Deixando de lado os dias caóticos do Fluminense e tentando abstrair um pouco. É que hoje tem Fla x Flu, o clássico dos clássicos, com todo respeito aos coirmãos.
Meu Fla X Flu é dos tempos de Wendell e Edinho, de Miranda – o Trésor brasileiro -, do drible genial de Cristovão e do pênalti defendido por Paulinho Goulart – ele tinha um bigodão mas era chamado de Paulinho.
Tinha Fumanchu e Nunes, Rubens Galaxe, o saudoso Zezé e, claro, Edinho. São coisas e gentes de 40 anos atrás. Desde então, muitas histórias boas e ruins desaguaram. Mas não dá pra não falar de Deley, Gilberto e Mário, nem de Jandir, Deley e Assis. Taquepariu! Que tempos!
O Flamengo tem muito mais time, o Fluminense tem a vocação de esmagar favoritismos. Em clássico, o favorito muitas vezes tropeça. Eis a nossa chance.
Esse de hoje poderia ser um Fla x Flu de 1995. Naquele tempo, tal como agora, lutávamos para não ficar dez anos sem títulos significativos. O problema é que nem de longe temos Renato Gaúcho no campo, mas vale o ímpeto do garoto Luiz Henrique. Ok, não temos Djair, nem Super Ézio, nem sequer Ronald. O que ficou foi a nossa camisa, linda, faiscante, com um escudão do tamanho daquele usado pelo Marcos Carneiro de Mendonça – bem grande.
Pela trigésima vez nos últimos vinte anos, não tem Maracanã. Assim sendo, vamos de Engenhão. Pelo menos, a gente conhece bem os caminhos por lá, onde comemoramos muito nossas últimas grandes glórias. Me desculpem a melancolia, é que sou do tempo em que o Fluminense não aceitava ficar quatro anos sem ser campeão.
O jeito é fingir que essas três últimas partidas não existiram, parece o mais razoável. Que tal o Abel incorporar o segundo tempo daquele 4 a 1 em 2005? Pode ser o magro 1 a 0 de 2012 no Brasileirão.
Ficam faltando o pó de arroz e o mar de bandeiras. Os tempos mudaram, mas só para algumas coisas.
Aqui estamos eu, minha dor no joelho, minha hipertensão e, claro, alguma apreensão. Ainda estão rolando os dados, vamos ver no que dá. O pessoal em campo podia pegar parte da energia boa do Leomir, que fica ali do lado.
Disse Belchior, grande poeta tricolor: “Viver é melhor que sonhar”. Sinceramente, há muito tempo tenho minhas dúvidas sobre isso, mas não custa nada sonhar com um Fluminense totalmente diferente para esta tarde de Fla x Flu. Sem Wellington A Baiana, tá?
O cracão Andrade escorregando sozinho, despencando no gramado e Amauri entrando livre para marcar 1 a 0 no último minuto. Quarenta anos passam rápido.
O garoto John Kennedy, que precisa ajustar a cabeça para evitar a autodestruição, marcando dois belos gols. Foi há pouco.
Onde quer que esteja, Sergio Britto foi definitivo: “Eu estava na Lagoa em 1941 com meu tio. Parem com essa bobagem de chutes n’água, não teve nada disso”. O Assaf, que é escritor e dos melhores, publicou em seu livro que não teve cera alguma.
Vida que segue.
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Só os idiotas querem definir quem é “tricolor de verdade” ou não.
Só os idiotas acreditam que criticar más atuações é fruto de antecipação eleitoral.
Só os idiotas.
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“Livros foram escritos, a tela do cinema registrou, depoimentos pululam em vídeos e áudios. Quem esteve no Maracanã naquele dia assegura que foi o maior jogo de todos os tempos, ao menos os tricolores. Apesar da gozação, os rubro-negros reconhecem a glória daquele dia, tanto é que ao término da partida a massa flamenga aplaudiu, mesmo
derrotada.
Até aqui, em junho de 2019, foi a última disputa de título carioca em que os dois times partiram com tudo um para cima do outro, numa luta de boxe imaginária entre Muhammad Ali e Mike Tyson. Tinha Romário, o melhor do mundo. Tinha Vanderlei Luxemburgo e Joel Santana. Cem mil maníacos por futebol gritando numa tarde de muita chuva. Cinco gols, bolas na trave, defesas heroicas, expulsões e um craque predestinado a marcar um gol apoteótico e inusitado. Ave Renato!”
“Fla x Flu: o jogo que nunca termina”, Vilarejo Metaeditora, 2019, página 99.