Mas não é hora de piada.
“O futebol é a coisa mais importante dentre as menos importantes” (Arrigo Sacchi).
Futebol um dia foi alegria, gozação, diversão. Não, não quer dizer que não tenha disputa e vontade de vencer, muito longe disso. Mas é apenas futebol – uma parte importante da vida, mas não A vida somente.
Domingo passado, mais um clássico esvaziado num Engenhão que não empolga ninguém. É ridículo que se aceite (ou que seja normal) um público para Vasco x CRF menor do que a lotação do Alugadão, mas é o que tem acontecido regularmente. De tanto insistirem – com o interesse natural da televisão -, conseguiram: o torcedor tem aberto mão de ir ao estádio por vários fatores. Alguém se lembra de quando se dizia “Domingo é dia de torcer no Maracanã”? Agora, “Domingo é dia de ligar a LCD”. São muitos os fatores, merecem um livro.
Não bastasse tudo o que se faz para achincalhar o torcedor, ainda há algo muito pior.
A violência. O assassinato. O crime cruel e estúpido.
Mais uma vez, longe do estádio (poderia ser perto também), um torcedor foi brutalmente assassinado. Seu crime? Torcer por outro time de futebol que não o dos assassinos.
Desta vez, o rubro-negro matou o vascaíno. Da outra, o contrário. Das outras? Quais? Um tricolor matou um vascaíno, um botafoguense matou um tricolor. O corinthiano mata o palmeirense, o atleticano mata o cruzeirense. O colorado mata o gremista e a estupidez não tem cor, apenas a intensidade em moto-contínuo; alimenta-se de si mesma, estupidez.
Tudo pela intolerância, por não aceitar a opção do outro.
Inocentes pagam com a vida, assassinos deixam escorrer suas vidas em vão. Uma imbecilidade que nenhum quadrúpede exerceria se pudesse ser bípede e dotado de cérebro humano.
Há os que vão dizer que tudo é culpa exclusiva de torcidas organizadas (banalização de um lado, necessidade de ação das mesmas do outro), há os que vão dizer que tem que matar todo mundo, há os que vão rir porque “fulano que torce para o time tal tem mais é que morrer”. Em momentos como estes, a escrotidão humana é infalível – leia-se burrice, oportunismo e hipocrisia. Basta apenas que as leis funcionem de verdade, sem impunidade.
O futebol é derrotado por assassinos, que tiram do foco as notícias que gostaríamos de ler.
Eis a vitória da selvageria.
O crime aplaude de pé.
A estupidez desfralda suas bandeiras. A boçalidade comemora como se fosse um gol.
“Aprendi que uma vida não vale nada, mas também que nada vale uma vida.” (André Malraux)
“Vamos celebrar a estupidez humana/ A estupidez de todas as nações/ O meu país e sua corja de assassinos/ Covardes, estupradores e ladrões…” (Renato Russo)
Somos uma sociedade muito estúpida. Primitiva em meio às novas tecnologias. Egoísta, autoritária. Idiota.
O que se vê quando um imbecil mata um inocente por causa de futebol? A face mais turva da mediocridade humana.
O massacre de Heysel, auge dos hooligans, foi em 1985. Já se passaram 27 anos. E continuamos numa imbecilidade de dar dó, uma sociedade entorpecida que late de quatro em torno do próprio rabo – e sem vacina anti-rábica.
A audiência da televisão agradece.
Paulo-Roberto Andel
@pauloandel
Panorama Tricolor/ Flunews – Em publicação conjunta com Buteco do Tricolor
Imagem: Uanderson Fernandes – O Dia/ Google
Contato: Vitor Franklin