternos, Andel. Sou um fã declarado. Obrigado por me permitir fazer parte dessa história.
Um grande abraço! Parabéns!!
Sou um tricolor do interior do ES! Fui às Laranjeiras apenas um vez, no dia da final da libertadores de 2008! Ao entrar no apertado corredor que dá para as arquibancadas senti uma emoção que não sei nem descrever! Só sei que ali, naquele momento mágico, senti verdadeiramente o porquê de ser tricolor!!! Tenho de voltar lá, preciso voltar lá! Linda crônica Andel!!!
Grande abraco Andel !
Estamos juntos !
ST
continuando……listrada do Flu. Parecia que elas estavam disputando quem era a mais bonita. Na entrada estádio estavam outras também impecáveis. Nunca vi igual em mulheres no estádio.
Belas recordações. Morei de 2004 a 2011 no Rio mas não conheci Laranjeiras por dentro. Em 1970 um amigo viajou para o Rio e viu um torcedor do Fluminense num Mustang na avenida Atlântica e tremulando a bandeira do Flu. Para tirar onda porque ele soube que eu e um amigo, na mesma época, fomos ao Morumbi num taxi DKW Vemag com nossas bandeiras. Tem uma passagem que não esqueço. Fui ver um Fla x Flu lá por 2005 ou 2006 e no vagão do Metrô estavam várias moças tricolores, de calças jeans e camisa…
Andel, Adorei sua crônica. Pois também recordei de vários momentos. Da Taça GB, ou Rio sei lá, de 92. Da Final da Copa do Brasil. Da festa no título de 80, que mesmo sem ser sócio, consegui entrar no Salão Nobre. Da primeira vez que levei meu filho a um jogo ali. Passei por turbilhão de emoções e ainda revi vários amigos, como você. Amo aquele lugar como parte da minha história. E que venham outras. Parabéns e Obrigado por conseguir passar a emoção que todos sentimos.
Em casa é assim que me sinto quando estou nas Laranjeiras. Me sinto no meio de uma familia italiana como é a minha, muitos abraços, muita gritaria, muito sorrisos!!!
Queremos nosso Estádio de volta.
Valeu Andel pela crônica.
Quatrocentas vezes Paulo Andel. Não poderia esperar menos do que romantismo e poesia de um tricolor que não nos deixa esquecer os bons e velhos tempos, mesmo quando o assunto é a análise da equipe num jogo treino. Mas o palco está ali, a torcida também, e somente quem viveu e sentiu intensamente o Fluminense pode descrever com apuro essa miríade de sentimentos. Laranjeiras, berço sagrado do futebol brasileiro, tem muita história para contar e não poderia haver alguém melhor para dizê-la. Obrigad