Num país que se gaba em desprezar a memória, completar 122 anos é uma façanha inquestionável. E são 122 anos de histórias que só caberiam em centenas de livros.
Embora não seja o primeiro clube de futebol fundado no país, o Fluminense assumiu o papel de colonizador do futebol brasileiro. Em menos de vinte anos, o Flu inventou o campeonato, o estádio, a torcida, a Seleção Brasileira e até o maravilhoso burro Faísca, que cuidava do gramado. Antes disso tudo, João do Rio, então o maior cronista do país, já escrevia sobre a instituição, defendida por Coelho Neto e abominada por Lima Barreto (que era contra o futebol em geral). Ah, e foi no Fluminense que ninguém menos do que Pixinguinha deu seus passos definitivos para a consagração nacional. Ok, contra a vontade o Fluminense inventou o futebol do Flamengo; melhor para o Brasil, que ganhou o maior clássico do mundo.
Ok, o momento não anda nada fácil, né? Vamos em frente. Imagine você que a mesma camisa de craques monumentais como Romeu Pelicciari, Rivellino, Assis, Paulo Cezar Caju e Telê Santana foi vestida uma vez por ninguém menos do que Oscar Niemeyer, pelo segundo quadro. E que em plena Segunda Guerra Mundial o Fluminense comprou um avião para apoiar a FAB. Aliás, Santos Dumont, o pai da aviação, foi um dos primeiros sócios da casa.
Nos anos 1930, o Fluminense talvez tenha tido o maior time de sua história, que ganhou tudo entre 1936 e 1941, além de ser a base da Seleção. Não fosse a Segunda Guerra Mundial, talvez a primeira estrela da Amarelinha (ainda branca) tivesse sido na Copa de 1942, com o Fluminense dando as cartas.
Uma história gigantesca, cheia de vitórias espetaculares e uma massa de pó de arroz que alucinou o Maracanã e todos os estádios onde esteve. Depois dos imortais anos 1950, onde faturou o Mundial de Clubes e dois torneios Rio-São Paulo, em fins dos anos 1960 o Fluminense fez um verdadeiro strike de títulos: campeão em 1969, 1970, 1971, 1973, 1975, 1976, 1980, 1983, 1984 e 1985.
O Fluminense cheio de ídolos imortais como Castilho, Marcos Carneiro de Mendonça e Félix, só para falar de goleiros, mas também de muitos heróis negros: Pinheiro, Didi, Denilson, Flávio, Pintinho, Altair, Jair Marinho, Carlos Alberto Torres, Assis, Washington, Marcão, Jhon Arias, John Kennedy e muito mais.
Não bastasse tudo isso, coube ao Fluminense vencer a indústria nacional de fake news. A fábrica de crendices do Febeapá inventou que o Flu deveria pagar a Série B. Qualquer pessoa com razoável capacidade intelectual que pesquise o assunto saberá que o Tricolor nada tem a ver com as viradas de mesa do futebol brasileiro, embora tenha sido até beneficiado pelo efeito delas. Quem quiser, pesquisa e aprende; quem não quiser, continue acreditando que manga com leite é veneno e pronto.
Apesar deste julho difícil, o que importa é dizer que o Fluminense é um dos orgulhos do Brasil. Sem as iniciativas tricolores ao longo da história, muitos clubes sequer surgiriam, quanto mais disputariam campeonatos de futebol no Brasil.
Viva Zezé Moreira! Viva Ondino Viera e Gentil Cardoso! Viva Arnaldo Guinle e Francisco Horta! Viva Samarone, Laís e Chico Neto! Viva Preguinho! Viva Veludo! São Paulo Victor, São Ricardo Gomes e Branco! Viva o monstruoso Edinho! E Hércules, Pedro Amorim, Russo, Bigode, Carlyle e centenas, centenas de nomes que escreveram linhas maravilhosas do nosso futebol. Viva Abel! Viva Carlos Alberto Parreira!
Se qualquer outro time do mundo tivesse como únicas glórias a Máquina Tricolor e o gol de barriga de Renato Gaúcho, já seria suficiente para justificar 200 anos de vida, mas nem falei disso aqui. Que texto seria capaz de conter o Fluminense inteiro? Nenhum, nem mesmo o escrito pelo maior cronista da história do futebol brasileiro, Nelson Rodrigues – monumental orgulho em três cores.
Tricolores, a barra está pesada, mas o nosso poeta há de nós redimir e, quando esse tormento do Brasileirão passar, cantaremos “Fim da tempestade, o sol nascerá”. É que Cartola, o gênio maior do samba, é coisa nossa. Acreditem. Créu!